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ORQUESTRA DE FILADÉLFIA
Grande à sua maneira
DO ARTICULISTA DA FOLHA
Más orquestras são todas semelhantes; cada grande orquestra é grande à sua maneira. A Orquestra de Filadélfia, por
exemplo, que tocou sábado na Sala São Paulo: grandiosidade, neste
caso, não rima (como é habitual)
com monumentalidade, suntuosidade ou opulência. Seria melhor
procurar uma palavra menor e
mais simples para essa orquestra
elétrica e coesa.
Quem regeu foi o maestro russo
Yakov Kreizberg. Visto sem som,
pareceria um regente de desenho
animado, alguém fazendo uma
imitação de Charles Chaplin fazendo uma imitação de regente.
Comentário inevitável, mas injusto para quem faz uma orquestra
dessas tocar com tamanho brilho.
Depois de algum tempo, a gente
acostuma e acaba até gostando
dos maneirismos. Kreizberg rege
tudo de memória, com empatia e
sabedoria, e tem momentos de
real inspiração. Exemplo: a passagem para o primeiro grande tema
lírico da "Sinfonia nš 4" de Schumann (1810-56), uma de tantas
onde ele fez a música desacelerar
delicadamente até chegar num
outro tempo, uma narrativa dentro de outra. (Na "Dança Húngara" de Brahms, no bis, isso chegava ao paroxismo, com efeito quase desbragado.)
Exemplo 2: os violoncelos trazidos à tona na repetição do "trio",
no "Scherzo". A melodia geralmente fica escondida, fazendo
contraponto à principal; aqui ganhou novos privilégios. Mais um
exemplo? O "crescendo" das violas, saindo de dentro do dos fagotes e contrabaixos, no início da
"Patética" de Tchaikovsky (1840-93). Detalhes assim são a própria
vida da música e definem a imaginação de quem toca.
Schumann era o compositor favorito do escritor Roland Barthes
(1915-80), que escreveu mais de
uma vez sobre ele no contexto de
seus comentários sobre o desejo e
a paixão amorosa. Nada soa mais
barthesiano, hoje, do que as suspensões não resolvidas na música
de Schumann. Tanto maior seu
impacto quando tocadas com
tanta leveza e juventude.
Lideradas pelo "spalla" David
Kim, as cordas da orquestra são
um alento para quem não tem
mais grandes ilusões neste setor.
E os segundos violinos são o máximo.
Existem as grandes e grandiloquentes orquestras, as grandiosas
e opulentas, as suntuosas, as mirabolantes. A Filadélfia é fulminante, sem pompa.
A engenharia funciona como se
fosse natural; o som é brilhante,
mas com acentos de outono, como o reflexo das árvores nas
águas do rio Schuylkill.
Comparada à Filarmônica de
Nova York, esta é uma orquestra
menos sofisticada. Comparada à
Concertgebouw, menos metafísica. À Viena, menos vivida e sedutora. Etc. etc. Mas cada grande orquestra é grande à sua maneira e a
Filadélfia hoje está fazendo música como ninguém.
(ARTHUR NESTROVSKI)
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