|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
JANIO DE FREITAS
Gravações sem gravações
Os cuidados com que a imprensa tem tratado um certo
grampeamento de telefones evita-lhe o escândalo, mas, pelo mesmo
motivo, ressalta-lhe a importância. Não importância política, que
esta ficou reservada para os grampos telefônicas de que o senador
Antonio Carlos Magalhães é
apontado, por muitos, como mandante. A importância do caso
quase silenciado é institucional e
ética, diz respeito a questões com
alcances muito mais amplos e relevantes do que o embate entre
um político e seus adversários e
inimigos.
O Judiciário é dado como o setor
de maior corporativismo, dentre
todos que o sejam. Tal afirmação
faz por esquecer o corporativismo
dos militares, inigualável, mas a
omissão nunca a enfraqueceu.
Pois bem, o Superior Tribunal de
Justiça suspendeu de funções e
submete a processo administrativo um dos seus ministros, Vicente
Leal, com base em indícios captados por um grampo telefônico.
Três colegas de Leal -Sávio Figueiredo, Peçanha Martins e Ruy
Rosado- avaliaram a suspeita
comunicada pela Polícia Federal e
propuseram as providências que,
tudo indica, não têm precedente
em tribunal de tão alta instância.
O STJ poderia esperar pelo complemento das investigações policiais, no mesmo caso que levou Pinheiro Landim a renunciar a dois
mandatos, o anterior e o que acabara de assumir neste ano. Protelar foi a prática da Câmara, para
permitir que Landim, não sendo
cassado, continuasse elegível. Protelar foi, agora, outro presente do
corporativismo da Câmara a Landim.
Outro aspecto significativo é a
consideração dada pelo STJ ao
teor de um grampo telefônico cujo
objetivo não era o seu ministro,
nem habeas corpus, mas uma rede
de traficantes.
Mais uma vez, o múltiplo grampeamento de telefones na Bahia
está demonstrando que se usam os
mais variados pretextos para fugir
à investigação do que ficou gravado. Como se o não cumprimento
de uma formalidade legal -a autorização para o grampeamento- fosse passível de punição,
mas tivesse o poder extraordinário de isentar de investigações e
consequências os indícios de irregularidades ou crimes captados
pelas gravações.
O grampeamento na Bahia é
muito grave, não só pelo envolvimento de um senador no episódio,
mas pela comprovada participação da polícia baiana em seus
mais altos níveis. O teor já divulgado das gravações, porém, não é
de menor gravidade. Nem por isso
tem suscitado o interesse da Polícia Federal, que investiga a execução e a responsabilidade pelos
grampos. Nem o interesse da Câmara e do Senado, onde a atitude
geral, até aqui abrangendo todos
os partidos, é a de investigar a prática das gravações como se não
houvesse gravações. Porque estas,
além de ameaçarem o mandato
do senador Antonio Carlos Magalhães, atingiriam também parlamentares do PMDB, como o deputado Geddel Vieira Lima e o senador Renan Calheiros, entre outros.
Pela teoria criada pelo governo
passado sobre grampeamentos, e
adotada pelo atual governo e pelo
Congresso, se um criminoso levar
à identificação de outro, o segundo não tem com que se preocupar:
o meio que denunciou o seu crime
não era idôneo, não estava de
acordo com as formalidades.
Texto Anterior: Jornalista mentiu e me grampeou, afirma ACM Próximo Texto: Petismo real: Dirceu agradece a PSDB e PFL por vitória Índice
|