São Paulo, sábado, 04 de janeiro de 2003

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DEFESA

Ministro confirma decisão de concentrar gastos nas áreas sociais, mas diz que Forças Armadas não serão desprestigiadas por Lula

Governo adia compra de caças para a FAB

WILSON SILVEIRA
FERNANDO RODRIGUES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Um dia depois de assumir o Ministério da Defesa, o ministro José Viegas Filho passou ontem pelo constrangimento de ter de anunciar uma decisão da sua área que já havia sido divulgada como uma possibilidade pelo Palácio do Planalto no dia anterior.
O governo Luiz Inácio Lula da Silva adiou para 2004 a decisão sobre a licitação internacional de cerca de US$ 700 milhões (R$ 2,4 bilhões) destinada à compra de 12 novos caças supersônicos para a FAB (Força Aérea Brasileira).
A possibilidade do adiamento foi antecipada por Lula por meio de seu porta-voz, André Singer, anteontem. Indagado se havia sido informado previamente, Viegas foi evasivo: "O presidente sinalizara nesse sentido, mas não havia me dito a data da decisão".
Indagado novamente sobre quando soube da decisão presidencial, voltou a não responder, devolvendo uma pergunta: "Esse anúncio foi feito ontem [anteontem" à noite, não é?".
Embora nenhum militar ouvido pela Folha tenha concordado em dar entrevista formal sobre as reações nos bastidores das Forças Armadas, o episódio foi dado como uma demonstração de que o Ministério da Defesa poderá continuar pouco prestigiado no governo Lula, assim como já ocorreu na administração de FHC.
Anteontem pela manhã, Viegas recebera o cargo de seu antecessor, Geraldo Quintão, e o programa de compra dos caças era dado como certo. Em seu discurso, Quintão chegou a dizer: "Deixo para Vossa Excelência, então em curso, o Programa de Reequipamento da Força Aérea, já entrando em sua segunda fase".
Apesar do constrangimento de não ter anunciado a decisão de suspender a licitação, Viegas se manteve fiel a Lula em suas declarações. Disse que o cancelamento "se deve fundamentalmente ao fato de que há uma necessidade mais premente de concentração de gastos nas áreas sociais, sobretudo no início do governo, que se caracteriza pelo combate à fome e pelos projetos sociais".
Viegas afirmou que a decisão foi "muito bem recebida" na Aeronáutica. "Estamos trabalhando com o governo e não contra o governo", declarou em uma de suas várias entrevistas ao longo do dia sobre o mesmo tema.
O novo comandante da Aeronáutica, Luiz Carlos Bueno, também deu declarações protocolares, sem demonstrar animosidade: "Não tem problema algum, a gente já havia até estudado isso".
À tarde, durante uma cerimônia no Comando da Marinha, Viegas comentou a hipótese de a FAB alugar caças enquanto não puder comprar aviões novos.
"Esse é um assunto que será estudado. Eu me basearei, para a decisão que deverá ser tomada, no relatório e nos depoimentos do brigadeiro Bueno a esse respeito", disse o ministro.
Como o comandante Bueno estava ao lado do ministro da Defesa, foi então indagado pela Folha sobre sua opinião a respeito da hipótese de alugar aviões. Em sua resposta, demonstrou-se surpreso com o que acabara de ouvir: "São as primeiras instruções que estamos recebendo do sr. ministro. Tão logo as instruções sejam trabalhadas nós poderemos avisar por intermédio do Ministério da Defesa as soluções que poderão ser administradas e seguidas".
Apesar do constrangimento, Viegas disse que o adiamento não significa que o projeto tenha sido abandonado ou arquivado nem que "as necessidades e as premências da Força Aérea Brasileira fiquem desatendidas". O ministro afirmou que Lula "tem dado e dará manifestações concretas no seu propósito de prestigiar e valorizar as Forças Armadas".
Sobre o fato de que o caças seriam comprados com recursos procedentes de empréstimo externo e não com dinheiro do Orçamento, Viegas afirmou que se trata de uma economia de gastos futuros. "O governo se caracteriza por uma atitude de planejamento plurianual. Por isso, nós evitamos que haja um comprometimento prematuro de dinheiro nessa questão e preservamos maior flexibilidade do governo."
Até 2002, a Aeronáutica planejava alugar caças israelenses Kfir para substituir os Mirage da Base Aérea de Anápolis, enquanto não se concluíam as negociações para a compra dos novos caças. Calcula-se que haja um intervalo de dois a três anos entre o anúncio do resultado da licitação e a efetivação da compra. Os Mirage deverão ser "aposentados" em 2005.
Segundo Viegas, se o governo optar por alugar caças, eles não serão necessariamente de Israel.
O comandante da Aeronáutica disse que os outros projetos em andamento na sua área estão integralmente mantidos. Citou a reforma de 54 caças F-5, que devem começar a ser entregues renovados pela Embraer no fim de 2004.
Segundo Bueno, os 18 caças Mirage em operação estão ultrapassados e perderam sua função primordial, que é a interceptação de qualquer aeronave agressora que invada o espaço aéreo de Brasília -o chamado "guarda-chuva".
Na licitação, que foi aberta em 1º de agosto de 2001 e agora suspensa, os candidatos são o francês Mirage 2000BR, o russo Sukhoi-35, o sueco Gripen, o americano F-16 C/D e o russo MiG-29.
O consórcio russo-brasileiro Rosoboronexport/Avibrás também oferece caças Sukhoi-27SK seminovos. A Embraer não se pronunciou sobre o assunto.


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