São Paulo, quarta-feira, 17 de setembro de 1997
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DAC especula vida sexual de comissárias

DANIEL DE CASTRO
DA REPORTAGEM LOCAL

O formulário ginecológico exigido pelo DAC (Departamento de Aviação Civil) para a revalidação do Certificado de Capacitação Física (CCF) de comissárias de vôo contém itens que ferem o Código de Ética Médica.
A denúncia foi feita à Folha pelo Sindicato Nacional dos Aeronautas, depois de receber uma cópia do formulário enviado por um grupo anônimo de comissárias de vôo da Vasp.
As comissárias alegam ser constrangedor o preenchimento de itens que questionam sobre a prática de aborto, a virgindade e a vida sexual .
Sandra Maria Antunes Antonio, 40, vice-presidente da ACV (Associação dos Comissários da Vasp), conta que, em fevereiro deste ano, seu ginecologista se recusou a preencher todo o formulário no momento de renovação do CCF.
"Ele disse que aquele tipo de detalhe, além de ser dispensável para a renovação do exame, não poderia ser passado a outra pessoa. Além disso, eu não o autorizei a fazer isso", conta.
As comissárias que enviaram a denúncia alegaram também que não se sentem confortáveis com o fato de detalhes como os exigidos no formulário correrem o risco serem obtidos por outras pessoas que não o médico da Aeronáutica.
No comunicado, elas afirmam que"não querem se humilhar respondendo a questões tão íntimas".
Invasão de privacidade
Para o consultor jurídico do sindicato, o advogado Carlos Alberto Diegas, 45, a obrigatoriedade de preenchimento do formulário ginecológico, vinculado à renovação da habilitação de vôo, chega a desrespeitar até a Constituição.
"O inciso X do artigo 5º garante a inviolabilidade da intimidade da pessoa (ver quadro abaixo)", diz.
O médico Pedro Paulo Roque Monteleone, 56, ginecologista e presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo, afirma que o conhecimento dos antecedentes tocoginecológicos, exigidos na segunda parte do formulário, cabe apenas do médico particular da mulher.
"De acordo com o Código de Ética Médica -artigos 105 e 108-, o profissional deve manter esse tipo de informação sob sigilo. Ele pode até passar os dados a outro médico, mas desde que tenha a autorização da paciente", diz.
Monteleone explica também que o médico particular da aeronauta estaria procedendo de forma correta se apresentasse um laudo generalizado sobre as condições ginecológicas da pessoa. "Esses detalhes não interessam a outros médicos. O importante é que ele aponte, ou não, se há anormalidades."
O advogado Diegas também acha legítimo que seja fornecido um atestado médico genérico. "Caso a aeronauta tenha doenças transmissíveis ou esteja mal, isso deve ser passado ao departamento na hora da renovação do exame."
Exigência do DAC
A Vasp, por meio de sua assessoria, informou que o exame é uma exigência do DAC a todas as empresas de aviação. "É uma exigência que nós temos de cumprir."
A empresa informou ainda que nenhum médico do corpo clínico da Vasp tem acesso ao formulário preenchido. "Ele é entregue lacrado, ainda em branco, para a comissária de vôo."

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