São Paulo, quarta-feira, 10 de setembro de 1997
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Desculpem, mas foi o câmbio

ANTONIO DELFIM NETTO

O governo meteu-se em nova trapalhada. Suspeitando que existem algumas operações "virtuais" de importação, a Receita Federal corrigiu os dados da Secex do MICT. Deveriam fazer o mesmo com as exportações ectoplasmáticas que retornam ao país como "leasing"...
O resultado do mês de agosto entusiasmou todos nós, mas ainda é cedo para concluir que estamos entrando numa fase de grande aumento das exportações e calmaria nas importações. Pelos padrões estacionais conhecidos deveriam ter sido gerados déficits parecidos com US$ 650 milhões em julho e agosto. O que ocorreu foi um déficit de US$ 811 milhões em julho e US$ 315 milhões em agosto. Se a eles somarmos exportação "financeira" da Petrobrás de US$ 178 milhões, teremos que o déficit total dos dois meses foi da ordem de US$ 1,304 bilhão, o que deixa a média de US$ 650 milhões, praticamente igual à prevista.
O aumento das exportações se concentra em poucos produtos. Os básicos (soja, café, minérios, carne de frango etc.) tiveram um aumento de exportação de US$ 2,44 bilhões no acumulado janeiro/julho de 1997 com relação ao mesmo período de 1996. Oitenta e seis por cento desse aumento (US$ 2,1 bilhões) foi concentrado na soja (51%) e no café (35%), que registraram aumentos de quantidade e de preço.
No mesmo período, os manufaturados registraram um aumento de US$ 437,5 milhões. O aumento das exportações de apenas dois produtos somou US$ 501 milhões (veículos automotores, US$ 275,7 e aviões, US$ 225,3). Logo, todos os outros manufaturados sofreram uma redução de exportações de US$ 63,5 milhões!
Nos básicos, o aumento das exportações se dividiu mais ou menos proporcionalmente, entre as várias áreas, mas nos manufaturados houve uma dramática concentração. Os países da Aladi absorveram US$ 1 bilhão a mais, devido à expansão argentina, enquanto as exportações para os demais países caíram quase US$ 600 milhões!
Certamente esses números não são confortadores, mas eles sugerem alguns pontos interessantes. Em primeiro lugar é o papel da taxa de câmbio nas exportações. Por que cresceram as exportações de soja? Porque nas vésperas do plantio da safra 1996/97 os preços externos subiram e foi feita a eliminação do ICMS nas exportações, o que estimulou o plantio e um aumento de produção de 2,8 milhões de toneladas.
O ato de Deus foi a elevação do preço internacional, mas o ato do homem foi uma desvalorização fiscal de 8% a 10%, à custa da redução da receita de Estados e municípios: câmbio pela via fiscal e pago com déficits.
E a exportação de manufaturados? Os automóveis, por conta do "acordo automotivo" que lhes dá subsídios cruzados no Brasil e na Argentina e que deu ao setor a maior taxa de proteção efetiva na história: câmbio pela via do subsídio. E os aviões? Uma bem articulada operação creditícia do BNDES para crédito externo: câmbio pela via de crédito e subsídio, pelo menos do "spread", que será financiado -no fim da linha- pelo Tesouro Nacional.
Há sim, alguma coisa para comemorar, mas há muito mais o que pensar!

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