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ELEIÇÕES 2006/PRESIDÊNCIA
Novo figurino é tentativa de recuperar prestígio com população carente e classe média em 2006
Lula troca slogan de "Paz e Amor" por "Pai dos Pobres"
KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O presidente Luiz Inácio Lula da
Silva pretende se apresentar candidato à reeleição em 2006 com
um figurino menos "Lulinha Paz
e Amor", adotado em 2002 sobretudo para conquistar a confiança
dos mercados, e mais "Pai dos Pobres", em uma tentativa de recuperar seu prestígio com as camadas mais carentes do eleitorado e
atrair a classe média com o argumento que a sua opção número 1
foi o combate à miséria.
O figurino neogetulista explica a
recente decisão de ampliar gastos
públicos para os mais pobres e
junto aos setores tradicionalmente ligados ao PT que estão insatisfeitos com o governo, como a
classe média e o funcionalismo
público.
Lula acredita que seu carisma
fará diferença na hora em que o
debate eleitoral esquentar. Crê
que se sairá melhor no discurso
de campanha do que os tucanos
José Serra ou Geraldo Alckmin,
hoje os adversários que o petista
considera mais prováveis. Procurará enfatizar sua origem popular
e tachar os tucanos de elitistas que
já tiveram a chance de governar o
Brasil e que teriam feito pouco.
"Efeito Erundina"
O presidente diz, em conversas
reservadas, que não será vítima
do "efeito Erundina" -expressão
cunhada por auxiliares para explicar sua decisão de ampliar gastos públicos no ano eleitoral.
Segundo ministros, o presidente afirma que não pretende repetir
a experiência de Luiza Erundina,
atual deputada federal do PSB
paulista que se elegeu prefeita de
São Paulo em 1988, pelo PT. Erundina fez um governo de saneamento das contas públicas, interrompendo obras da gestão anterior (Jânio Quadros), combinado
a políticas sociais de pouca visibilidade pública. Resultado: em
1992, Paulo Maluf ressuscitou politicamente, derrotou o PT e recebeu a prefeitura com recursos em
caixa para fazer um grande pacote
de obras que lhe rendeu boa avaliação em 1996, ano em que elegeu
o sucessor, Celso Pitta.
Em conversa reservada com
seus ministros, Lula disse que já
avisou o titular da Fazenda, Antonio Palocci, de que não vai fazer
como Erundina, que teria entregue tudo arrumado para seu sucessor gastar à vontade. Lula deseja ter espaço para elevar os gastos públicos, como aumentar o
salário mínimo de R$ 300 para R$
350 a partir de maio e reajustar
em 7% a tabela do IR (Imposto de
Renda) das Pessoas Físicas.
Essas medidas fazem parte de
um "pacote de bondades" que pode chegar a R$ 15 bilhões em 2006.
Com um mínimo de R$ 350, poderá dizer que, na média, deu reajuste real (descontada a inflação)
superior ao dos oito anos do governo de seu antecessor, o tucano
Fernando Henrique Cardoso.
Média anual de 5,4% do petista
contra 4,7% do tucano.
A correção da tabela do IR objetiva agradar a classe média, como
desejam os sindicalistas ligados
ao presidente, entre os quais o ministro do Trabalho, Luiz Marinho. Em seus oito anos de governo, FHC só a reajustou uma vez.
Do "pacote de bondades" consta ainda o reajuste salarial para o
funcionalismo público (R$ 3,5 bilhões). Os servidores públicos
sempre fizeram parte da tradicional base eleitoral do PT, mas andam insatisfeitos com o governo
petista, que concedeu aumentos
lineares irrelevantes nos três primeiros anos de administração.
Na prática, a inflexão na política
econômica que Lula cobra de Palocci será destinar mais recursos
para camadas da sociedade que
podem voltar a avaliar bem o governo e votar novamente no petista para presidente. Em público,
Palocci fará o papel de quem segura gastos. Nos bastidores, já fechou com Lula e vai elevar gastos
até o que considera limite da responsabilidade fiscal. Há "gordura" para queimar, diz um auxiliar,
referindo-se às seguidas elevações
de receita tributária.
Em dezembro, Lula deu uma
declaração que evidenciou seu temor do "efeito Erundina": "Não
vamos deixar ninguém colher a
semente que nós botamos debaixo da terra".
Pesquisa Datafolha em 13 e 14
de dezembro alarmou Lula e auxiliares. Pela primeira vez, o tucano José Serra, prefeito de São Paulo, superou o presidente na fase
inicial. Serra teve 36% de intenção
de voto no primeiro turno contra
29% de Lula. No segundo turno, o
tucano venceria o petista por 14
pontos de diferença (50% a 36%).
Hoje, Lula avalia que continua a
ser um candidato forte no primeiro turno, mas voltou a ser um
postulante fraco para disputas da
segunda fase -seu calcanhar-de-aquiles nas eleições presidenciais
perdidas de 1989, 1994 e 1998.
Um ministro disse à Folha que
os resultados obtidos pelo atual
governo são pífios em relação à
expectativa gerada pela eleição de
Lula, mas são bons na comparação com outros governos.
Por isso, Lula insistirá no figurino de que priorizou políticas para
os mais pobres (inflação baixa e
alto investimento na área social).
Ao criticar a comunicação do
governo, o presidente sempre diz
que o Bolsa-Família deve ser vendido para a classe média como
prova de que ela paga conta social
da qual deveria se orgulhar. Ou
seja, fazer uma propaganda de governo (ou eleitoral) para tentar recuperar parte da classe média que
se diz de esquerda e que teria simpatia pela antiga tese do PT de
combate à exclusão social.
O jornalista João Santana, marqueteiro que dá consultoria ao
Palácio do Planalto, deverá exercer o papel que foi do publicitário
Duda Mendonça na campanha de
2002. A comparação de dados entre as gestões de Lula e FHC será
uma das principais linhas da campanha petista.
Lula tem dito que a Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios) de 2004 constatou
melhora na distribuição de renda
e redução da pobreza. A Pnad revelou expansão de 3,3% na massa
salarial dos trabalhadores. E redução de 22,4% do número de domicílios sem renda.
O presidente avalia que o combate rigoroso à inflação e o Bolsa-Família tiveram influência na melhora desses indicadores sociais.
Em 2002, último ano de FHC, o
governo federal gastou R$ 2,3 bilhões com todos os seu programas de transferência de renda.
Em dezembro de 2003, primeiro
ano de Lula, o mesmo tipo de gasto subiu para R$ 3,4 bilhões. Em
2004, com todos os programas de
transferência de renda fundidos
no Bolsa-Família, Lula pagou
R$ 5,7 bilhões em benefícios. Em
2005, gastará R$ 6,5 bilhões.
Em 2006, Lula quer destinar
R$ 8,3 bilhões para atender a mais
de 11 milhões de famílias com o
seu principal programa social.
PT e economia
Como parte da estratégia para
ser candidato à reeleição, Lula
tem se dedicado a enquadrar o PT
às suas condições, como fez na
campanha de 2002. O presidente
aprova a pressão petista para que
sinalize com um segundo mandato mais voltado para as bandeiras
do partido do que para um controle rígido da economia.
Não deseja, porém, que a política econômica seja bombardeada.
Prefere que o partido o ajude a
pressionar Palocci a fazer inflexões, como a ampliação de gastos
públicos. Lula acredita que, a partir de abril, a economia voltará a
exibir dados positivos, diminuindo o desgaste com a previsível notícia, no início de 2006, de que o
PIB de 2005 terá crescido menos
de 3% -provavelmente em torno de 2,5%, bem abaixo da expectativa do próprio Lula, que chegou a falar em 5% em agosto. O
presidente admitiu na última reunião ministerial de 2005 que a
queda do PIB havia sido sua
maior decepção no ano.
No movimento para enquadrar
o PT, Lula tem resistido a assumir
publicamente a candidatura à
reeleição. Chega a falar que pode
desistir, mas é jogo de cena. Avalia que precisa endurecer com o
PT para poder fazer concessões a
aliados e costurar uma aliança
competitiva em 2006.
Em outubro, quando viajou para Portugal e Itália, o presidente
disse a dirigentes de partidos de
esquerda que seria candidato e
que derrotaria a oposição. Em novembro, falou em entrevista de
rádio que disputaria em 2006,
mas recuou depois, dizendo ter
cometido um lapso.
Na intimidade, Lula avalia que
não tem como deixar de ser candidato. Planeja se lançar em fevereiro. Não disputar seria confissão de um fracasso que ele disse
não poder cometer quando se elegeu em 2002. Mais: não teria ninguém a defender sua gestão.
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