|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Em viagem ao Brasil, Bush espera neutralizar Chávez
Presidente americano e Lula se encontram no dia 9 e usam álcool como moeda de troca
A interlocutores, Bush diz
que considera venezuelano
mais perigoso que Fidel;
Lula quer respeito ao
Mercosul e destravar Doha
SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON
Quando anunciarem oficialmente o memorando bilateral
de biocombustíveis em São
Paulo nesta semana, os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva
e George W. Bush estarão divulgando apenas uma parte dos
objetivos reais do primeiro dos
dois encontros que terão num
intervalo de menos de um mês.
O álcool combustível, cuja
produção mundial é dominada
pelos dois países, é a estrela da
"agenda positiva" citada pelo
número três do Departamento
de Estado, Nicholas Burns, e
confirmada pelo chanceler brasileiro, Celso Amorim. Foi o
ponto encontrado por Brasil e
EUA para forjar uma nova
aliança. Mas será usado como
moeda de troca por ambos.
No caso americano, o principal interesse numa região relegada a segundo plano nos seis
primeiros anos de mandato do
republicano é neutralizar Hugo
Chávez. Com ele, a ressonância
cada vez maior na região que
encontra seu discurso antiamericano movido a atos populistas
bancados por petrodólares.
Apesar de Burns ter dito recentemente em Washington a
jornalistas brasileiros que os
EUA não ficam "acordados à
noite só pensando" em Chávez,
pessoas que estiveram recentemente com Bush dizem que ele
está obcecado com a ascensão
do venezuelano. Segundo esses
interlocutores, Bush acredita
que Chávez seja "mais perigoso" para a América Latina que
Fidel Castro, pois conquista
com dinheiro o que o cubano
conquistava com ideologia.
Na quinta, o congressista republicano Dan Burton, do subcomitê da Câmara para a América Latina, traduziu a preocupação da Casa Branca: "Chávez
usa a pobreza da região a seu favor ao usar vastas quantias do
petrodólar que está ganhando
para conduzir governos lá debaixo para a esquerda, e acho
que isso é ruim para os EUA e
para a região, no longo prazo".
Mercosul
Reservadamente, Bush pretende cobrar de Lula uma posição mais clara -e mais dura-
em relação ao venezuelano. Em
troca, acenará com uma espécie de moratória ao ataque que
o escritório de comércio exterior tem feito ao Mercosul ao
tentar firmar tratados de livre
comércio com países do grupo.
Reforçará ainda a idéia de
uma aliança Brasil-EUA contra
a União Européia como maneira de destravar a Rodada Doha,
ambos assuntos caros ao governo Lula. Vem daí o anúncio de
última hora de que Susan
Schwab, titular do escritório de
comércio exterior, acompanhará a comitiva presidencial.
Segundo diplomatas envolvidos na preparação do memorando, Lula baterá em público
na tecla do fim da tarifa de importação que os EUA cobram
ao álcool vindo do Brasil, atualmente de US$ 0,54 por galão
(R$ 0,30 por litro), mesmo sabendo que é causa perdida.
Causa perdida porque a derrubada é atribuição não de
Bush, mas do Congresso, hoje
nas mãos da oposição. "E, mesmo se a tarifa fosse derrubada",
diz um empresário do setor que
pede anonimato por estar entre
os que se encontrarão com a comitiva americana, "o Brasil não
teria como atender à demanda
do mercado dos EUA".
Outro ponto de barganha será o desejo brasileiro de ter assento entre os membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU.
Os EUA declaram apoio à entrada do Japão e evitavam se
posicionar em relação à América do Sul. Temiam alienar a Argentina ao apoiar o Brasil, e vice-versa.
Com o distanciamento do governo de Néstor Kirchner dos
EUA e sua aproximação de
Chávez, a Casa Branca pode indicar posição favorável ao Brasil. Não por acaso o giro de Bush
pela América Latina não tem
parada em Buenos Aires.
Não é por acaso, também,
que Kirchner e Chávez têm
reunião na capital argentina na
sexta, dia que Bush passará a
manhã e a tarde com Lula e o
começo da noite com o uruguaio Tabaré Vázquez.
Texto Anterior: Painel Próximo Texto: Brasil busca apoio dos EUA para fazer do álcool "commodity" Índice
|