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CONTAS DA REELEIÇÃO
Arquivo protegido por uma senha sugere que atual ministro deveria coletar R$ 6,020 milhões
Nova planilha mostra ação de Matarazzo
ANDRÉA MICHAEL
WLADIMIR GRAMACHO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Uma nova planilha eletrônica
do comitê financeiro da campanha do presidente Fernando Henrique Cardoso, em 1998, revela a
ação do ministro Andrea Matarazzo (Secretaria de Comunicação de Governo) junto a grandes
empresas e dá as primeiras pistas
sobre a origem dos R$ 3 milhões
arrecadados por ele para o caixa-dois da reeleição.
Nas últimas três semanas, a Folha mostrou como pelo menos R$
10,120 milhões foram parar num
caixa-dois em 1998 e, no mínimo,
outros R$ 8 milhões também deixaram de ser declarados ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em
1994, o que é ilegal. O maior valor
registrado por esse expediente é
atribuído a Andrea Matarazzo.
O novo arquivo, batizado como
"#fh98b", estava protegido por senha e só na última semana, após
um mês de trabalho, foi possível
ter acesso aos seus dados. Os mais
reveladores estão na planilha
"MM", código utilizado pelo comitê financeiro para designar Andrea Matarazzo.
O título inscrito no alto do documento é inequívoco quanto a
quem se refere: "Andréa Matarazzo - MM". A inédita e secreta tabela eletrônica relaciona 17 empresas. Ao lado de cada uma delas, são mencionados nomes de
dirigentes a serem procurados e a
indicação das metas de arrecadação em cada companhia.
Meta de R$ 6,020 mi
A planilha trata de metas sugeridas a Matarazzo e não de recursos
efetivamente obtidos por ele para
a reeleição. O novo documento
informa que era esperada do futuro ministro a coleta de R$ 6,020
milhões em doações eleitorais.
Aparentemente, isso representa
o dobro do que ele conseguiu de
fato, segundo as planilhas com a
contabilidade da campanha obtidas até agora pelo jornal.
O registro eletrônico desse arquivo informa que seu autor,
mais uma vez, é o ex-ministro da
Administração e Reforma do Estado Luiz Carlos Bresser Pereira,
tesoureiro oficial das duas campanhas presidenciais de Fernando
Henrique Cardoso. A última alteração feita nesses dados ocorreu
em 8 de julho de 1998 -portanto,
quase três meses antes da eleição.
A data dessa última modificação na planilha "MM" é compatível com seu conteúdo. Há metas
que deveriam ter sido cumpridas
por Andrea Matarazzo, mas ainda
não há registro de doações obtidas pelo futuro ministro.
O dinheiro, como em toda eleição, ingressaria ao longo das semanas seguintes, durante a campanha presidencial.
Matarazzo nega ter participado
da arrecadação de recursos para a
campanha de FHC à Presidência
em 1998. "Vou te falar mais uma
vez meu papel nisso daí (campanha): fiz dois jantares, dos quais o
presidente participou. Ele apresentou o programa de governo. O
Luiz Carlos Bresser (Pereira) foi, e
ponto", afirmou Matarazzo.
"Eu coordenava a ação política
da coligação do presidente Fernando Henrique no Estado de São
Paulo. Ponto", declarou.
Organizador de jantares
De fato, Matarazzo foi um anfitrião de colaboradores. Entre os
jantares que promoveu, o mais
badalado aconteceu no dia 29 de
maio de 1998.
O presidente Fernando Henrique Cardoso falou para 21 empresários, entre os quais: Max Feffer,
da Companhia Suzano de Papel e
Celulose; José Ermírio de Moraes,
do grupo Votorantim; e Paulo
Cunha, do Ultra. Empresas de
Max Feffer e Paulo Cunha constam da planilha "MM".
O ministro sugeriu que o documento poderia ter sido elaborado
pelo comitê financeiro de FHC a
partir da lista de convidados para
os jantares. A hipótese foi abandonada por ele mesmo ao longo
da entrevista que concedeu à Folha na última semana.
Na entrevista, feita por telefone,
a reportagem do jornal leu, um a
um, os nomes dos empresários
que constam da planilha "MM".
Em vários casos, Matarazzo disse
que eles não estariam na sua lista
de convidados para participar de
um jantar com o candidato que
disputava a reeleição.
O documento mostra que as
metas mais ambiciosas impostas
a Andrea Matarazzo estavam ligadas a grandes construtoras:
1) Na Andrade Gutierrez, seu
contato era R.(oberto) Amaral e
sua meta, R$ 1 milhão;
2) Na Camargo Corrêa, deveria
procurar Luiz Nascimento ou Alcides Tápias (que depois também
viraria ministro, na pasta do Desenvolvimento) para obter mais
R$ 1 milhão;
3) Na CBPO/Cisop/Ameop, a
referência era Aluizio Araujo e a
doação pretendida, R$ 900 mil;
4) Na Odebrecht, o próprio
Emílio Odebrecht seria acionado
em busca de R$ 500 mil.
Dentre as empresas procuradas
por Matarazzo, segundo essa nova planilha, cinco tiveram doações registradas no TSE, cujas
contribuições somam R$ 1,554
milhão: Andrade Gutierrez (R$
500 mil), Schering-Plough (R$
400 mil), Brasmotor (R$ 280 mil),
Vicunha Nordeste (R$ 250 mil) e
Companhia Suzano de Papel e
Celulose (R$ 124 mil).
Na prestação de contas encaminhada à Justiça Eleitoral não há
menção às doações que o comitê
financeiro pretendia obter das demais empresas listadas.
Ao todo, 27 empresas são relacionadas. Para dez delas não são
indicadas as metas das contribuições que deveriam ser coletadas.
O empresário Emílio Odebrecht, herdeiro do grupo de mesmo nome, doou R$ 50 para a campanha em 28 de setembro de 1998.
Outros R$ 500 estão registrados
no Tribunal Superior Eleitoral,
em 20 de setembro daquele ano,
como colaboração de Hugo Miguel Etchenique. Na planilha, o
nome do empresário está associado ao grupo Brasmotor.
Doações
Apesar de não figurarem na planilha "MM" com metas associadas aos seus nomes, Siemens e
Bolsa de Mercadorias e Futuros
acabaram contribuindo. De acordo com dados do TSE, entraram
com pelo menos R$ 200 mil e R$
250 mil, respectivamente. Sobre
as doações que o comitê financeiro pretendia obter nas demais
empresas, não há menção na
prestação de contas ao TSE.
Há um mês, quando foi procurado pela Folha, o ministro já havia negado enfaticamente que tenha ajudado a coletar doações para a campanha de FHC. "Não pode ser. Não conheço a planilha. Eu
não fui arrecadador. Não me ponha como arrecadador. Fiz alguns
jantares com empresários. E só",
disse Matarazzo.
Apesar das negativas, reforçadas em entrevista realizada na última semana, alguns colegas de
campanha contradizem a versão
do ministro. "O Andrea também
foi (arrecadador), no começo",
disse Bresser.
"Havia uma certa competição,
talvez em função da vontade dele
de ir para Brasília", emendou o
publicitário Luiz Fernando Furquim, outro coletor de recursos
para a campanha.
A Folha tentou entrar em contato com o ex-ministro Luiz Carlos Bresser Pereira, por e-mail, para que ele comentasse a nova planilha, mas não recebeu resposta
até a conclusão desta edição.
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