São Paulo, sexta-feira, 05 de maio de 2000 |
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QUESTÃO AGRÁRIA Após radicalização, sem-terra optam por desocupação Governo endurece contra invasões, e o MST recua
da Sucursal de Brasília O presidente Fernando Henrique Cardoso decidiu ontem endurecer com os sem-terra, admitiu o uso do Exército e lançou um pacote antiinvasão de prédios públicos e terras. A ofensiva fez o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) recuar e anunciar que vai desocupar a partir das 8h de hoje os prédios públicos invadidos em várias capitais. O dia de ontem começou com o MST ameaçando radicalizar. Em Brasília, o grupo que há dois dias havia invadido a superintendência regional do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) se preparou para resistir à desocupação do prédio, determinada pela Justiça. Os líderes nacionais do movimento também engrossaram o discurso, após reunião pela manhã com partidos de oposição. O MST recusou se reunir com o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Amaury Bier, e insistiu que só sairia dos prédios se o governo designasse um ministro da área econômica para dialogar. A contra-ofensiva do Planalto foi dura: desde cedo FHC fez sucessivas reuniões com ministros para discutir medidas contra o MST e restritivas a invasões. A ordem era: os prédios deveriam ser desocupados imediatamente. A alternativa de usar o Exército ganhou força. No meio da tarde, FHC se reuniu com os ministros Geraldo Quintão (Defesa), Alberto Cardoso (Segurança Institucional) e José Gregori (Justiça), com o comandante do Exército, Gleuber Vieira, e com o diretor-geral-adjunto da Polícia Federal, Wilson Damásio. Segundo a Folha apurou com militares, a reunião foi convocada de emergência, após as ameaças de radicalização do MST. Na reunião, a alternativa de o Exército ser acionado para conter as invasões foi discutida. Mais tarde, o próprio FHC confirmou a intenção de usar a via militar. O recuo do MST começou a ser esboçado à tarde, depois de sucessivas reuniões dos líderes com parlamentares da oposição. A desocupação foi anunciada pelos coordenadores nacionais do MST Jaime Amorim e Gilberto Portes no prédio do Incra em Brasília. Em reunião de 30 minutos com os líderes da invasão, eles eliminaram os focos de resistência à desocupação. Os coordenadores justificaram que o MST não está interessado em confronto com a polícia e irá fazer novas mobilizações. No dia anterior, a direção do MST havia afirmado que só haveria desocupações com ordem judicial ou se confirmada reunião com a presença dos ministros Pedro Malan (Fazenda) e Pedro Parente (Casa Civil). "Quem quer o confronto é o presidente Fernando Henrique Cardoso, que deseja transformar o MST em bode expiatório e nos acusar de radicais", disse Portes. O juiz federal da 15ª Vara, Carlos Augusto Tôrres Nobre, havia determinado a desocupação às 14h de ontem. Mas concordou com o compromisso do MST de sair hoje, levado ao secretário da Segurança Pública, José de Jesus. Anteontem, o MST ocupava prédios em 12 cidades. Pelas contas da entidade, só restaram ontem 8 invasões -Brasília, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Petrolina (PE), Cuiabá, Vitória, Porto Alegre e Porto Velho. Antes da reunião, a ordem entre os 450 invasores do Incra era de resistir à desocupação. O Ministério do Desenvolvimento Agrário divulgou nota acusando o MST de estar se armando com bombas caseiras. O MST negou, mas em imagens aéreas era possível visualizar um arsenal de paus e pedras no telhado do prédio. "Iremos fazer um cordão de isolamento dentro da área do Incra", disse o coordenador regional do MST Valmir de Oliveira. O cordão seria formado por mulheres e crianças. Líderes da oposição passaram o dia tentando convencer os sem-terra a desocupar pacificamente os prédios. Eles temiam que a violência decorrente de um conflito fosse vinculada à oposição, em especial ao PT. Até o início da noite, o líder do PT na Câmara, Aloizio Mercadante (SP), e o deputado José Genoino (SP) permaneciam na liderança do partido, em contato telefônico com os sem-terra. Em reunião pela manhã na liderança do PT, os sem-terra rejeitaram o nome de Amaury Bier como interlocutor do governo. O líder do PSDB na Câmara, Aécio Neves (MG), disse que, ao recusar o nome de Bier, o MST radicalizou. "Não podemos permitir que o MST qualifique o interlocutor do governo. Bier é o segundo homem da economia." O presidente do PT, deputado José Dirceu (SP), deu razão aos sem-terra. "O impasse leva à radicalização. O governo tem de dar um passo à frente", disse ele, que condenou as depredações. Texto Anterior: Painel Próximo Texto: Ministério gasta mais em propaganda que em terra Índice |
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