São Paulo, domingo, 28 de junho de 1998
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Uma novidade brasileira

JANIO DE FREITAS

As vésperas de um momento decisivo costumam ser mais ricas de sentidos do que a própria decisão. E não só no futebol.
Desde que, a partir das oitavas-de-final, todo jogo na Copa é eliminatório, cada um deles tem o significado de uma decisão.
É natural, portanto, que cada jogo seja antecedido de uma tensão especial, logo, especialmente reveladora.
As vésperas de Brasil x Chile, porém, fizeram muitas das suas revelações de modo inusual para brasileiros.
Onde há fumaça, ou repórter, há fogo. Se não houver fogo, o provável é que o repórter o crie.
Se não houver, nem for criado, não faz mal: o repórter é, por si, uma informação. Basta observá-lo.
"Você vai ou fica?" tornou-se, de quarta-feira para cá, a expressão mais frequente no encontro de dois jornalistas quaisquer, desde que brasileiros.
Sem possibilidade de resposta sucinta, porque a questão não dispensava considerações elucidativas.
Mas, fosse qual fosse a resposta, o revelador, o essencial, estava era na pergunta.
A derrota para o Chile estava considerada como possibilidade tão concreta, pelos jornalistas brasileiros, que a volta de parte das equipes para o Brasil passou a ser tratada, desde a vitória da Noruega, mais que como hipótese, com as providências e urgências práticas.
Vá lá que os hotéis, muitos deles, se antecipassem para cobrar, já na sexta-feira, as contas de despesas extras, na óbvia precaução contra repentinos sumiços de hóspedes brasileiros depois do jogo com o Chile.
Os hoteleiros têm, com certeza, experiências muito variadas no trato com brasileiros.
Mas a torcida? É feita de fé cega, surda e gritante, descrente de adversários e adversidades.
Ou, nunca se vira, é feita de bilhetes de volta marcados, preventivamente, para logo depois do jogo, para domingo, para segunda, para o mais depressa possível.
Desde meado da semana, as companhias aéreas ficaram sufocadas com a avalanche de reservas pedidas, muito além do disponível em tantos vôos.
E tudo isso por causa de um jogo com o Chile, cuja área sempre foi lugar de diversão brasileira, antes das entradas, sem a menor cerimônia, no gol chileno, para pegar a bola e continuar a brincadeira.
O Chile que, sem ser de todo medíocre, também nesta Copa mais correu do que jogou.
Vencer do Chile, sim, "mas aí vem a Nigéria, e depois viria" - não faz diferença, porque a diferença foi no ânimo, na confiança, no orgulho, na alegria, na passagem da esperança ao temor.

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