São Paulo, Segunda-feira, 01 de Novembro de 1999
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CRÉDITO POPULAR
Dos R$ 150 milhões disponíveis para empréstimos no BNDES, apenas R$ 16,3 mi foram contratados
Banco do povo usa só 10,8% dos recursos

MARTA SALOMON
da Sucursal de Brasília


Três anos depois de lançado pelo governo federal, o Programa de Crédito Produtivo Popular, conhecido como banco do povo, mal saiu do papel.
Dos R$ 150 milhões repassados ao BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) em 1996 para empréstimos a quem não tem acesso à rede bancária, apenas R$ 16,3 milhões foram contratados.
O valor corresponde a 10,8% da primeira leva de recursos repassados pelo FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador) a um dos mais importantes programas de geração de emprego e de renda do governo Fernando Henrique Cardoso.
Equivale também a cerca de 4,5% do financiamento prometido pelo BNDES à empresa norte-americana AES, vencedora do leilão da companhia energética paulista Cesp Tietê, ocorrido na última quarta-feira.
Os números sobre o desempenho do programa constam de documento encaminhado em outubro pelo ministro do Desenvolvimento, Alcides Tápias, ao Congresso em resposta a um pedido de informação do deputado Pedro Celso (PT-DF).
""As dificuldades encontradas são as esperadas em uma iniciativa da envergadura do Programa de Crédito Produtivo Popular do BNDES", informa o ministro do Desenvolvimento.

Promessas
A importância dada por Fernando Henrique Cardoso ao microcrédito pode ser constatada no programa de governo do candidato à reeleição.
Para o segundo mandato, o presidente prometeu nada menos do que 860 mil operações anuais de crédito nas duas modalidades previstas pelo BNDES por meio de organizações não-governamentais ou de fundos estaduais e municipais.
O Programa de Crédito Produtivo Popular aplicaria cerca de R$ 290 milhões e seria responsável pela criação de nada menos do que 250 mil empregos em quatro anos -prometeu FHC, ou seja, 3,2% da meta total de criação de empregos mencionada pelo Plano Plurianual, também conhecido como ""Avança Brasil".
No programa de governo, FHC afirma que a experiência ""está se disseminando".

Resultados tímidos
Não é o que se vê nas informações prestadas por Tápias: os resultados apresentados pelo BNDES nos três primeiros anos do programa são mais do que tímidos.
Apenas 20 organizações não-governamentais em 14 Estados conseguiram cumprir as exigências fixadas pelo banco. O BNDES Solidário cobrou, por exemplo, ""pelo menos seis meses de efetiva e eficaz atuação em crédito produtivo popular, demonstrada através do número e qualidade das operações, do público atendido e da sua estrutura operacional".
Na modalidade do programa que prevê parcerias com Estados e municípios, batizada de BNDES Trabalhador, o resultado foi nulo. Nenhum governo estadual e nenhuma prefeitura fechou contrato com o BNDES.
Nesse caso, o banco exigia, além de contrapartida de 20% dos Estados e 20% dos municípios, a participação de pelo menos 10% das prefeituras de um determinado Estado, entre outras condições. Os empréstimos oferecidos pelo BNDES iriam de R$ 200 a R$ 5.000.
Ao contrário do que vem acontecendo com o programa comandado pelo BNDES, há experiências bem sucedidas dentro e fora do Brasil.
A idéia surgiu no início da década de 70, como uma estratégia para combater a pobreza. Mediante empréstimos de pequeno valor, cada pobre passou a ser considerado uma unidade produtiva.
O lançamento do programa federal contou com a defesa de Ruth Cardoso, presidente do Conselho da Comunidade Solidária.

Modelo
O modelo brasileiro para o governo federal foi a experiência do BRB-Trabalho, lançado no final de 1995.
Entre 1996 e 1998, foram aplicados R$ 5,4 milhões para compra de matéria-prima (capital de giro), máquinas e equipamentos (investimentos) por 3.855 pequenos empreendedores do Distrito Federal.
Segundo avaliação do programa, cada financiamento foi responsável pela manutenção ou geração de dois empregos no Distrito Federal.
Entre os tomadores de financiamentos, 69% eram mulheres. As taxas de juros médias ao mês eram inferiores a 1,5%.
O deputado Pedro Celso (DF), secretário de Trabalho do Distrito Federal na época, sustenta que a saída para o governo é desburocratizar o microcrédito. Ele também questiona o desempenho do BNDES no programa, diferente do apresentado em outras modalidades de financiamento.
Segundo resposta a outro requerimento de informações da Câmara obtida pela Folha, o BNDES informou que o total de dívidas de empresas privadas atingiu R$ 28,6 bilhões no final do primeiro semestre do ano. Duas empresas estrangeiras deviam à época ao BNDES R$ 156,5 milhões.


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