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São Paulo, sábado, 09 de agosto de 2003

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Obsessão mobiliza personagens

DA REPORTAGEM LOCAL

Finda o terceiro sinal e lá está Alberto Guzik lendo o jornal, não no papel de crítico, mas de ator.
A cena inicial de "O Horário de Visita", que estréia hoje no teatro do Centro da Terra, sintetiza a transição de Guzik para o palco.
Foram 35 anos empenhados do lado de cá, no exercício da crítica, sobretudo no "Jornal da Tarde" (até dois anos atrás), ou nas aulas de teatro que ministrou, por exemplo, na Escola de Arte Dramática da USP, onde também cursou interpretação em 66.
Uma das produções em que atuou foi "O Processo", adaptação de obra de Kafka, pelo Núcleo 2 do Teatro de Arena, em 67.
Hoje, Guzik sobe ao palco para interpretar Edson, pai de família amoroso, mas uma carranca quanto aos sentimentos e desejos -seus ou das novas gerações.
É um "chefe de família" intransigente, moralista e bastante apegado ao passado recente que lhe cutuca o coração sem dó.
A avalanche chega numa tarde de sábado, quando ele e a mulher, Ana (Tuna Dwek, de "Vidros Partidos"), únicos moradores do apartamento, recebem uma visita (de Marcelo Médici, de "Terça Insana") que lhes fará desenterrar os medos e embrulhar o chá das cinco no estômago. Ainda assim, algumas passagens são patéticas.
O texto de Sérgio Roveri é encadeado por situações que, se mais reveladas, prejudicam a recepção da história pelo espectador. É difícil traçar uma sinopse.
Além do casal de classe média, cerca de 50 anos cada um, e da visita misteriosa, mas nem tanto, há uma quarta personagem, Flavinha (Rejane Arruda, de "Valsa Nš 6"), cuja gana juvenil vai equilibrar a perversão da língua nas cenas de embate em que Edson parece jogar contra todos.
"É sobre a intolerância. A intolerância de sexo, de raça, de religião, enfim, a não-aceitação do diferente", diz Guzik, 59. "Meu Deus, e como há edsons por aí, todos conhecemos um! E nós mesmos introjetamos atitudes assim às vezes sem nos darmos conta."
Segundo o ator, o público vai se reconhecer nesses personagens movidos por paixões obsessivas.
"O Horário de Visita" é a segunda peça de Roveri, 42, encenada na cidade ("Vozes Urbanas" segue no Espaço Satyros 1).
Ruy Cortez, 28, assina a direção do espetáculo, de estrutura mais realista que as suas encenações para a poesia dos textos "Ophélias" e "A Casa Antiga", ambos do dramaturgo Eduardo Ruiz.
Laura Carone criou os figurinos e a cenografia, uma sala que sugere o confinamento físico e simbólico de quem a habita.
Sobre voltar ao palco mais de três décadas depois, o também dramaturgo e romancista Alberto Guzik ("Risco de Vida") diz que "é como andar de bicicleta". O corpo não se esquece. (VS)


O HORÁRIO DE VISITA - De: Sérgio Roveri. Direção: Ruy Cortez. Com: Alberto Guzik. Onde: teatro do Centro da Terra (r. Piracuama, 19, tel. 3675-1595). Quando: estréia hoje, às 21h; sáb., às 21h, e dom., às 19h. Quanto: R$ 20. Até 5/10.


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