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São Paulo, sexta-feira, 03 de outubro de 2003

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TRUCO NA REFORMA

Projeto é 'fatiado'; interesse de Estados e União é priorizado

Governo atropela Câmara e recria tributária no Senado

Lula Marques/Folha Imagem
Arthur Virgílio, Romero Jucá, Jefferson Péres, Agripino Maia, Renan Calheiros, Edison Lobão e Aloizio Mercadante apresentam proposta


GUSTAVO PATÚ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Com apoio do Planalto, o Senado organizou ontem um ato político -do qual participaram todos os partidos da Casa, inclusive os de oposição- para anunciar um acordo destinado a reformular a reforma tributária aprovada pela Câmara. Na prática, foi explicitada a intenção de "fatiar" o projeto, aprovando neste ano só as medidas de interesse imediato do governo e dos Estados.
Lado a lado, os líderes partidários divulgaram, na Comissão de Constituição e Justiça, um documento intitulado "Reforma Tributária: uma Nova Proposta", que, de forma genérica, apresenta algumas propostas de alteração ao projeto, basicamente com o objetivo de rearranjar a repartição de receitas entre União, Estados e municípios.
Mas o próprio documento escancara o destino mais provável da reforma: aprovar neste ano apenas a prorrogação da CPMF e da DRU (Desvinculação de Receitas da União, que permite o uso livre de 20% das receitas federais), fundamentais para o ajuste fiscal do governo, e do fundo destinado a cobrir as perdas estaduais e municipais com o fim do ICMS sobre as exportações.
"Pretende-se aprovar o conjunto da proposta assegurando a DRU, a extensão da CPMF e o fundo de compensação dos Estados e dos municípios pela desoneração das exportações, nos moldes já acordados", diz o 12º dos 15 parágrafos do texto.

"Moldes acordados"
Essas três medidas devem ser aprovadas sem alterações em relação ao projeto que veio da Câmara, "nos moldes já acordados", o que permitiria sua promulgação imediata. Temas mais polêmicos, que serão alterados pelo Senado, terão de voltar à Câmara -e sua análise fica, muito provavelmente, para 2004, quando as eleições municipais ocuparão as atenções dos congressistas.
Apesar da clareza do documento, os senadores trataram o assunto com evasivas, evitando o termo "fatiamento". "Não há compromisso de aprovar a CPMF e a DRU", disse o líder pefelista José Agripino (RN), um dos signatários do texto que diz o contrário.
Romero Jucá (PMDB-RR), finalmente confirmado como relator da reforma na CCJ, foi um pouco mais claro: "Vamos promulgar o que for possível agora, e o que não for possível volta para a Câmara. Isso não é fatiar".

Reforma "estruturante"
A palavra preferida de todos para qualificar a nova proposta de reforma foi "estruturante". O termo, um tanto vago, foi insistentemente repetido por Jucá, pelo líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), pelo ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda) e até pelo líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM), que até anteontem era um dos maiores críticos do projeto.
Como "estruturantes" foram definidas as inovações básicas sugeridas ontem, a maior parte delas oriunda, na verdade, de negociações prévias entre o Planalto e os governadores:
1) sai do projeto a cobrança do ICMS no destino das mercadorias, em vez de na origem, em um prazo de 11 anos. Da mesma forma, cai o prazo de 11 anos para o fim dos atuais benefícios fiscais estaduais. Os temas ficam para lei complementar;
2) em vez do Fundo de Desenvolvimento Regional, que pelo texto atual da reforma aplicaria 2% da receita do IPI e do Imposto de Renda em financiamentos nas zonas pobres, os Estados do Norte, do Nordeste e do Centro-Oeste receberão diretamente uma parcela dos recursos do Orçamento da União. O BNDES também destinará uma parcela maior de seus recursos a essas regiões;
3) acaba o repasse de 25% dos recursos da Cide aos Estados e municípios. A receita da contribuição, cobrada sobre a venda de combustíveis, será administrada por um conselho formado por União, Estados e municípios;
4) haverá uma separação entre os produtos tributados pelo IPI, federal, e o ICMS, estadual. Ou seja, um mesmo produto não poderá ser tributado pelos dois impostos. A proposta, não detalhada, foi a principal inovação apresentada pelo Senado. Pelos estudos, o IPI incidiria sobre três ou quatro produtos (fumo, cigarro, bebidas e combustíveis, por exemplo).
Foi introduzido ainda um compromisso de reduzir no futuro a carga tributária, na medida em que caia a proporção da dívida pública em relação ao PIB (Produto Interno Bruto) -essa relação, porém, está em alta constante desde 1995.

Idéias "inovadoras"
As idéias, discutidas em duas reuniões de líderes, uma de manhã e outra à tarde, foram apresentadas como "inovadoras e criativas" por Mercadante.
Falando sobre a nova proposta após almoço com a bancada do PMDB no Senado, o ministro José Dirceu (Casa Civil) resumiu: "Ela vai procurar compatibilizar os fundos com os interesses regionais, mas não muda na essência a reforma".


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