São Paulo, sexta-feira, 5 de setembro de 1997
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Para onde vai o déficit

CELSO PINTO

O resultado da balança comercial de agosto reacendeu a discussão sobre a tendência das contas externas. A dúvida é saber se o país entrou, finalmente, num patamar de certa acomodação, onde as contas pioram, mas devagar.
Só a divulgação dos dados detalhados de agosto permitirá ter uma idéia mais clara de tendências, mas não há dúvida de que os números fecharam melhor do que supunham os mais pessimistas. Isso, mesmo considerando que as exportações de manufaturados acabaram inchadas pela exportação de uma plataforma de petróleo, por US$ 178 milhões, que foi uma operação puramente financeira.
Os mais cautelosos, contudo, ainda têm dúvidas. A nítida reação dos manufaturados aparentemente concentrou-se em vendas à Argentina, que passa por um boom econômico. Não há nada errado com isso, mas é preciso ver se o ritmo poderá se manter em 98. As vendas de manufaturados para outras regiões continuam decepcionantes.
As exportações de produtos básicos subiram pelo aumento da quantidade e, principalmente, dos preços. Para 98, espera-se um novo aumento no volume, mas alguma queda no preço. A receita pode ficar parecida com a deste ano, que foi excelente. O Brasil, contudo, precisaria sustentar um aumento de no mínimo 7% ao ano nas exportações para dar tranquilidade aos seus credores.
Do lado das importações, a dúvida mais relevante é saber se houve uma acomodação no coeficiente de uso de importados na economia, o que alguns estudos feitos no primeiro semestre não confirmam.
Alguns economistas, contudo, olhando tendências de mais longo prazo, estão confiantes de que o pior já passou. É o caso do consultor Ricardo Braule Pinto. Ele montou uma série com variações percentuais de exportações, importações e crescimento industrial. Para evitar a sazonalidade, usou sempre comparações com 12 meses: o mês presente com o mesmo mês do ano anterior, a média dos últimos três meses comparada à do mesmo trimestre do ano anterior e a média dos últimos 12 meses comparada à dos 12 meses anteriores.
Como as comparações são longas, as curvas são mais suaves, captam menos saltos recentes, mas indicam tendências. Ricardo identifica três fases nítidas, de abril de 95 até hoje.
A produção industrial desacelerou até fevereiro de 96. A partir daí, a média móvel trimestral sobe forte até setembro do ano passado. Desde então, desacelera: o crescimento anual cai de 8,4% para 6,8% em junho deste ano.
É verdade que, desde o vale de 4,5% em março deste ano, a taxa trimestral oscilou e indica algum crescimento recente. A taxa anual segue a trimestral, com alguma defasagem. Apesar dessa oscilação, Ricardo acha que a tendência é de desaceleração.
O comportamento da produção industrial reflete-se no das importações com uma defasagem de dois a três meses. A média trimestral das importações teve um pico em fevereiro e, desde então, está oscilando entre 23% e 25%. No caso das exportações, o reflexo do crescimento é mais estreito e a tendência de aceleração da média trimestral vem forte: a taxa anual saltou de menos 1,2% em fevereiro para 19,5% em agosto, certamente como reflexo do bom comportamento dos produtos básicos.
A conclusão de Ricardo é que as curvas de longo prazo indicam acomodação das importações, crescimento das exportações e estabilidade com provável desaceleração no crescimento. Esta combinação, a seu ver, produzirá um déficit comercial de US$ 9,5 bilhões este ano.
Se, contudo, a taxa anual de crescimento das importações estacionar entre 22% e 25%, como ocorreu nos últimos meses, as exportações precisariam crescer 16% para manter o déficit em US$ 9,5 bilhões. A média trimestral de crescimento das exportações está em 19%, mas graças aos produtos básicos, cuja venda já terminou. A taxa anual está em 6% e muitos projetam que fechará o ano em torno de 9% ou 10%.
A menos que o ritmo de importações caia muito até o fim do ano, ou as exportações cresçam bem além do imaginado, o déficit ficará em US$ 11 bilhões ou US$ 12 bilhões. Bem melhor do que chegou-se a imaginar, mas sem euforia.

E-mail: CellPinto@uol.com.br

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