São Paulo, sábado, 13 de setembro de 1997
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Hora da verdade

JUCA KFOURI

O ministro Pelé chegou de rápida viagem ao Chile na quinta-feira à noite e não gostou de saber que, ao contrário do combinado, o governo não pretenderia mais pedir regime de urgência para a aprovação de seu projeto.
Sob regime de urgência, a discussão terá de se dar em, no máximo, 45 dias, embora possa ser prorrogada.
Pelé informou-se em Brasília e ficou tranquilo diante da garantia de que nada mudou, até porque, caso contrário, ele não veria mais motivo para seguir em sua luta e daria sua missão por cumprida tão logo entregasse o projeto à Câmara dos Deputados, coisa que deverá acontecer na segunda-feira.
O projeto original foi devidamente adequado ao que determina a Constituição do país pela assessoria jurídica do Palácio do Planalto, num esforço que deixou o ministro dos Esportes satisfeito e convencido do apoio irrestrito do presidente Fernando Henrique Cardoso.
Diferentemente do que consta em diversos esboços que foram vazados para a imprensa, o texto final, fechado na última quinta-feira pela equipe do Ministério dos Esportes e da Casa Civil, extingue a chamada Lei do Passe nos próximos dois anos, e não em três como em uma das suas diversas versões.
A solução encontrada determina, no parágrafo 2º do artigo 29 que "aplicam-se ao atleta profissional as normais gerais da legislação trabalhista e de seguridade social".
No artigo 30, diz que "o contrato de trabalho do atleta profissional terá prazo determinado, com vigência nunca inferior a seis meses" e, em parágrafo único, determina que "o vínculo desportivo do atleta profissional com a entidade contratante tem natureza acessória ao respectivo vínculo empregatício, dissolvendo-se, para todos os efeitos legais, com o término da vigência do contrato de trabalho".
No fim do texto do projeto, então, consta que o artigo 30 só entrará em vigor daqui a dois anos, conforme foi acordado com os clubes quando começou a discussão em torno do passe.
A possibilidade de arrendamento do departamento de futebol profissional dos clubes foi retirada do projeto, assim como o artigo que previa isenção fiscal de 1% a quem investisse em entidades esportivas, atendendo ao parecer da Secretaria da Receita Federal.
Ao contrário, no entanto, do que pretendia a mesma Receita, permanece a isenção para a importação de equipamentos esportivos por parte das entidades e atletas.
Para não ferir o preceito constitucional que dá autonomia às entidades esportivas, o artigo 19 prevê que somente serão beneficiados com isenções fiscais e repasses de recursos públicos federais aqueles que tiverem de acordo com a legislação proposta e inscritos num Cadastro Nacional do Desporto -que obriga, entre outras coisas, a instituição do Tribunal de Justiça Desportiva nos novos moldes que tanto assustaram o presidente da Fifa, João Havelange.
Está mantida, também, a possibilidade de os árbitros criarem as suas associações com o objetivo de recrutar, formar e prestar serviços às entidades esportivas.
O projeto de lei mais induz que obriga e, a exemplo da atual legislação, permite a organização de ligas regionais ou nacionais, assim como prescreve que "as atividades relacionadas a competições de atletas profissionais são privativas de entidades constituídas sob a forma de sociedade comercial admitida na legislação em vigor", porta aberta para a pretendida transformação dos clubes em empresas.
Não se obriga, portanto, por inconstitucional, que os clubes se transformem em empresas, mas o clube que mantiver algum tipo de esporte profissional passa a ser regido pelo Código Comercial, sujeito aos impostos de praxe e até a ter sua falência requerida como, aliás, é da própria lógica do sistema capitalista.
Ao Ministério Público caberá a fiscalização das entidades e clubes e dos atos de seus dirigentes, que responderão criminal e patrimonialmente pelo que fizerem.

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