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São Paulo, quinta-feira, 05 de junho de 2003

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GUERRA DOS JUROS

Presidente afirma não poder desmoralizar decisões de órgão do BC

Críticas atrapalham queda dos juros, diz Lula a Alencar

Sérgio Lima - 26.mai.03/Folha Imagem
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seu vice, José Alencar, conversam em evento do Fome Zero


KENNEDY ALENCAR
LEILA SUWWAN
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pediu ao seu vice, José Alencar, durante conversa de 40 minutos ontem na Base Aérea, em Brasília, que modere em definitivo as críticas aos juros altos e que tenha paciência porque o governo estaria confiante de que a taxa básica de juros, hoje em 26,5%, cairá em breve. Lula, porém, não marcou data para a queda.
Oficialmente, o vice teria ido à Base Aérea receber Lula porque não teria cumprido a obrigação protocolar de fazê-lo em São Paulo, praxe em viagens internacionais devido à transmissão interina do cargo. Lula chegou da Europa segunda-feira à noite e ficou em São Paulo.
Segundo a Folha apurou, num clima afetuoso Lula foi franco ao dizer que as declarações de Alencar em tom duro contra a política econômica só dificultavam os planos de queda dos juros.
Disse que ele e o ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho, já trabalham nos bastidores pela diminuição, mas que não poderão desmoralizar o Copom (Conselho de Política Monetária), órgão do BC (Banco Central) que fixa os juros básicos da economia. É a segunda vez que Lula pede para o vice abrandar suas críticas. No mês passado, Palocci disse ao presidente que em junho ou julho haveria condições para a queda dos juros básicos.
No encontro na Base Aérea, Lula disse ainda a Alencar que não estava chateado e que ambos, por serem amigos, devem enfrentar juntos as dificuldades do governo. O vice prometeu evitar entrevistas polêmicas sobre juros até a próxima reunião do Copom. Disse ao presidente que não teve a intenção de afrontá-lo, ao dar entrevista segunda-feira pedindo "decisão política" para baixar os juros.
Lula comprou a versão de Alencar. O presidente, apesar de ter ficado contrariado, gosta do vice e não pretende tratá-lo de modo duro. Já os ministros José Dirceu (Casa Civil), Antonio Palocci Filho (Fazenda) e Luiz Gushiken (Comunicação de Governo), que formam com Lula a cúpula do governo, estão mais contrariados do que o presidente.
Acreditam que Alencar, com as declarações, joga o desgaste todo para Lula, fica com a fama de lutar por uma "boa causa" e pressiona o governo a marcar uma data para a redução dos juros.
Dirceu, por exemplo, acha que Alencar passou dos limites, porque, ao se despedir de Lula uma semana antes, dissera que não daria entrevistas enquanto estivesse no exercício da Presidência.
Após o encontro, o presidente foi para o Palácio da Alvorada, onde se reuniu com ministros e auxiliares. Já Alencar retornou para seu gabinete no Palácio do Planalto. Demonstrou estar bem-humorado durante o dia e não modificou sua rotina de audiências com políticos e empresários.
Durante o dia, em encontros privados, Alencar repetiu suas opiniões sobre os juros e teria dito, segundo relatos, que a economia está "encabrestada pela lógica de mercado". Em audiências, disse querer que todos entendam que não está defendendo os interesses de suas empresas.
"Eu não estou trabalhando em causa própria porque minhas empresas são aplicadoras de recursos, não tomadoras de recursos. E olha que não tem nada que renda mais que esses juros. A cada três anos o capital dobra, numa mão segura e garantida que é o governo", disse Alencar, segundo relatos do senador Aelton Freitas (PL-MG), seu suplente, e outros dois empresários mineiros.
À noite, ao deixar a Vice-Presidência, às 20h50, Alencar negou indiretamente que Lula tenha pedido a ele para amenizar as críticas à política de juros. Questionado sobre como havia sido a conversa, afirmou que "não teve nada daquilo que vocês [jornalistas] gostariam que tivesse".
Segundo Alencar, em vez de fazer qualquer tipo de repreensão, Lula o surpreendeu oferecendo o avião presidencial para ele ir hoje de manhã a Salvador. "Vocês vão falar que ele deve ter posto alguma coisa no avião para o avião cair, já que ele não gosta de mim", brincou o vice.
Alencar reúne hoje a bancada do PL na Câmara e no Senado em um jantar no Palácio do Jaburu. O jantar servirá como um ato de apoio do partido ao vice. O PL diz, porém, que o evento estava marcado desde meados de maio, sem ter relação com a crise.


Colaborou OTÁVIO CABRAL, do Painel


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