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JANIO DE FREITAS
Os espiões sem máscaras
O SNI recriado no atual governo sob o codinome de
Abin está desmascarado mais do
que pela comprovação de restituir poder e meios de ação a criminosos da tortura e de outros
crimes da ditadura -criminosos ideológicos e quase sempre
vocacionais. Está desmascarado,
e isso é o mais importante, na
sua natureza de instituição inimiga dos esforços por um regime
democrático, protetora da corrupção e dos chamados crimes
do colarinho branco.
A Abin/SNI é a maior ameaça
ao regime constitucional desde o
fim da ditadura. Seu principal
chefe e ministro da (In)Segurança Institucional, general Alberto
Cardoso, até poucos dias assegurava que o pessoal da Abin/SNI
fora selecionado com o máximo
de rigor, tendo em vista a finalidade de trabalhos de interesse do
Estado brasileiro democrático, e
não da conveniência do governo.
Está desmentido pelo seu pessoal.
A identificação, nos quadros
rigorosamente selecionados da
Abin/SNI, de um militar torturador e integrante do SNI levou o
general Cardoso a admitir agora, na na Comissão do Senado
para (pretensa) Fiscalização e
(imaginário) Controle da Abin,
que são 226 os egressos do SNI
incorporados pela Abin. Como
negava, então, a existência de
qualquer relação entre os dois
serviços? E como a Presidência e
o general quereriam compor um
serviço de interesse do Estado
democrático usando os especialistas em antidemocracia e em
proteção de ditadura? Tão
amantes do Estado democrático
e da seleção criteriosa, não lhes
ocorreu a dispensa dos espiões e
outros criminosos da ditadura?
Antes que seja desmentido
também em outro ponto, o general Cardoso deve recontar o número dos que repõem o passado
no presente. Nos seus quadros há
até co-artífices de golpe eleitoral.
No caso, o golpe com que o SNI,
valendo-se inclusive do então
departamento de jornalismo da
Globo, subverteu a apuração
eleitoral para entregar o governo
fluminense a seu aliado Moreira
Franco. O qual, não por acaso,
está no Planalto como coordenador político de Fernando Henrique.
A natureza antidemocrática e
defensora da corrupção mostra-se, na Abin/SNI, já pelos primeiros nomes divulgados das vítimas de sua espionagem. O governador que faz oposição aberta ao governo de Fernando Henrique- Itamar Franco; ao procurador da República que tem
simbolizado, para os governistas, a ameaça de investigações
desmoralizadoras- Luiz Francisco de Souza; um dos jornalistas que escreveram sobre envolvimento do governo com o juiz
Nicolau dos Santos Neto- Andrei Meirelles.
O general Cardoso nega que a
Abin/SNI tenha determinado
tais investigações, mas não que
houvesse as investigações. Também já negou em vão. E, antes
que se exponha mais, seria da
sua conveniência saber que pelo
menos outro governador, Olívio
Dutra, está ou esteve sob espionagem. E que outros procuradores têm sido espionados. E que
há mais jornalistas vasculhados
por espionagem e mesmo postos
sob tentativas de intimidação
por gente do SNI/Abin.
Todos esses têm em comum a
condição de malvistos pela Presidência. Em suas diferentes atividades, identificam-se pela defesa de investigação das evidências de corrupção administrativa, familiar e a pretexto eleitoral. A espionagem e o que mais
lhes dedique o SNI/Abin têm,
pois, propósitos óbvios.
É desprovida de interesse a
afirmação, reiterada pelo general Cardoso, de que não houve
ordem para tal ou qual espionagem violadora do que a Constituição preceitua. Se houve, não
precisaria ser escrita. Se foi, não
precisaria estar guardada. Se está, não é alcançável por quem
não desça a ser do SNI/Abin. O
que interessa é que há a espionagem criminosa.
Ainda menos desprovida de
valor é afirmação de Fernando
Henrique Cardoso e do general
Alberto Cardoso, no sentido de
que não admitem o tipo de ação
da Abin já denunciada e que esse serviço escapou ao controle.
Nem esta coluna é dada à futurologia nem é dada a vangloriar-se. Mas é impossível omitir
que aqui ficou registrado, desde
antes de ser criado o SNI/Abin, o
que adviria dessa submissão de
Fernando Henrique Cardoso à
pressão de certos setores dominados, ainda, pela mentalidade
que lhes foi incutida pelo Pentágono da Guerra Fria.
Os fatos que estão desmascarando o SNI/Abin eram previsíveis e o foram. Só não os anteviu
quem não quis, por interesse
ideológico, uns, e por interesses
inconfessáveis, outros. Uns e outros não menos desmascarados,
agora, do que o SNI/Abin.
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