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FINANCIAMENTO DE CAMPANHA
Ex-gerente da Cliba, contratada pela Prefeitura de SP este ano, fez doações em 98 em nome de contador
Empresário ocultou doação a Lula e Dirceu
RUBENS VALENTE
DO PAINEL
LILIAN CHRISTOFOLETTI
DA REPORTAGEM LOCAL
Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente nacional do PT, José Dirceu, receberam doações em 1998
do empreiteiro argentino Santiago Crespo, mas o nome dele não
aparece nas prestações de conta
apresentadas à Justiça Eleitoral
pelas duas campanhas petistas.
Até junho último, Crespo dirigia a empresa Cliba, contratada
em abril pela Prefeitura de São
Paulo para fazer a coleta de lixo.
A identidade do real colaborador de campanha foi revelada pela própria pessoa que aparece como "doadora" nos papéis entregues pelo PT à Justiça Eleitoral: o
técnico em contabilidade José
Carlos Barreira, 42, e confirmada
pelo empreiteiro.
Advogados consultados pela
Folha disseram que, em tese, a suposta omissão do nome do doador não poderá ser apurada pela
Justiça Eleitoral, porque o prazo
para tal já prescreveu.
O empreiteiro abriu uma conta
bancária conjunta com o seu contador, mas ela era toda controlada
pelo empresário, que assinava todos os cheques, segundo informou Barreira. Nas listas dos doadores encaminhadas ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e ao
TRE (Tribunal Regional Eleitoral)
aparece apenas o nome do contador, e não o do empresário.
Barreira, que trabalhou para a
empresa do argentino, foi localizado em São Carlos (SP), onde
trabalha e mora atualmente, para
que confirmasse quatro doações
que teria feito em cheques, no valor total declarado de R$ 20 mil
(R$ 15 mil para a campanha de
Dirceu e R$ 5 mil para a de Lula).
As doações de Crespo para Dirceu são a segunda maior da campanha do deputado, ao lado da da
empresa Cardsystem.
Barreira primeiro negou as doações: "Não doei, com certeza. De
alguma forma me envolveram
nisso aí". Depois, Barreira disse
ter descoberto o que teria ocorrido. Contou que Crespo usou uma
conta conjunta, na qual o argentino tinha o poder de assinar os
cheques. O contador diz nunca ter
recebido extrato dessa conta nem
ter sabido de novos gastos. Explicou que não conseguia emitir nenhum cheque apenas com a sua
própria assinatura.
O empresário pediu então, em
98, para usar o CPF de Barreira
para fazer doações a um partido.
Crespo é gerente-delegado da
Benito Roggio & Hijos do Brasil,
proprietária, até junho último, da
empresa de coleta de lixo Cliba,
contratada pela gestão Marta Suplicy (PT) em São Paulo e que
doou R$ 251 mil para a então candidata a prefeita no ano de 2000.
A Cliba foi comprada em junho
por Romero Niquini, que tem
empresas presididas por Willian
Chaim, ex-assessor de Dirceu.
A Cliba também trabalhou para
a gestão Celso Pitta e foi condenada, em primeira instância, por supostas irregularidades no aditamento de contratos.
A primeira reação de Barreira,
ao ser perguntado sobre as doações, por telefone, na manhã da
última quarta-feira por telefone,
foi definitiva. Após ler para ele seu
nome e CPF, a reportagem manteve o seguinte diálogo:
Folha - O sr. aparece como doador
da campanha de Dirceu em 98...
Barreira - Não.
Folha - O sr. nunca doou?
Barreira - Nunca, nunca, com
certeza. É meu nome, meu CPF,
mas nunca trabalhei com política.
Folha - O sr. conhece José Dirceu?
Barreira - Não conheço, nada.
Folha - É uma surpresa, isso?
Barreira - É, de alguma forma
me envolveram aí.
Folha - A doação foi registrada...
Barreira - Quer dizer, usaram
meu nome para... uma pessoa pode ter doado e, por algum motivo,
usado meu nome e CPF?
Folha - Aparentemente, sim.
Barreira - O valor é alto?
Folha - R$ 15 mil.
Barreira - [Rindo" Que legal.
Folha - Qual é o seu salário?
Barreira - Hoje eu estou com R$
4.800. Eu não iria dispor de R$ 15
mil para fazer uma doação.
Folha - Seu nome também está na
declaração de Lula.
Barreira - [Rindo] Rapaz...
No segundo contato, na tarde
de quarta-feira na empresa em
que Barreira trabalha, a conversa
foi acompanhada pelo ombudsman da empresa, Cláudio Luiz de
Carvalho, e por outro colega de
Barreira. O contador voltou a negar as doações para Lula e Dirceu.
Disse que em 1998 tinha uma
microempresa na periferia de São
Paulo e prestava serviços para a
empreiteira Benito Roggio. Contou que teve contas no HSBC e no
Itaú. Os cheques das doações,
conforme o TRE informou depois, são do banco Sudameris.
O contador disse que iria apurar
a razão de seu nome aparecer como doador. Na sexta-feira, Barreira, em novo contato,disse ter
telefonado para o empreiteiro,
que teria lhe dado explicações.
Segundo o contador, Crespo
lembrou-lhe que em 98 pediu
uma autorização para usar seu
CPF para um recibo de doação.
Barreira recordou-se do diálogo:
"Ó, vou fazer um recibo de uma
doação, só que não quero aparecer, então posso usar seu nome e
CPF?". Eu autorizei. Eu não fiz
cheque, eu não fiz absolutamente
nada e ele usou essa conta", disse
o contador. A única dúvida de
Barreira era a respeito do valor
das doações: "Me dá a impressão
que talvez eu tenha autorizado, a
fazer o recibo de uns R$ 5 mil, e,
no final das contas, onde passa
um boi, passa uma boiada, aí fizeram outros recibos e outros cheques".
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