São Paulo, Domingo, 05 de Dezembro de 1999


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MATO GROSSO DO SUL

Tribo de Dourados pode invadir área

ROBERTO SAMORA
da Agência Folha, em Dourados



A qualquer momento, pode estourar um conflito pela posse da terra em Mato Grosso do Sul entre índios e colonos, assentados no local há décadas. Hoje termina o prazo dado pelos guaranis-caiuás da aldeia Panambizinho, em Dourados (MS), para que o governo lhes entregue uma área da qual foram retirados na década de 30, e eles ameaçam com invasão.
O confronto pode envolver todas as comunidades indígenas do município -que abriga três aldeias, com mais de 9.000 índios. Na aldeia Panambizinho, vivem cerca de 270 índios, que moram espremidos em dois lotes de 30 hectares, cercados por propriedades que compõem a produtiva Colônia Agrícola Nacional de Dourados. Eles reivindicam mais 1.180 hectares.
A reivindicação ganhou mais força depois que o próprio governo federal reconheceu, em 1995, que as terras são indígenas.
Inconformados com a morosidade da Justiça em resolver o problema, os índios prometem hoje pôr fim a uma trégua estabelecida há alguns meses, depois que os ânimos se acirraram após o suicídio coletivo de três índios.
"Se ninguém tomar providência até o dia 5 (hoje), nós vamos resolver", declarou Valdomiro Aquino, líder indígena de Panambizinho. Aquino, um dos que melhor fala português na aldeia -que preserva fortes traços culturais e religiosos guaranis-, disse não se importar se os colonos resistirem à invasão.
"O problema é deles. Se resistirem, nós também não recuamos. Depois de domingo, vai ser igual a doença brava (Aids): pegou não tem mais jeito."
Os colonos pensam de forma parecida. "Nós não vamos sair daqui. Vamos defender o que é nosso. Não perdemos nada na Justiça. Se invadirem, vai dar pau. Se vierem armados, não estaremos com as mãos vazias", afirmou Dionésio Marques Rosa, 41, representante da colônia.
Os guaranis têm mais do que argumentos históricos para dizer que a área lhes pertence. Eles contam com uma portaria do Ministério da Justiça, assinada pelo então ministro Nelson Jobim, em Panambizinho, em 26 de julho de 1995.
A portaria, que o ministro assinou apoiando o papel nas costas de um índio, reconheceu um laudo feito pela Funai (Fundação Nacional do Índio) atestando que as terras ocupadas pelos colonos pertenceram aos índios.
A partir dessa data, estabeleceu-se uma disputa na 1ª Vara da Justiça Federal, em Campo Grande. Colonos entraram na Justiça para impedir a demarcação das terras pela Funai e evitar a perda de suas propriedades. Eles estão no local há décadas, alguns desde 1943, quando o presidente Getúlio Vargas criou a colônia com um decreto.
A decisão judicial sobre quem tem o direito sobre a terra deve sair este mês, o que explica em parte porque os índios estabeleceram o dia de hoje como data limite para a solução do governo.
O outro motivo, mais relevante, foi um acordo feito em 4 de outubro entre representantes dos 60 mil índios de Mato Grosso do Sul, em encontro intertribal ocorrido em Panambizinho.
Diante do aumento no número de suicídios na aldeia, os índios decidiram no encontro que, se nada fosse feito, realizariam o que chamam de "autodemarcação". Essa operação, já arquitetada entre as lideranças indígenas de Mato Grosso do Sul, consiste na ocupação da área por cerca de 5.000 índios. A data ainda não foi definida. A Polícia Federal informou que está alerta.




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