São Paulo, domingo, 3 de janeiro de 1999

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JANIO DE FREITAS
Quem conta uma conta

Mantido em sigilo pela Polícia Federal e, em tudo o que é importante, pelo próprio depoente, o imenso depoimento do pastor Caio Fábio sobre o "dossiê Cayman" e outras contas em paraísos fiscais sugere, na verdade, um caso muito além daquele que deu em escândalo.
Além dos nomes já citados aqui, como detentores de contas mencionados em conversas com Caio Fábio, o depoimento deu indicações precisas sobre fatos referidos por intermediários e corretores, nos Estados Unidos, de depósitos de brasileiros no exterior.
Uma das conversas narradas por Caio Fábio deu-se em torno de depósito de US$ 50 milhões. Feito em determinada conta "secreta" na época da confusa privatização das telefônicas.
Por coincidência, claro. Tanto que o governo nem se interessa por investigações em torno dos indícios e dados presentes no depoimento de Caio Fábio -mais sigiloso, aliás, do que certas contas.
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Sem defesa
O quiproquó em torno do Ministério da Defesa advém de dois hábitos introduzidos na Presidência por Fernando Henrique Cardoso e praticados, dia-a-dia, também por Clóvis Carvalho, o hooligan do Gabinete Civil. São eles o descumprimento de acordos e compromissos e, como complemento, o trato inábil, desprovido de tato político e de simples educação, de questões que envolvem aspectos pessoais de terceiros, como amor próprio, imagem pública, princípios, que a Presidência atropela sem cerimônia.
A criação do Ministério da Defesa estava estudada e aprovada pelo Estado-Maior das Forças Armadas. Mas não para que Fernando Henrique a usasse politicamente. Também não para que, enfiando as mãos pelos pés, pretendesse que os atuais ministros militares aceitassem ser rebaixados dos seus cargos para tornar-se apenas secretários, enquanto a Presidência arranja um jeito de tornar constitucional o novo ministério.
Todo o essencial para a criação do Ministério da Defesa estava acertado, e disso Fernando Henrique esteve informado, como parte dos acertos. Mas não resistiu aos hábitos introduzidos na Presidência.
²
Contraste
As passagens de ano tornaram- se mais marcadas do que o calendário sugere.
Nesta, tudo o que o presidente tem a oferecer aos que viveram e aos que vivem do trabalho são mais descontos no que lhes fica ao fim do mês, reduções salariais em troca de continuidade do emprego, mais desemprego.
É natural, nesse clima, que não fosse lembrado o cinquentenário do repouso semanal remunerado para todos os que trabalham. Foi assinado por Dutra na passagem de 48 para 49.
Era um tempo de conquista de direitos e de reconhecimentos humanos. É um tempo de usurpação de direitos e desprezo do poder por tudo o que não seja poder econômico.



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