São Paulo, segunda-feira, 02 de janeiro de 2006

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ PRESIDENTE

Para presidente, partido tem "salvação" e adversários apressam debate eleitoral

Lula diz que PT vai "sangrar" para recuperar credibilidade

LUCIANA BRAFMAN
DA SUCURSAL DO RIO

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que o PT ainda vai "sangrar muito" para recuperar a credibilidade perdida depois das acusações de uso de caixa dois e corrupção que resultaram na crise política do ano passado, mas disse acreditar que o partido tem "salvação".
"O PT cometeu um erro... Um erro que é de uma gravidade incomensurável. Todo mundo sabe -e sabe o PT hoje e sabe quem cometeu os erros- que o PT cometeu um erro que será de difícil reparação pelo próprio PT. O PT vai sangrar muito para poder se colocar diante da sociedade outra vez com uma credibilidade que ele conquistou ao longo de 20 anos", afirmou Lula em entrevista gravada no dia 29, que foi ao ar ontem à noite no programa "Fantástico", da Rede Globo.
A afirmação do presidente foi feita ao comentar a declaração do repórter Pedro Bial sobre entrevista anterior, realizada em Paris, na qual Lula disse que o caixa dois do PT era prática sistemática da política brasileira. Em seguida, Lula disse que o PT vai recuperar sua credibilidade.
"Acho que [o PT] tem salvação porque o PT é um partido muito grande. E numa família, quando alguém comete um erro qualquer, você não pune a família inteira. Vai ser punido quem cometeu o erro. E a legenda continuará com a mesma grandeza com que fez política nestes últimos 20 anos."
Lula também declarou que recebeu como uma "facada nas costas" as denúncias sobre o esquema montado pelo PT com o empresário Marcos Valério. Esse trecho da entrevista de 35 minutos já havia sido divulgado na semana passada, quando repórteres assistiram parte da gravação.
O presidente afirmou que se sentia traído por ter dedicado parte de sua vida, inclusive com suas crianças dormindo na calçada e vendendo camisetas, para construir o PT, um partido para mudar a forma de fazer política.
Sobre sua alegação de inocência em relação às denúncias, Lula disse, com o dedo em riste, que gostaria de receber pedidos de desculpas, pela "leviandade" dos que fazem julgamentos precipitados.
"Com relação à minha pessoa, a única coisa que eu peço a Deus é que, quando terminar tudo isso, aqueles que me acusaram peçam desculpas. Só peço isso. Não quero, não quero nada mais do que isso. Peçam desculpas."
Durante grande parte da entrevista, Lula repetiu a importância de o governo, Ministério Público, Polícia Federal e CPIs investigarem as denúncias. E disse que fez a sua parte, assim como o PT, quando os casos vieram à tona.

Evasivas
Muitas vezes as declarações serviam para que se esquivasse de responder diretamente as perguntas. Foi esse o caso quando foi questionado se sabia (dos esquemas de corrupção). Primeiro, Lula disse que só há três hipóteses de saber das coisas: "Quando você participa da reunião ou quando alguém que participou te conta ou quando sai uma denúncia".
Em seguida, o jornalista insistiu dizendo que o ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares era próximo do presidente.
Lula, então, afirmou: "O que é importante... O que é importante não é se você sabia ou não, porque, se eu tivesse condições de saber, não teria acontecido. Esse é o dado concreto. Se eu tivesse condições de saber, não teria acontecido. Na medida em que eu soube, naquilo que diz respeito ao presidente da República, as providências todas foram tomadas. Foi afastado quem deveria ser afastado. Foi punido quem deveria ser punido. Agora, a Justiça faça a sua parte. E, no caso do PT, o PT fez a sua parte".
O presidente pediu que não se condene ninguém antes de haver provas conclusivas. Citou como exemplo, a situação do ex-ministro José Dirceu, cujo processo ainda estaria inconclusivo, diferentemente do "Delúbio, que assumiu a responsabilidade".

Reeleição
Lula não respondeu se será candidato neste ano. Disse que ainda há muito trabalho a fazer e que tem tempo, "lá pelo meio do ano", para definir se tentará a reeleição. Disse, porém, que além de trabalho a fazer, tem frutos a colher.
"Não tenho pressa. Quem tem pressa são os meus adversários. Eu não tenho pressa. Eu tenho que governar o Brasil até o dia 31 de dezembro e tenho muita coisa para fazer. Muita coisa para fazer. E muita coisa para colher. Porque você sabe que é assim: você planta, rega e um belo dia você começa a colher", afirmou.
Lula disse que este ano será "o ano do povo brasileiro, porque está tudo engatilhado, está tudo preparado, está tudo armado para que o Brasil tenha um forte crescimento, uma forte distribuição de renda, muito emprego para esse povo e quem sabe a gente construir junto o Brasil que nós sonhamos há muito tempo construir".
Ele citou números e feitos de seu governo, sobretudo nas áreas econômica e social, criticou a imprensa por não dar mais espaço para realizações positivas e disse que fez a sua parte, ao responder sobre a impossibilidade de realizar reformas (trabalhista, sindical e tributária) em ano eleitoral.
"Não pode [fazer as reformas]. Deixa eu lhe contar. A minha parte eu cumpri. Nós criamos um Fórum Nacional do Trabalho em que participaram empresários, trabalhadores e o governo. Apresentamos uma proposta que está no Congresso Nacional. Não posso bater escanteio e marcar o gol ao mesmo tempo. Enviei o meu projeto ao Congresso Nacional e eu espero que ele vote."


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