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QUESTÃO INDÍGENA
Índios usam bicicleta para convidar aldeias vizinhas; ritual é preparado ao som de música sertaneja
Quarup sofre influência de cultura branca
NOELI MENEZES
DA REDAÇÃO
A mais importante celebração
dos índios do Alto Xingu, o quarup, foi, este ano, uma demonstração da influência da civilização
branca na cultura indígena.
O ritual é a ocasião em que todas as tribos que vivem no Alto
Xingu, dentro do Parque Nacional do Xingu (MT), homenageiam seus líderes mortos.
A cerimônia poderia ser considerada a mesma de 50 anos atrás
não fosse a presença de tantas influências externas.
Neste ano, a tribo kuikuru organizou a celebração, pois dois de
seus líderes morreram. Jovens foram de bicicleta até as aldeias vizinhas convidá-las. Políticos da região também receberam convite.
Os kuikurus, embalados por
músicas sertanejas que tocam em
rádios espalhados pela aldeia, começaram a preparar a cerimônia
uma semana antes. Índios pescam, e as mulheres preparam beijus. Outros vão para o mato, de
onde trazem dois troncos de pouco mais de um metro.
Os xinguanos acreditam que
Mavutsinim, grande herói de origem da comunidade do xingu, foi
o primeiro homem. Eles contam
ainda que Mavutsinim queria que
os mortos voltassem a viver e que,
por isso, criou o ritual.
Os troncos são alinhados, pintados e enfeitados com colares, penas e bexigas de borracha, que foram a sensação da celebração.
Segundo Acari Maluá, chefe de
serviços da administração da Funai no Xingu,"tudo é novidade
para os xinguanos".
Um kuikuru, ao se preparar para a festa, pinta uma camisa do
Vasco no corpo. Outro usa os santinhos dados por um candidato
como adereço. No lugar de pintura, um kuikuru coloca uma tornozeleira de jogador de futebol.
Quando o ritual começa, o rádio
é desligado. Mesmo fantasiados
de brancos, os índios esquecem a
presença estranha e se concentram no ato religioso. Ouve-se só
um choro contínuo, provocado
pela lembrança dos mortos. Um
índio fica fora do ritual, pois foi
encarregado de filmá-lo.
Os xinguanos acreditam que,
quando um pessoa morre, seu espírito vai para o céu. Para eles, durante a festa do quarup, o espírito
sai do céu e vai para o tronco.
Os visitantes brancos, que chegaram à festa de avião, apenas assistiram ao ritual.
O cenário do próximo quarup
será definido ao longo do ano.
Dependerá das novidades que os
índios acolherão em sua cultura.
Há 20 anos, o indigenista Orlando Villas Bôas disse: "Integrar é
destruir o índio".
Maluá explica de outra forma:
"Todo mundo fala nas inovações
do novo milênio. O índio quer
usufruir disso também".
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