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AMAZONAS
PF investiga caso de tráfico de influência relatado por preso em depoimento
Lobista envolve políticos em esquema de contrabando
KÁTIA BRASIL
DA AGÊNCIA FOLHA, EM MANAUS
A Polícia Federal está investigando um caso de tráfico de influência que, segundo o depoimento de um lobista preso, envolve deputados federais, senadores
e empresários em um esquema
para facilitar o contrabando na
Zona Franca de Manaus (AM).
O foco da investigação está na
atuação de um grupo de lobistas
que teria sido formado para pressionar, no período da sucessão
presidencial, lideranças do governo de Luiz Inácio Lula da Silva a
trocar os atuais dirigentes da Receita Federal na região Norte.
O suposto esquema foi revelado
a partir do depoimento do administrador e lobista Sérgio Carlos
Nascimento de Andrade, preso na
sexta passada por acusação de extorsão. Ontem, ele ganhou proteção policial da Secretaria de Segurança Pública do Amazonas por
estar ameaçado de morte.
Em depoimento à PF, ao qual a
Agência Folha teve acesso, Sérgio
Andrade disse que foi contratado
por R$ 500 mil por José Lúcio Rosa de Souza e Francisco Antônio
Serrão de Souza, ambos auditores
da Receita Federal do Amazonas,
para que atuasse como lobista na
indicação dos dois para os cargos
de superintendente da Receita Federal na 2ª Região Fiscal e de inspetor da alfândega de Manaus,
respectivamente. A indicação seria feita por meio de lobby com
políticos do PL, PMDB, PT e PP.
O superintendente regional da
Receita Federal na 2ª Região Fiscal (o Norte do país) é José Tostes
Barroso Neto, que está no cargo
desde 1994. A inspetora da alfândega de Manaus, Maria Elízia Andrade, ocupa a função desde 2000
e também foi mantida no cargo
com o início do governo Lula.
Os dois foram os principais articuladores das operações que desbarataram um caso de contrabando na Zona Franca de Manaus,
em 2002, que resultou na apreensão de R$ 200 milhões em equipamentos eletroeletrônicos importados ilegalmente da Ásia.
Em seu depoimento, Sérgio Andrade disse que empresários da
Zona Franca de Manaus insatisfeitos com a "rígida" fiscalização
da Receita financiaram uma campanha para que Souza e Serrão assumissem os dois cargos.
Entre 1999 a 2001, José Lúcio
Rosa de Souza foi o chefe do Serviço de Controle Aduaneiro, departamento responsável pela fiscalização da entrada e saída de
mercadorias da zona portuária de
Manaus para os mercados nacional e exterior, e Francisco Antônio Serrão de Souza comandou o
Serviço de Fiscalização Aduaneira, que é responsável por auditorias dentro das indústrias.
A Polícia Civil do Amazonas
prendeu Sérgio Andrade na sexta-feira por extorsão, depois de
uma denúncia de José Lúcio de
Souza de que estava sendo ameaçado pelo lobista, que dizia ter um
dossiê segundo o qual o fiscal teria enriquecido ilicitamente.
Andrade alegou que estava cobrando R$ 300 mil que teria de receber como parte do lobby e que o
auditor se negava a pagar porque
não havia sido efetivado no cargo.
Ainda segundo o depoimento, o
esquema de lobby começou a ser
planejado em outubro de 2002,
quando foram iniciadas as negociações para nomear os ocupantes de cargos do governo federal.
"Fui procurado pelos auditores
fiscais [Souza e Serrão] porque tenho uma relação de confiança
com o senador Mestrinho", afirmou Andrade, em referência a
Gilberto Mestrinho (PMDB-AM).
O lobista disse que recebeu dos
fiscais a quantia de R$ 100 mil para custeio de passagens de avião
para Brasília, hospedagens em
hotéis e jantares. Entre dezembro
de 2002 a agosto de 2003, ele teria
feito 30 viagens à capital federal,
onde colocou os fiscais em contato com senadores e deputados.
Segundo Andrade, os empresários de Manaus queriam os auditores fiscais nos cargos estratégicos da Receita para a liberação do
contrabando, o que poderia geral
um saldo de até US$ 10 milhões.
Estaria à frente do lobby, de
acordo com Sérgio Andrade, o diretor operacional do Porto de Manaus, Alessandro Bronze, que teria ligações com o ex-senador
Carlos Alberto D'Carli, envolvido
numa disputa judicial com o governo do Amazonas pela operação portuária estadual.
"São financiadores do esquema
de lobby o ex-senador D'Carli e o
deputado federal Francisco Garcia (PFL-AM). O deputado Carlos
Souza (PL-AM) poderia receber
R$ 1 milhão se houvesse a efetivação do nome do senhor José Lúcio", afirmou o lobista ao depor.
Andrade citou ainda lobby feito
com um deputado petista. "Eu, o
deputado Paulo Rocha [PT-PA] e
José Lúcio fizemos um passeio,
em lancha luxuosa de nome Soledad, que pertence ao auditor."
Reação
O procurador da República no
Amazonas Peterson de Paula Pereira anunciou que pedirá os depoimentos de todos os citados.
Ele solicitará à Casa Civil uma
cópia do protocolo de indicação
de José Lúcio de Souza com o referendo do PL. Andrade afirmou
ter protocolado a indicação, com
referendo do partido do deputado amazonense Carlos Souza.
A Casa Civil informou que não
existe protocolo para indicação
de cargos. Pode haver pedidos
por escrito, mas quem poderia verificar se essa indicação foi feita
não pôde ser localizado ontem.
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