São Paulo, domingo, 02 de outubro de 2005

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ REFORMA POLÍTICA

Propostas em tramitação na Câmara foram discutidas em encontro promovido pela Folha e pelo Instituto de Direito Político e Eleitoral

Debate questiona novas regras eleitorais

FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL

As propostas de alteração das regras eleitorais do projeto elaborado pelo Senado, em tramitação na Câmara, são boas para os políticos, mas há dúvidas se realmente beneficiam os eleitores.
A avaliação foi feita pelo diretor-executivo da Transparência Brasil, Claudio Weber Abramo, no debate sobre "Reforma política e eleitoral" promovido pela Folha e pelo Instituto de Direito Político e Eleitoral, na quarta-feira.
O encontro evidenciou as dificuldades para a aprovação de mudanças no sistema político e eleitoral em meio a uma grave crise. Também participaram o cientista político Wanderley Guilherme dos Santos, do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro, Rubens Approbato Machado, ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, e Adilson Abreu Dallari, do conselho superior de assuntos jurídicos da Fiesp. O mediador foi o jornalista Vinícius Mota, editor do caderno Mundo da Folha.
Segundo Abramo, a redução do tempo de campanha, para diminuir seus custos, vai favorecer quem já está eleito, já que novos candidatos terão menos tempo de exposição. A proibição de divulgação de pesquisas eleitorais 15 dias antes das eleições não impedirá as "pesquisas fajutas" pela internet, diz. Ele não acredita que as mudanças no sistema eleitoral reduzirão a corrupção: "A motivação não é eleitoral; é econômica". Para ele, "a estrutura político-eleitoral brasileira sobre-representa o poder econômico e sub-representa as classes populares. Candidatos que não obtêm financiamento acima de determinado valor não são eleitos".
Na opinião de Abramo, "reforma institucional agora é coisa da oligarquia para tirar direitos que custaram muito esforço para ser conquistados", diz.
O cientista político Wanderley Guilherme dos Santos diz que o financiamento de campanha on-line e o limite às medidas provisórias e pedidos de urgência, que trancam a pauta, não requerem plebiscitos ou assembléias.
De acordo com Santos, para compreender a atual crise, é preciso entender as causas que condicionaram o sistema partidário e eleitoral brasileiro. "Não justifica, mas deve ser levado em conta". Segundo Santos, corrupção também têm acontecido em "países com elevados índices de desempenho ético". "Passamos de um eleitorado de 11 milhões de eleitores, em 1960, para 120 milhões. Não há exemplo na história das democracias ocidentais de um processo tão acelerado de incorporação de indivíduos à margem da vida política. É a transformação de um mercado político de voto que era oligarquizado", diz.
Para ele, a mudança criou um mercado político-eleitoral, que disputa de forma "selvagem" o eleitorado. A briga por eleitores, segundo ele, estimula propostas impossíveis, já que o eleito depende da aprovação do executivo e da alocação de recursos para agir.
"Daí vêm as críticas ao sistema representativo, demandas de democracia participativa." Para o cientista, o Brasil é uma "pré-república" porque a Constituição "não vale no norte". "O Estado não tem condições de garantir o exercício de direitos fundamentais, como o de organização, opinião e participação."

Sistema viciado
O advogado Adilson Abreu Dallari entende que "há muita coisa que é preciso mudar, mas quem pode mudar não tem interesse". "No sistema eleitoral e partidário continuamos a ter os mesmos problemas da ditadura", só que "agora, as regras são amoldadas para favorecer a maioria de quem já está no governo", diz.
Ele critica o fato de haver 28 partidos e de que 141 deputados mudaram de partido 220 vezes. Para Dallari, o sistema eleitoral "viciado" tem origem na Constituinte de 88, que "não construiu um sistema normativo constitucional adequado para os grandes problemas nacionais". Ele defendeu o voto facultativo e a convocação de nova Assembléia Constituinte.
As duas teses foram contestadas. "O voto facultativo propicia a compra da participação do eleitor", disse Abramo, citando a experiência de outros países. "Sou absolutamente contra uma Constituinte agora", disse Rubens Approbato Machado. Para ele, é um equívoco responsabilizar os eleitores: "Nossos eleitores votaram certo em candidatos que depois se mostraram errados" e citou Jânio Quadros, Fernando Collor e Lula.
Approbato prega maior participação da sociedade por meio de ONGs. Para ele, é essencial reduzir o número de partidos por cláusulas de barreira e defende instrumentos, como fidelidade partidária ou sanções para desestimular partidos "barrigas de aluguel".


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