São Paulo, sexta, 3 de abril de 1998

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CELSO PINTO
Uma proposta para o câmbio

Como mudar a política cambial sem recorrer a uma máxi, sem criar sobressaltos, mas, ao mesmo tempo, garantindo um ganho de competitividade?
Dois economistas, Fábio Giambiagi, do BNDES, e José Carlos dos Reis Carvalho, do Banco Pactual, oferecem uma sugestão, como acadêmicos, para tentar conciliar esses objetivos, num artigo para a revista "Conjuntura Econômica", que circula nos próximos dias. É, na definição de ambos, uma tentativa de "continuidade com mudança", ou de "mudança sem descontinuidade".
Soa complicado, mas o centro da idéia é simples. O sistema cambial atual opera por pequenas mudanças em minibandas cambiais que se movem dentro de uma banda maior (alterada de 12 a 18 meses). A sugestão é que essas minibandas comecem a se alargar, ao longo de quatro anos.
Nesse período, a desvalorização cambial continuaria a correr acima da inflação interna -ou seja, o câmbio continuaria a ser desvalorizado em termos reais, para recuperar competitividade. De todo modo, como a inflação interna continuaria a cair, o valor dos reajustes cambiais também iria declinando.
No final de 2002 ou início de 2003, quando o câmbio real já tivesse recuperado um nível mais competitivo, e a inflação interna estivesse correndo a um nível compatível com a inflação internacional, já não seria necessário continuar desvalorizando o câmbio. Haveria, então, duas alternativas para o governo.
Uma seria manter o câmbio fixo ou quase fixo (dentro, por exemplo, de uma banda mínima). Teria o inconveniente da rigidez. É bom lembrar que a reputação de câmbios fixos ou rigidamente controlados foi fortemente abalada pela crise da Ásia.
Os dois propõem uma outra alternativa, a de transformar o sistema cambial numa banda larga de flutuação. Para não haver saltos em relação ao sistema atual, a cotação do real frente ao dólar, no momento da mudança, serviria como o ponto central da nova banda larga. A partir desse ponto, a cotação poderia oscilar até 2,5% para cima ou 2,5% para baixo. Um ano depois de implantado o sistema de banda larga, o governo poderia considerar a hipótese de permitir que a margem de flutuação dobrasse para até 5% acima ou 5% abaixo do ponto central.
Na prática, portanto, o sistema iria mudando gradualmente a partir do próximo ano. O governo não precisaria anunciar toda a estratégia, diz Carvalho, até para preservar uma margem de manobra.
Em 99, a desvalorização seria ainda de 7,5%, bem acima da inflação. A primeira mudança seria espaçar mais os minireajustes. Hoje, são feitos mais ou menos seis minireajustes mensais. Os ajustes passariam a ser apenas três e caminhariam para ser apenas um por mês. Cada reajuste, portanto, seria um pouco maior do que é hoje. Em três anos, a média de cada ajuste subiria de 0,12% para 0,33%. A lógica seria fazer com que esses ajustes um pouco maiores correspondessem a alterações de minibandas também maiores.
Para evitar que o mercado especulasse a cada véspera de reajuste, o artigo sugere o uso de juros punitivos, conforme o comportamento do mercado dentro das minibandas.
Para permitir uma queda nos juros, diz Carvalho, é preciso mexer com a expectativa de desvalorização futura, mas também reduzir o risco de volatilidade. Só diminuir a desvalorização não adianta, porque o mercado sabe que a conta externa só é sustentável com um crescimento baixo. Coordenar um ganho real do câmbio com regras claras para o sistema futuro permitiria uma transição suave. Com menos expectativa de desvalorização futura, argumenta Carvalho, os juros poderiam ser menores.
De outro lado, contudo, ambos listam várias razões para não se fazer uma desvalorização abrupta, tipo máxi: 1) a pressão inflacionária, 2) a insegurança sobre novos reajustes, 3) poderia ser insuficiente para resolver os problemas das contas externas, 4) o governo perderia sua reputação, 5) haveria impactos econômicos negativos, 6) não há exemplos de mudanças bruscas bem sucedidas em países emergentes.
Independentemente dos méritos da proposta, ela chega numa hora oportuna. Por menos que o governo deseje, o assunto que mais eletriza o mercado, hoje, é discutir o futuro da política cambial.




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