São Paulo, terça-feira, 30 de junho de 1998
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Três latinos e a Alemanha

CARLOS HEITOR CONY

Futebol esquisito, o da Alemanha. Não fosse ela, e poder-se-ia dizer que o futebol atualmente é uma expressão latina. Nórdicos, eslavos, africanos, asiáticos, uns mais do que outros, formam uma classe média esforçada, um baixo clero mais ou menos homogêneo, uma ou outra seleção atravessando melhor forma, mas sem dar para o gasto de uma Copa do Mundo.
Tivemos ontem Alemanha e México, nas oitavas-de-final, uma partida interessante, bem jogada. Mostrou mais uma vez o tipo de futebol que os alemães praticam, sem nenhum brilho especial, mas com a eficiência que é a marca anedótica daquele povo.
Até a metade do segundo tempo, o México dominou o campo, não apenas com o placar de 1 a 0, mas com uma exibição nervosa, plástica, até mesmo surpreendente. Em seus melhores momentos, parecia a Argentina. Teve oportunidades de ampliar o marcador, revelou um goleiro magnífico, Jorge Campos, que aliás joga nos EUA, pelo LA Galaxy.
Já os alemães pareciam nem estar ali. Faziam o que tinham de fazer. De repente -parece-, sem que houvesse mudança de tática ou entrada de um novo jogador em campo, tudo começou a se armar em busca do gol do empate. E logo o da vitória. Lances límpidos, verticais, sem confusões no bolo da área.
Dizendo isso, posso estar exagerando. Mas a Alemanha é sempre assim. Dá a impressão de que joga por jogar, para cumprir um compromisso, perdendo ou ganhando, tanto faz. Acontece que ela raramente perde numa Copa. Já levou três para casa, em condições iguais a desta partida contra os mexicanos.
Ela nunca entrou numa disputa internacional como favorita. É sempre e apenas uma hipótese viável, uma possibilidade, se os outros deixarem. Quando encontra uma seleção supermotivada, ela pega o boné, diz adeus e vai-se embora. Quando não esbarra com um time supermotivado, então ela banca Minas Gerais e está onde sempre esteve: no ranking mais nobre do futebol.
Os latinos, com o sangue fervendo e a língua de fora, se esbofam, uns com arte, outros com força, e lutam até o último homem e o último minuto. No jogo do domingo, entre França e Paraguai, os dois contendores eram latinos. E a partida foi decidida pela morte súbita, na qual os franceses, desde os tempos do Dr. Guilhotin, são mestres históricos.
O tabuleiro começa a se arrumar para as finais. Surpresa seria se o México tivesse vencido. Como será surpresa o Brasil perder para a Dinamarca, em Nantes, no próximo compromisso. Vai levar algum tempo até que o desenho dessas finais de Copa seja modificado substancialmente. Dos 32 participantes, 16 são figurantes, 10 são atores secundários. Dos seis que sobram, quatro são os de sempre: três latinos e a Alemanha. Pode ser até que, nesta Copa tão especial, a França substitua Itália, Argentina ou Brasil. Mas a regra tem tudo para ser confirmada.

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