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JANIO DE FREITAS
Cenas brasileiras
A reviravolta eleitoral
criada pelo "quase golpe" do
Tribunal Superior Eleitoral,
conduzido pelo ministro Nelson
Jobim com a maestria de quem
deixa as impressões digitais onde menos conviriam, tem efeitos
muito mais complicados e vai se
desdobrar em mais perturbações do que se considerou até
agora.
As interpretações iniciais concentraram-se nos efeitos prováveis, para os já lançados candidatos à Presidência, da proibição de que os partidos façam,
nos Estados, alianças diferentes
das que tenham para a sucessão
presidencial. Mas esta determinação do TSE produz efeitos em
dois níveis com características
completamente diferentes.
O primeiro é aquele mesmo, o
da sucessão presidencial, vendo-se já, por exemplo, que um candidato como Anthony Garotinho, à frente de José Serra nas
pesquisas e com impulso para
progredir, foi posto sob a ameaça de ter cassadas as suas possibilidades. Só permanecerá na
disputa se obtiver a difícil coligação em âmbito nacional. Já o
PMDB e o PTB passaram a valer ouro, para quem os quer como coligados, e sabe-se quanto e
como as cúpulas desses dois partidos apreciam estar valorizadas.
No outro nível de efeitos da
mudança de regras, estabeleceu-se uma balbúrdia inestimável. Se houvesse terremoto político, seria assim. Todos os encaminhamentos para as disputas
de sucessão estadual estão invalidados. Parlamentares que trabalham há anos na montagem
de articulações partidárias, para embasar suas candidaturas
ao governo estadual, perderam
o trabalho e, na maioria, o direito de manter a candidatura.
Como a eleição de governador é
o pólo gerador da política estadual, talvez se venha a constatar, em futuro não muito distante, que a política nacional foi
muito mais subvertida pelo TSE
por seus efeitos nos Estados todos do que na sucessão presidencial.
O velho MDB, um momento
de dignidade na política nacional, sofreu muito esse tipo de arbitrariedade que utiliza o poder
para modificar a disputa eleitoral, mas, hoje, são ex-emedebistas os autores do mesmo arbítrio e os seus defensores.
A tentativa de sondar tendências, mesmo que apenas em relação às regras eleitorais que
prevalecerão, por ora só conduz
a fracasso. Os parlamentares
prejudicados em seus projetos
eleitorais ainda precisam demonstrar se têm, ou não, a força
necessária para obter dos respectivos partidos alguma atitude legislativa ou judicial. Nos
tribunais, inclusive no TSE mesmo, também não se encontra
resposta final nem sobre o alcance da nova regra, que precisará passar por novas decisões
-cujas cartas dificilmente estariam mais intactas que as da decisão precedente.
E convenhamos que a semana
do "quase golpe" teve um fecho
à sua altura, com a invasão da
Polícia Federal a um escritório
do marido da candidata-governadora Roseana Sarney, Jorge
Murad. Pelas informações iniciais, se a PF deixou por lá a toalha do banheiro e o papel higiênico, terá sido muito. O exame
dos computadores e documentos apreendidos, para verificar a
suspeita de envolvimento de
Murad com desvios na Sudam
(caso de Jader Barbalho), não é
tarefa rápida, o que acrescenta
mais uma incógnita de longa
duração à disputa pela Presidência.
Desde o governo Sarney, Jorge
Murad tem imagem onerada
por comentários negativos. É
nele que está a principal reserva
perceptível em parte do empresariado, principalmente de São
Paulo, à candidatura de Roseana Sarney. Se confirmada a suspeita que acionou a PF, a candidatura de Roseana estará liquidada e o PFL, tal como a governadora fez com Murad, casa-se
outra vez com o PSDB de José
Serra, depois de breve divórcio.
Se as suspeitas não se confirmarem, a investigação será publicamente vista como jogo eleitoral sujo e a idéia de perseguição
ganha o status de poderoso
marketing.
Esqueçamos aquelas pesquisas, esqueçamos as candidaturas já postas, tudo volta ao início. E esqueçamos, para suportar, que o país em que até a sucessão presidencial exibe cenas
tão deprimentes é o nosso, mesmo.
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