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SOMBRA NO PLANALTO
Relatório da Caixa tinha o objetivo de abastecer a gestão petista de dados sobre o setor; Esporte foi alertado por procuradores
Governo já sabia de irregularidade em bingos
FÁTIMA FERNANDES
CLAUDIA ROLLI
DA REPORTAGEM LOCAL
A CEF (Caixa Econômica Federal) sabia desde 2003 que os bingos atuavam de forma ilícita no
país. Documento interno assinado por três auditores da própria
instituição concluiu que todos os
bingos auditados pela Caixa apresentaram irregularidades.
O Ministério do Esporte também foi alertado dois meses depois por três procuradores do Ministério Público Federal de Brasília (DF) sobre sonegação de impostos, lavagem de dinheiro e
evasão de divisas envolvendo os
bingos e demais jogos no país.
O "Relatório da Fiscalização de
Bingos e Sorteios Promocionais e
Filantrópicos" da Caixa, com data
de 11 de março, revela que "o setor
é fortemente permeado por agentes relacionados com a exploração ilícita de jogos e loterias".
Isso porque esses estabelecimentos obtêm autorização para
funcionar, como cita o documento, por meio de "aluguel de nomes
de entidades desportivas ou filantrópicas [como clubes ou confederações esportivas]" ou criam
entidades "chapa fria".
No documento obtido pela Folha, os auditores alertam sobre os
riscos dessa atividade e pedem
providências ao Poder Público
para controlar a atuação dos bingos. A intenção do relatório era
abastecer de informações do setor
o governo petista, que, até recentemente, estava disposto a regulamentar a atividade no país.
Até dezembro de 2002, os bingos tinham autorização para funcionar porque até essa data venciam as últimas licenças emitidas
pela Caixa para esses estabelecimentos. Desde então, não há lei
que permita o funcionamento dos
bingos, que têm exercido suas atividades graças a liminares conseguidas na Justiça.
O governo federal só voltou
atrás da decisão de legalizar o setor antes do Carnaval por causa
do escândalo Waldomiro Diniz,
ex-subchefe de Assuntos Parlamentares da Presidência.
Waldomiro, assessor direto do
ministro José Dirceu (Casa Civil),
foi flagrado em gravação de 2002
pedindo doação de campanha e
propina a um empresário do ramo de jogos. Em reação, o governo editou medida provisória que
proíbe o funcionamento e determina o fechamento dos bingos.
Waldomiro foi exonerado, a pedido, do cargo no dia 13 passado.
No documento feito há um ano,
os auditores concluíram que as
"empresas que exploram a atividade ilícita são constituídas por
"testas-de-ferro", administradas
por terceiros portadores de procuração, o que acaba por impossibilitar ou dificultar a identificação
dos verdadeiros responsáveis".
A fiscalização feita pela Caixa
identificou que cerca de mil bingos estavam em funcionamento
no país. Dos 389 que chegaram a
ser autorizados pela Caixa, cita o
relatório, e que tiveram suas prestações de contas auditadas pela
instituição financeira (número
não revelado no relatório), "todos
apresentaram irregularidades".
A assessoria de imprensa da
Caixa confirmou que os auditores
que assinam o relatório -os nomes são mantidos sob sigilo por
razão de segurança- fizeram o
laudo e informou que o assunto
deveria ser tratado com a Casa Civil.
"Nas mãos do ministro"
Entregue no dia 8 de maio de
2003 ao chefe-de-gabinete do Ministério do Esporte, Francisco
Claudio Monteiro, ofício do Ministério Público Federal de Brasília reforça que os bingos "causam
efetivos prejuízos morais à sociedade brasileira" e pede para "se
combater esse tipo de atividade
empresarial, que absorve, de forma indevida, a economia popular
e permite a lavagem de dinheiro, a
sonegação fiscal etc."
O documento, entregue em
mãos ao chefe-de-gabinete pelas
procuradoras Valquíria Quixadá
e Raquel Branquinho Nascimento, também é assinado pelo procurador Luiz Francisco Fernandes de Souza.
Os três sugerem, no ofício 021/
03, que o Ministério do Esporte
crie força-tarefa, integrada pela
Receita Federal, Coaf (Conselho
de Controle de Atividades Financeiras), órgão de combate à lavagem de dinheiro do Ministério da
Fazenda, e Polícia Federal para
apurar o montante de tributos sonegados no país e pedem o "imediato fechamento das empresas
que atuam à margem da lei".
"Convidamos eles [o Ministério
do Esporte] a formar uma força-tarefa para fechar os bingos no
país, mas não tivemos resposta",
afirma Quixadá. "Se a direção da
Caixa não levou em conta a auditoria dela própria, a instituição errou", diz Souza.
Procurada pela Folha, a assessoria de imprensa do Esporte informou que o documento foi entregue de forma "informal" à entidade e que não foi repassado ao
ministro.
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