São Paulo, Domingo, 03 de Outubro de 1999
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Privatizações agravam impacto


MARTA SALOMON
da Sucursal de Brasília

A privatização dos serviços de energia e telecomunicações -um dos principais negócios do primeiro governo Fernando Henrique Cardoso, com forte participação de investidores estrangeiros- deverá complicar o fechamento das contas externas.
O efeito colateral das privatizações brasileiras aparece em previsões de economistas confirmadas pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), segundo as quais os investidores estrangeiros que assumiram parcialmente o controle dessas empresas tendem a aumentar o volume de remessas de lucros e dividendos ao exterior.
O efeito colateral nas contas externas é complicado pelo fato de os serviços públicos privatizados não colaborarem em nada para elevar as exportações brasileiras.
"Por não gerarem exportações, os investimentos estrangeiros nas privatizações tendem a provocar um desequilíbrio potencial no balanço de pagamentos, se não forem compensados com o aumento das vendas externas ou queda nas importações", diz Antônio Lacerda, vice-presidente da Sobeet (Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica). "Os investimentos demandarão remessas de lucros e dividendos", completa Lacerda.
Neste ano, sem contar com o pagamento de juros de US$ 16 bilhões, essas remessas deverão somar US$ 5 bilhões, estima a Sobeet. Não há expectativa dessa conta diminuir, diante do estoque de investimentos estrangeiros no país. "A tendência é uma remessa de US$ 6 bilhões a US$ 7 bilhões por ano", avalia Lacerda.
Há ainda o risco de a remessa de lucros aumentar quando os investimentos internos exigidos dos investidores que assumiram o controle das empresas de energia e telefonia começarem a diminuir, o que é previsto para ocorrer dentro de quatro ou cinco anos.
A expectativa do governo é que o Brasil continue atraindo os investidores estrangeiros e que eles reinvistam aqui os lucros que obtidos nos negócios privatizados.
O governo também sustenta que não havia muitas alternativas para atrair os dólares necessários ao país no modelo de combate à inflação e que os investimentos diretos (na privatização, na aquisição ou na fusão de empresas) ainda é preferível aos investimentos no mercado financeiro.
O BNDES não fez nenhum estudo prévio sobre os efeitos colaterais da participação crescente do investidor estrangeiro na privatização. Esses investimentos foram deliberadamente estimulados, principalmente depois de 1996.
Levantamento do BNDES disponível na Internet estima em 43,5% a participação estrangeira na venda de estatais, calculada em US$ 30,9 bilhões. O percentual considera as privatizações desde 1991 e inclui empresas estaduais.
Os investimentos estrangeiros em privatização bateram o recorde em 1998. Foram maioria na privatização das empresas de telefonia, representando 59,3% do negócio. Espanhóis (18,7%), portugueses (15,7%) e norte-americanos (13,7%) detêm a maior parcela nos US$ 16 bilhões investidos por estrangeiros no setor.
Nas privatizações estaduais, que incluem empresas de energia elétrica, os investimentos estrangeiros também tiveram participação importante, estimada em 47,5%.
No total, os EUA aparecem liderando o ranking dos investidores estrangeiros em privatização, seguidos pela Espanha, por Portugal, pela Itália e pelo Chile.


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