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Partido de Blair quer atrair PT para Terceira Via
DO COLUNISTA DA FOLHA
No congresso que realizará a
partir de 30 de setembro, o Partido Trabalhista britânico receberia
de braços abertos Luiz Inácio Lula
da Silva, o líder do PT, partido que
faz parte da "grande família da esquerda moderna".
Palavra de Denis MacShane, deputado trabalhista e subsecretário
de Estado que, entre outras áreas,
responde pela América Latina no
Foreign Office, o Ministério britânico de Relações Exteriores.
MacShane fez parte da comitiva
do primeiro-ministro Tony Blair
na visita ao Brasil e à Argentina.
Foi durante a visita que Lula classificou de "blefe" a defesa da abertura comercial européia feita por
Blair na presença do presidente
Fernando Henrique Cardoso.
MacShane conheceu Lula ainda
líder sindical, quando as greves
no ABC paulista tinham apoio do
movimento sindical internacional, de que o britânico participou.
MacShane não diz com todas as
letras, mas insinua que Lula (ou
algum representante do PT) se
beneficiaria com a troca de idéias
e experiências que ocorre nos
congressos do gênero, embora faça questão de dizer que a chamada Terceira Via, marca registrada
de Tony Blair, "não é a única via".
Blair, ao tomar a liderança trabalhista na antevéspera da eleição
de 1997, cunhou a expressão Terceira Via para designar a busca de
um modelo que fugisse tanto do
liberalismo puro e duro como das
antigas tendências estatizantes da
social-democracia convencional.
É aos envolvidos nessa busca
que Blair e seus seguidores rotulam de "esquerda moderna".
Se tem braços abertos para o PT
em seu congresso, o trabalhismo
britânico não esconde que continua casado, e bem, com FHC.
MacShane conta que Blair ficou literalmente encantado ao saber
que alguém da "qualidade intelectual" de FHC chegou, por outros
caminhos, às mesmas conclusões
que ele sobre a necessidade de reformar a social-democracia.
Esse encantamento se traduziu
concretamente no fato de FHC ter
sido um dos primeiros governantes convidados para as cúpulas da
Terceira Via, primeiro em Florença (Itália) e, mais recentemente,
em Berlim. A terceira será em setembro, em Estocolmo (Suécia).
Nos encontros em Brasília, São
José dos Campos e Foz do Iguaçu,
entre Blair e FHC, o encantamento só aumentou. Entre outros motivos, porque Blair põe a maior
ênfase de sua gestão na educação.
MacShane relata que, ao assumir, Blair encontrou 7 milhões de
britânicos que, embora tivessem
passado pela escola, eram incapazes de ler as instruções de uma
bula de remédio ou de calcular
quanto receberiam de troco se pagassem uma compra de 0,86 pence (centavos) com uma moeda de
1 libra. O governo conservador
que o antecedeu não se preocupava com o problema, por entender
que a solução estava no ensino
privado -claro que ao alcance
apenas de quem pudesse pagar.
Blair, ao contrário, apostou na
comunidade de produtores de
educação (rótulo sofisticado, típico da linguagem "blairista", para
professores e diretores de escolas). Passou a cobrar desempenho
deles, medido em testes aplicados
às crianças. Revoltou os professores, mas agradou aos pais.
MacShane atribui em grande
medida ao esforço na educação o
fato de Blair ter sido reeleito (neste ano), rompendo uma tradição
que impunha aos trabalhistas o
exercício de apenas um mandato.
O governo FHC também introduziu os testes educacionais,
igualmente para revolta dos professores (e de parte do alunado).
O tema educação terá espaço
importante na agenda da terceira
cúpula da Terceira Via, agora rebatizada para "Governança Progressista", porque os socialistas
franceses, também participantes,
vetaram o rótulo criado por Blair.
O esforço educacional tem a ver
também com os conceitos de social-democracia com que lida o
novo trabalhismo britânico.
"A classe trabalhadora, quando
não trabalha, deixa de ser uma
classe", diz MacShane, no que parece um jogo de palavras, mas faz
algum sentido. Sem emprego, o
trabalhador começa a deixar de
pertencer a um coletivo para criar
uma cultura de dependência, no
caso em relação ao subsídio estatal para o desempregado.
"Não acredito que a social-democracia possa coexistir com desemprego em massa", diz o deputado. É um conceito que pode valer para a Europa, área em que a
social-democracia tem ou teve
base social na classe trabalhadora.
Já a social-democracia brasileira, versão tucana, nutre-se muito
mais da intelectualidade e, agora,
de novos setores empresariais do
que dos trabalhadores.
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