|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TOMA LÁ, DÁ CÁ
Deputado pede à Petrobras que compre álcool da empresa do presidente da CNI, acusada de usar trabalho escravo
Severino faz lobby a favor de usina de amigo
ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO
O presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), contatou
diretamente empresários do setor
de combustíveis para tentar favorecer a usina de álcool da família
do deputado federal Armando
Queiroz (PTB-PE), incluída na
lista dos empregadores que se utilizam do trabalho escravo do Ministério do Trabalho.
Anteontem à noite, Severino telefonou para a Petrobras e para o
Sindicom (Sindicato Nacional das
Empresas Distribuidoras de
Combustíveis e Lubrificantes)
perguntando se as distribuidoras
poderiam voltar a comprar álcool
da destilaria.
Há duas semanas, as distribuidoras de combustível pararam de
encomendar álcool da destilaria
Gameleira, em razão do acordo
firmado com o Instituto Ethos,
em 19 de maio, para combate ao
trabalho escravo no país.
Cerca de 80 empresas e entidades, segundo o presidente do
Ethos, Oded Grajew, já aderiram
ao pacto de não comprar produtos de fazendas e empresas que estejam na chamada "lista suja" do
Ministério do Trabalho. A Petrobras foi uma das empresas que
encabeçaram o movimento.
Procurado pela Folha, Severino
Cavalcanti confirmou os telefonemas. Por meio de sua assessoria,
disse que fez as ligações a pedido
de um deputado conterrâneo.
"Ele ligou realmente. Um deputado, que ele não vai dizer quem é,
queria saber por que a Petrobras
tinha parado de comprar álcool
da destilaria", disse a assessoria
da presidência da Câmara.
Segundo o chefe da assessoria
de imprensa, Antônio Beluco
Marra, Cavalcanti é "radicalmente contra o trabalho escravo" e a
iniciativa teria sido apenas um favor feito a um amigo.
O deputado seria Armando
Queiroz, presidente da CNI (Confederação Nacional da Indústria).
A assessoria da CNI disse que a
usina é de um irmão de Queiroz e
sugeriu que a reportagem ligasse
para o superintendente da destilaria, Eduardo Queiroz, em Pernambuco, que não atendeu aos
telefonemas da Folha.
Segundo o Ministério do Trabalho, a destilaria Gameleira possui
um longo histórico de infrações,
tendo sido autuada três vezes por
manter trabalhadores em condição análoga à de escravos.
A empresa foi incluída na lista
de empregadores que fazem uso
de trabalho escravo em novembro do ano passado, o que a impede de obter empréstimos em instituições de crédito públicas.
Liminar
No dia 11 do mês passado, o juiz
da 7ª Vara do Trabalho de Brasília, Oswaldo Neme Júnior, concedeu liminar à empresa para ser
excluída da lista do Ministério do
Trabalho, até o julgamento do
mérito da ação judicial, em que
ela contesta a punição aplicada
pelo governo.
Segundo a Folha apurou, Severino Cavalcanti telefonou para as
distribuidoras para saber se o embargo contra a destilaria poderia
ser retirado em razão da liminar
judicial. As empresas argumentaram que só tomariam tal decisão
autorizadas pelo Ministério do
Trabalho.
A iniciativa do presidente da
Câmara repercutiu mal. Os empresários se sentiram constrangidos com Severino fazendo lobby
explícito para uma empresa que
havia sido punida sob acusação
de envolvimento com trabalho
escravo.
De acordo com o Ministério do
Trabalho, 272 trabalhadores foram libertados da destilaria Gameleira, na zona rural de Confresa (MT) por estarem em condição
análoga à de escravos, em setembro de 2003.
Foi a terceira autuação por esse
motivo. Em março de 97, foram
retirados 45 trabalhadores e janeiro de 2001, foram 76 retirados nas
mesmas condições.
Texto Anterior: Jefferson diz passar por "processo de moer gente" Próximo Texto: Questão agrária: CPI aponta irregularidade em operação de R$ 2,1 mi do MST Índice
|