São Paulo, quarta-feira, 02 de outubro de 2002

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GOVERNO

Para presidente, se mudança dependesse só de decisões de gabinete, "seria fácil"

FHC critica "voluntarismo" e "bobagens" de candidatos

WILSON SILVEIRA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente Fernando Henrique Cardoso criticou ontem o "voluntarismo" de candidatos à Presidência. Sem mencionar nomes, disse que tem "tanta bobagem" na televisão e que só vontade política não resolve.
Segundo o presidente, não adianta o candidato ter milhões de votos no dia da eleição, porque no dia seguinte não tem mais, é preciso reconquistar a confiança do eleitorado a cada dia.
Durante discurso no Instituto Rio Branco, FHC disse que "o voluntarismo é a explicação de quem não sabe nada". Para ilustrar o que dizia, começou a citar ironicamente frases que costumam ser repetidas por candidatos na campanha, como: "Tudo depende da vontade política" e "tendo vontade política, acaba com a fome, acaba com a miséria, distribui a renda".
Em seguida, comentou: "Ai, meu Deus, haja paciência. Essa é uma visão absolutamente tecnocrática do que é o processo de mudança: imaginar que a mudança depende de decisões tomadas num gabinete, ainda que respaldada por milhões de votos. Se fosse assim, seria muito fácil".

"Bobagem"
O presidente prosseguiu em suas críticas, intercalando raciocínios de terceiros aos seus. "Essa vontade política nos atormenta dia e noite. "Basta baixar a taxa de juros e pronto." É tão bonito ver na televisão, tem tanta lógica... Tanta bobagem. "Basta baixar os juros que resolve tudo: aumenta a produção, barateia o produto, acabou a inflação. É lógico." Tudo errado. Como se fosse possível baixar os juros assim."
O discurso foi feito em solenidade que comemorou os 38 anos do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).
Se o presidente pretendeu atingir os candidatos da oposição, suas críticas se enquadram também no discurso do candidato oficial. O tucano José Serra também vem apontando a redução da taxa de juros como uma das principais soluções para a retomada do crescimento econômico.
FHC afirmou que talvez a transformação mais importante pela qual o Brasil passou nos últimos anos tenha sido o reconhecimento implícito e explícito de que, sem legitimidade, as coisas não funcionam.
"E a legitimidade se renova no dia-a-dia. Não adianta nem termos milhões de votos. Eu tive tantos. Não adianta. Quem pensa que com isso resolve... "Ah, nos cem primeiros dias tem voto e faz o que quer." Não é verdade, é um equívoco. Os votos você tem no dia da eleição, no dia seguinte não tem mais nada."
Segundo o presidente, é preciso reconquistar todos os dias a confiança e a legitimidade. "A oposição, o que ela trata de fazer? Solapar as bases da legitimidade. Isso é do jogo político, isso é normal que seja assim", disse.
O presidente afirmou que o Brasil deve combater a pobreza, a exclusão social e integrar o Brasil crescentemente no sistema internacional, com liberdade e com democracia.
"Imaginar que você pode refluir a uma posição dos anos 50 e fechar a economia outra vez, aumentar tarifas para proteger setores, para que esses setores ganhem dinheiro em nome de dar emprego, isso está errado e tem consequências. Paga-se alto custo a longo prazo por essas visões equivocadas do que é o desafio contemporâneo", disse FHC.
Segundo o presidente, equilibrar as contas da Previdência talvez seja o principal problema do Brasil. "Não vai ter como baixar a taxa de juros enquanto o governo sistematicamente for ao mercado para pedir mais dinheiro emprestado. E o governo não tem como deixar de ir ao mercado pedir dinheiro emprestado porque chegou ao máximo do que ele pode tributar e não chegou ao máximo de endividamento possível."
Para FHC, os gastos com a aposentadoria de servidores públicos são uma máquina de aumentar a dívida do governo. "Um terço do Orçamento fica nas mãos de 3 milhões de pessoas. Será democrático isso?", perguntou.

LEIA a íntegra do discurso de FHC na (Folha Online)



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