São Paulo, domingo, 04 de dezembro de 2005

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ELIO GASPARI

Um golpe anunciado na Venezuela

Há um cheiro de golpe vindo da Venezuela. Num cenário pré-eleitoral em que o presidente Hugo Chávez teve 70% das preferências nas pesquisas, os quatro grandes partidos da oposição decidiram boicotar a eleição parlamentar de hoje.
Chávez batalha para conseguir dois terços do Congresso, bancada necessária para lhe dar um terceiro mandato de seis anos. A oposição diz que abandonou a disputa porque as urnas eletrônicas podem estar viciadas. Ela demonstrou que a coleta de impressões digitais dos eleitores permitiria a quebra do sigilo do voto, mas o procedimento foi suspenso.
É difícil entender que um presidente queira sujar um resultado que não tem razões para temer. Mais difícil, sabendo-se que a eleição está monitorada pela União Européia e pela Organização dos Estados Americanos.
Chávez é um histrião com votos. Já a plutocracia venezuelana, que, em 2002, se associou a fraudes jornalísticas e a um golpe militar liberticida, é mais popular em Miami do que em Caracas. Em agosto passado, Chávez venceu um referendo com 58% dos votos. Seus adversários governam apenas dois dos 23 Estados do país. Boa parte do vigor político do resultado de hoje virá do comparecimento dos 14,5 milhões de eleitores venezuelanos.
Quando a oposição abandona a disputa eleitoral, prenuncia a contestação da legitimidade do resultado. Os oposicionistas que abandonaram o pleito considerarão ilegítimo o Congresso que poderá dar a Chávez o direito de buscar (nas urnas) um novo mandato. Mais um passo, acharão legítima a idéia de derrubá-lo com a ajuda de dois generais, dez caixas e alguns mensalões. Aí é que entra o companheiro Bush com prepotência messiânica. Primeiro ouve-se o eco do que disse a doutora Condoleezza Rice em abril passado: "Democracia não é só eleição". Na quarta-feira, o porta-voz do Departamento de Estado disse que nada tem a ver com o absenteísmo venezuelano, mas indicou que os Estados Unidos estão "preocupados" com a possibilidade de que o direito ao voto "esteja em perigo". Se ele acha que perigo vem da oposição, tudo bem, mas não é esse o caso.
O absenteísmo produz desastres. Há 42 anos, a esquerda venezuelana, inspirada pelo radicalismo cubano, boicotou uma eleição, metralhou eleitores e danou-se. Em 1924, depois do assassinato de um deputado socialista, a oposição italiana abandonou o Congresso e instalou-se o Monte Aventino, onde a plebe romana se rebelara em 494 a.C.. Erro. Benito Mussolini aproveitou o episódio e radicalizou a ditadura ao fim da qual penduraram-no de cabeça para baixo num posto de gasolina de Milão.

O ensino privado merece um lugar

Se o MEC não descobrir um jeito de unificar a maneira como trata as universidades públicas e as privadas, cada uma delas penará seus defeitos sem propagar virtudes. A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) promoveu um seminário para orientar a criação de cursos de mestrado e doutorado. Só para universidades públicas. A rede privada ficou de fora. Ela tem 2,8 milhões de alunos e 15% dos cursos de pós-graduação, com mais de 15 mil estudantes.
O seminário, organizado pela Universidade Federal de Minas Gerais, durou um dia e seus 40 lugares foram nacionalmente disputados. A Capes nada desembolsou com a iniciativa. A exclusão das universidades privadas baseou-se na suposição de que a criação dos novos cursos de pós-graduação tramita em culturas diferentes. Como tanto a rede pública como a privada devem se submeter ao julgamento do MEC, acaba-se na esquina de seis com meia dúzia.
A idéia de que a rede privada é um criadouro de bibocas sacrifica os bons departamentos de universidades particulares e, com isso, beneficia o que há de pior no ensino superior. A Capes promete um novo seminário para 2006. Com sorte, sem exclusões.

Os fundo$ dos fundos
Terça-feira começa uma nova fase de revelações das CPIs. Sai o relatório parcial das malfeitorias cometidas nos fundos de pensão. Como as traficâncias com corretoras amigas vêm de longe, as novidades tirarão a paz de tucanos e petistas.
Não existem no mundo fundos de pensão com tamanha capacidade de investir em negócios que dão prejuízo.

Nuestro guia
Lula ainda não percebeu que é presidente de uma República. Ele disse o seguinte num discurso: "Imagine o que significa se o Evo Morales ganhar as eleições na Bolívia. São mudanças tão extraordinárias que nem mesmo nossos melhores cientistas políticos poderiam escrever, porque não tinha livros antecedentes mostrando que isso seria possível".
"Nuestro guia" confunde diplomacia com torcida de futebol. Tendo reconhecido que nunca leu um livro (nem manual de regras gramaticais), não deveria emitir opiniões a respeito dos assuntos internos de outros países. O presidente do Brasil não tem nada que se meter na eleição boliviana. Tem boliviano que acha o cocaleiro Evo Morales uma desgraça.

Maus modos
Vem aí o presidente do Banco Mundial, Paul Wolfowitz. Como subsecretário da Defesa dos Estados Unidos, foi o animador da lorota das armas de destruição em massa do Iraque. Enquanto estiver em Pindorama, pode fazer o que quiser, mas pede-se que não lamba o pente antes de arrumar o topete.
Para quem quiser conferir (inclusive a cuspidinha posterior), a cena está no filme "Farenheit 9/11", de Michael Moore.

Saber, sabe
Para o bom andamento dos assuntos da República, Lula deveria chamar o Ministério Público e contar tudo o que tem chegado aos seus ouvidos. Mais: dizer aos seus amigos que passa adiante tudo o que lhe contam.
A linha cotonete protege a bolsa da Viúva e, por mais que ele não perceba, resguarda a biografia de Luiz Inácio da Silva.
Assim, quando ele disser que não sabia de uma coisa, a patuléia acredita.

Fritura consentida
A tropa do PT no Congresso passou a brigar mais para preservar o sigilo bancário das corretoras-companheiras do que para proteger alguns sócios da República de Ribeirão Preto.
Fritam Antonio Palocci na chapa do Planalto com o óleo das novas cumplicidades. Hoje, o ministro depende mais dos admiradores que tem na oposição do que dos companheiros y amigos do governo. Por incrível que pareça, acredita nessa receita.

Eremildo e FFHH
Eremildo é um idiota e inaugurará o Comitê Fernando Henrique Cardoso pela Reeleição de Lula. Funcionará no Rio, na avenida Venceslau Brás, 85, no hospital Pinel. Doutor Venceslau, como Lula e FFHH, foi um dos seis presidentes-exterminadores da economia nos últimos cem anos.
FFHH disse o seguinte de Lula: "A política econômica dele é a minha". Verdade, ambos estão na turma da ruína dos 2% de crescimento da economia.
Se a política de um é a do outro e o PSDB se orgulha disso, quem gostou do desempenho dos tucanos deve votar em Lula. Quem não gostou, em tucano é que não deve votar.


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