São Paulo, terça-feira, 02 de janeiro de 2001

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QUESTÃO AGRÁRIA

Falb Saraiva de Farias teria 10 milhões de hectares na Amazônia; 80% teriam escrituras falsificadas

Incra investiga novo megalatifundiário

KÁTIA BRASIL
DA AGÊNCIA FOLHA, EM MANAUS

Um levantamento da Procuradoria-Geral do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) do Amazonas, em cartórios de cinco cidades do Estado, constatou que o acreano Falb Saraiva de Farias, 66, pode ser o maior latifundiário do Brasil.
Pelo levantamento, Farias teria mais de 10 milhões de hectares de terras na floresta amazônica (o equivalente ao tamanho do Estado de Pernambuco). Ele afirma ter 6 milhões de hectares.
Pelos dados do Incra, Farias tem mais terras do que a Rondon Projetos Ecológicos, do empreiteiro Cecílio do Rego Almeida, que tem 7 milhões de hectares no Pará. Almeida era considerado o maior latifundiário do país.
Filho de seringueiro, Farias é investigado pelos procuradores do Incra desde que passou a solicitar, com freqüência, o Certificado de Cadastro do Imóvel Rural para vender terras a empresas em dívida com o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). As terras, compradas a preços baixos, seriam oferecidas ao governo para reforma agrária em troca do cancelamento das dívidas.
O Incra cancelou certificados que estavam em nome de Farias após constatar o esquema.
"É preciso uma interdição rápida da Justiça Federal para cancelar as escrituras dessas terras, pois Falb as está vendendo para empresas em dívida com o INSS", disse o procurador-geral do Incra, Mário Braulio Pinto da Silva.
Segundo ele, as empresas que compraram terras do latifundiário para esse fim também serão investigadas pela Receita Federal. Por medida de segurança, os nomes delas estão em sigilo.
"Ao verificarmos a cadeia dominial dos imóveis constatamos que os títulos de Falb são nulos de pleno direito. São posses que não podem ser registradas por estarem em terras da União, destinadas à reforma agrária. Estamos preservando o patrimônio público", disse o procurador, acrescentando que pedidos de cancelamento das escrituras foram rejeitados pela Corregedoria Geral de Justiça do Amazonas.
A investigação está a cargo agora da Polícia Federal do Amazonas, que abriu 12 inquéritos. Segundo um delegado, Farias já prestou dois depoimentos e será convocado de novo em janeiro.
As investigações mostram que 80% das terras foram griladas (têm escritura falsa). Serventuários da Justiça do Amazonas e funcionários do Incra também são investigados pela PF.
Um delegado da PF, que não quis se identificar, diz que Falb deverá ser indiciado em crime de estelionato e invasão de terras destinadas à reforma agrária. As investigações apurariam crimes de falsidade ideológica, falsificação de documentos públicos e particulares, corrupção ativa e passiva e sonegação fiscal.
"A Polícia Federal só viu até agora a parte do Incra. Os documentos que eu tenho são originais. Eu estou tranquilo", defende-se Farias, confirmando que vendeu terras para uma empresa com dívida com o INSS.
"Em 1996, vendi 329 mil hectares para essa empresa. Eu não sabia que ela tinha dívida com o INSS, isso foi problema dela. Eles não me pagaram os R$ 300 mil. Deram notas frias", afirmou.
Mas a Polícia Federal ainda não descobriu quanto Farias lucrou vendendo terras a empresas e pessoas físicas, de São Paulo e do Rio Grande do Sul, interessadas em um pedaço de terra na Amazônia.
O Incra descobriu também que Farias tem mais de 20 empresas em seu nome. Essas empresas também seriam proprietárias de terras. Apenas no município de Canutama ele possui 2.820.429 hectares de terra.
No município de Tapauá, Farias teria registrados em cartório, segundo o Incra, mais 6.342.202 ha, 249.154 ha em Pauini e 1 milhão de hectares em Novo Aripuanã, no Amazonas. E mais 225.000 ha em Sena Madureira, no Acre. Um total de 10.636.785 hectares.
As terras no Amazonas vêm, segundo Farias, de uma escritura de 1926, de Maria Luiza Hidalgo Lima de Barros, viúva de um comerciante de navegação. No Termo de Partilha, de 1954, consta que as terras foram registradas a partir de áreas denominadas "posses de estradas de seringais".
Segundo o Incra, os registros foram alterados quando da retificação das áreas originais nos cartórios. A área "Suvaco Dois de Julho e outros", por exemplo, originalmente com 3.000 hectares, passou para 780.000 hectares (área maior do que a da Irlanda).



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