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CRÍTICA
Chahine mostra produção de natureza industrial e clássica
INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA
Youssef Chahine é, de todos
os cineastas da Mostra, provavelmente aquele destinado a ser
o menos compreendido. Isso porque seu cinema está nos antípodas daquilo que esse público esclarecido conhece e espera.
É preciso lembrar que o cinema
nasceu popular, e não letrado;
plebeu, e não intelectual. E que
Chahine é um senhor de quase 80
anos que participa ativamente da
indústria cinematográfica egípcia. O que pode causar estranhamento em seus filmes é, portanto,
a natureza industrial, plenamente
clássica, como a encontrada em
"Alexandria... Nova York".
Para contar a história, Yehia, cineasta egípcio que, ao ser enfim
reconhecido na América com
uma retrospectiva, também descobre ter um filho cuja mãe, Ginger, ele amou intensamente no
tempo em que estudava direção
de teatro nos EUA. O filho, Alexander, é um famoso bailarino e
se tem na conta de americano
cem por cento, de maneira que essa história de se descobrir filho de
um egípcio não o encanta.
Um flashback nos colocará então em contato com a história de
Ginger e Yehia quando jovens estudantes de arte, seu encontro, o
amor, a despedida. Essa parte se
passa no fim dos anos 40 e é bem
diferente da outra, atual.
No flashback, não existem tensões nas relações entre Yehia e os
EUA. Já na fase atual elas estão
por toda parte: a recusa do filho
em reconhecê-lo é aquela em torno da qual gira o filme. Claro: hoje
ele vê os EUA como o império que
oprime o mundo árabe de maneira quase escandalosa. A relação é,
portanto, a de um amor profundo
empanado pelo ressentimento.
Um amor não correspondido. É
mais ou menos claro que esses
sentimentos mistos que o velho
Yehia experimenta são em grande
parte os do mundo árabe.
A dificuldade do espectador talvez consista em conciliar esse tipo
de idéias com um cinema que não
evita o narrativismo mais clássico,
não foge do melodrama. Nessa
adesão a uma retórica cinematográfica dos anos 50 existe uma tradição cinematográfica (egípcia).
Mas não é ela que interessa tanto.
Ela nos remete a um momento
em que o cinema americano representava a modernidade e iluminava o mundo (não só o árabe)
com ela. É como se Chahine buscasse, também, preservar esse
momento, de modo a reencontrar
uma América digna de ser imitada e não de ser combatida.
Alexandria... Nova York
Alexandrie... New York
Direção: Youssef Chahine
Produção: Egito/França, 2004
Quando: hoje, às 20h30, no MIS (outras
sessões amanhã e dias 30 e 1º)
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