São Paulo, sábado, 11 de julho de 1998
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Escaldados

ALBERTO HELENA JR.

Há quem esteja temendo esse clima de já ganhou que se irradia desde aqui e por aí se espalha. Sou de uma geração que viveu na pele por duas vezes a trágica sensação do reverso: a certeza da vitória transformando-se na perplexidade da derrota.
A primeira e mais angustiante foi em 50, quando, depois da derrota diante do Uruguai, em pleno Maracanã, baixou a cava depressão de que não tínhamos alma de campeões. A segunda, em 82, com aquele time considerado por todos - nós e eles- como o melhor do planeta, disparado, sucumbindo diante de uma Itália, que vinha cambaleante nos descaminhos da classificação.
Em ambos os casos, porém, aquelas seleções passeavam pela Copa sem sobressaltos, esmagando os adversários com um futebol mágico, deslumbrante.
Não é o que acontece agora. Nossa chegada à final veio pontilhada de incertezas e algum sofrimento, apesar de os fados nos reservarem um caminho mais ameno que às demais candidatas ao título. Pedreira mesmo, pra valer, foi a Holanda. E só.
Ah, sim, perdemos para a Noruega. Mas aquele foi um jogo atípico: além de já estarmos classificados, resolvemos fazer uma experiência infeliz, com o recuo de Leonardo para o lugar de César Sampaio e a passagem de Rivaldo para a direita, a fim de dar entrada à Denílson na esquerda.
Foi, porém, uma santa derrota, pois nos colocou de sobreaviso diante do Chile, este, sim, um inimigo traiçoeiro do qual nos livramos mais facilmente do que, confesso, eu esperava.
E suamos para ganhar da boa Dinamarca, num jogo que serviu para afiarmos nossa capacidade de reação.
O que quero dizer é que chegamos agora diante da França, confiantes, mas, espero, escaldados, ao contrário de 50 e 82, quando tropeçamos, sobretudo, na soberba, num, e na traição dos deuses, noutro.
Assim, se tudo correr bem, sairemos daqui campeões, pela quinta vez. Sem o brilho de 58 e 70, mas com um acervo de emoções muito mais rico do que em 94.
E esse, afinal, é o jogo.
*
A frase de ontem era: "nem Moisés, portando divina tábua de logaritmos, me convenceria...".

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