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ELIO GASPARI
Benditos sejam
BID e Jackie Joy
Benditos sejam o Banco Interamericano de Desenvolvimento e Juliana Paes. Ajudaram a chamar a atenção para
um fenômeno em que se confrontam a garra do andar de
baixo e a preguiça empulhadora
do andar de cima da vida nacional. Trata-se do ervanário de
US$ 5,8 bilhões anuais que 1,3
milhão de brasileiros que trabalham no exterior remetem para
suas famílias em Pindorama.
Bendita Jackie Joy porque vai a
Boston para visitar sua mãe e
sua irmã, que emigraram e trabalharam na cidade como faxineiras.
Num país presidido por um retirante cuja irmã (Maria) foi
empregada doméstica aos nove
anos, saber que a mãe de Juliana foi faxineira faz enorme bem
à alma. Estima-se que haja perto de 500 mil brasileiros na região de Boston. Lá, uma empregada doméstica pode faturar
US$ 50 por hora. Ou seja, numa
faxina de duas horas, um emigrante consegue mais (R$ 310)
do que o salário mínimo defendido pelo irmão de Maria (R$
260).
Houve uma época em que o
Brasil recebia emigrantes. Nasceu no Brasil, em Rolândia (PR),
o vice-ministro das Finanças da
Alemanha, Caio Koch-Weser.
Sua família emigrou em 1933, e
ele teve a educação pré-universitária na rede pública e comunitária do interior paranaense.
Desde os anos 80, o Brasil que
transformava Lulas de Garanhuns em metalúrgicos do ABC
passou a exportar mão-de-obra.
São os engraxates da grand Central Station, ou o vendedor da
Brooks Brothers que pergunta
ao freguês se ele já viu a a Juliana na Playboy. (Se não viu, ele
traz a revista.) Há as garotas de
programa na Espanha, os ferramenteiros de Hamamatsu, o entregador numa cidade qualquer.
Teve uma época em que a empregada de Arthur Sulzberger, o
dono do "New York Times", era
brasileira. Os trabalhadores de
Pindorama fizeram renascer a
economia da cidade de Framingham, nas cercanias de Boston.
Essa brava gente trabalha,
economiza e manda dinheiro
para o Brasil. Nessa hora, são
tungados pelos intermediários
de suas remessas e pela desatenção que o andar de cima nacional tem pelo de baixo. Deve-se
ao BID a revelação de que metade do dinheiro remetido chega
ao Brasil por meio de mecanismos informais. Os US$ 5,8 bilhões equivalem à metade dos
investimentos diretos internacionais na economia nacional.
Quando um brasileiro quer
mandar US$ 1.000 para sua família, a banca e os regulamentos
dos doutores Antonio Palocci e
Henrique Meirelles mordem-no
em 8,5%, ou US$ 85. Quase um
salário mínimo da gestão petista. Graças ao trabalho do BID
vê-se que, se esse trabalhador
fosse português, não pagaria nada. Equatoriano ou espanhol?
1,5%.
A ekipekonômica cosmopolita
que arruina há uma década o
país jamais cuidou desse assunto a sério. Foi preciso que o BID
descesse os números para que o
Banco Central fizesse alguma
mímica. O governor Meirelles,
que presidiu o Banco de Boston,
conhece de cor e salteado as dificuldades dos brasileiros que trabalham no exterior e nunca fez
nada para reduzi-las.
A Caixa Econômica anunciou
que criará um engenhoso mecanismo de transferências eletrônicas. Atenderá apenas aos cidadãos que trabalham de acordo com as exigências dos países
onde vivem, circunstância com
a qual o governo brasileiro nada
tem a ver. Essa restrição deixa
fora mais da metade dos trabalhadores que estão nos Estados
Unidos e na Europa. Coisa de
mais de meio milhão de almas.
Na hora de agradar aos gatos
gordos da banca, a ekipekonômica é criativa. Ela odeia taxar
o capital do andar de cima, mas
não consegue refrescar as remessas do andar de baixo. Nessa hora, tem a preguiça de Macunaima e a criatividade das dobradiças.
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