São Paulo, sábado, 02 de agosto de 2008

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Jobim rebate Tarso e diz que Lei da Anistia não vai mudar

Planalto afirma que punição a torturadores da ditadura não foi discutida no governo

Ministro da Justiça diz ter expressado visão pessoal; para o chefe da Defesa, "não existe hipótese de você rever uma situação passada"

FÁBIO GUIBU
DA AGÊNCIA FOLHA, EM RECIFE

GRACILIANO ROCHA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM PORTO ALEGRE

O ministro da Defesa, Nelson Jobim, se opôs ontem frontalmente à idéia defendida por seu colega de ministério Tarso Genro (Justiça), de modificar a Lei da Anistia para permitir a punição de torturadores e assassinos da ditadura militar. "Não haverá mudança na Lei da Anistia", declarou Jobim à Folha, após participar da cerimônia de troca de comando no CMNE (Comando Militar do Nordeste), em Recife. "A Lei da Anistia já esgotou os seus efeitos", disse. "Já foram anistiados, não existe hipótese de você rever uma situação passada." A idéia de criar uma alternativa jurídica para que a lei, de 1979, não impeça a punição de agentes públicos envolvidos em tortura e morte durante a ditadura militar (1964-1985) foi discutida anteontem, durante audiência patrocinada pelo Ministério da Justiça.
No evento, em Brasília, Tarso defendeu a tese de que não há delito político na tortura e que, quem agiu assim pode ser comparado "a qualquer outro torturador". Mas, para Jobim, a Lei da Anistia "foi auto-suficiente" e "satisfez a situação que tinha para satisfazer". E pediu: "Vamos olhar para o futuro".
Questionado sobre a possibilidade de existir uma alternativa jurídica para punir os torturadores, Jobim disse que "isso é um problema que tem que ser examinado pelo Poder Judiciário, e não pelo Executivo".
Na solenidade no CMNE, o ministro ficou ao lado do comandante do Exército, Enzo Martins Peri. Também questionado pela Folha sobre o assunto, Peri se negou a falar. "Nenhum comentário", disse.
Indagado sobre o que achava da declaração de Jobim, de que não haveria mudanças na lei, o comandante sorriu e disse: "Se o ministro falou, está falado".
No Planalto, subordinados do presidente Luiz Inácio Lula da Silva tentaram reduzir a defesa de punição a agentes públicos que cometeram crime de tortura a uma avaliação pessoal dos ministros Tarso e Paulo Vanucchi (Direitos Humanos).
Disseram, por exemplo, que o tema não foi discutido em reunião de coordenação, o encontro semanal de Lula com seus principais ministros em que são debatidas as questões mais relevantes do momento.
Segundo assessores e ministros ouvidos pela Folha, Lula sempre teve atitude de cautela e moderação em relação ao tema, embora reconheça que o debate "existe" e é recorrente.
Não há consenso de que o governo como um todo deva se envolver diretamente na discussão. Um dos motivos é que entre os próprios ministros há discordância sobre o tema.
Em setembro do ano passado, o lançamento do livro-relatório sobre torturas e mortes durante o regime militar abriu crise entre Planalto, Defesa e Exército. Intitulado "Direito à Memória e à Verdade", foi assumido como documento oficial pelo governo e lançado no Planalto com a presença de Lula. À época, o Exército divulgou nota condenando a hipótese de mudança na Lei da Anistia.

Sintonia
Em Porto Alegre, ainda sem saber das declarações de Jobim, Tarso afirmou ter expressado seu ponto de vista pessoal, não o do governo.
"A posição que manifestei ontem [anteontem] é uma posição minha e do Paulo Vanucchi [secretário especial de Direitos Humanos], abordando juridicamente o tema à luz do direito constitucional e das normas legais da anistia. Não é posição de governo."
Segundo o ministro, a discussão "é um debate do Estado democrático de Direito".


Colaborou LETÍCIA SANDER, da Sucursal de Brasília


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