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JANIO DE FREITAS
A mesma história
A explicação servida ao país
para o morticínio no Carandiru foi a de luta mortal homicida entre facções de encarcerados. A explicação servida ao
país para o massacre em Eldorado do Carajás foi de luta fratricida entre lavradores sem
terra. A explicação servida ao
país para o assassinato do militante do MST no Paraná foi
de tiro disparado por outro
militante.
Ao adotar e subscrever essa
última explicação, originária
da PM paranaense, Fernando
Henrique Cardoso decidiu
pôr-se entre o papel de tolo e o
de mal-intencionado. No primeiro caso, porque já tem idade bastante para não se comprometer com explicação de
PM nenhuma. No outro, porque só má intenção levaria a
manter a mesma história depois de provado que o tiro assassino foi da PM, única utilizadora de balas de borracha.
Já era tempo de governo e
mídia terem percebido que o
movimento dos sem-terra é
uma novidade que não se limita à sua amplitude nacional.
Tática e estrategicamente o
seu comando mostrou-se, até
aqui, com segurança, objetividade e capacidade organizativa incomuns. Seja qual for a
opinião sobre o movimento e
seus propósitos, tais qualidades só lhe seriam negadas por
obtusidade ou má-fé.
Chamar o MST de fascista
ou compará-lo aos torturadores, duas das jóias recentes da
inteligência governamental, é
de um ridículo que se situa no
nível da palhaçada -para
nada dizer-se sobre o que significa como nível mental. Alguns concluem que o governo
não teve, ainda, quem o representasse como interlocutor habilitado para o seu problema
com o MST. É verdade. Mas a
carência é maior: o governo
não teve ainda quem fizesse
uma análise, no sentido pleno
da palavra, do quadro no qual
é uma parte e o MST inovador
é outra, no cenário da absurda
realidade agrária brasileira.
O governo pode ameaçar
com o Exército, pode acionar a
mídia para desgastar o MST e
defender a repressão policial,
pode mesmo acionar o Exército. Mas disso não extrairá bom
resultado para ninguém. Se o
MST, com as características já
demonstradas, entra em ação,
deve-se supor que sabe o que
está fazendo e que contrapartidas lhe podem advir. É motivo mais do que suficiente para
que o governo preferisse agir
com a cabeça, e não com os pés
ou com o dedo no gatilho.
Mas agir com a cabeça, nesse
governo, é que são elas. Se fosse
capaz disso, nem haveria
MST.
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