São Paulo, sexta-feira, 06 de abril de 2001

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INVESTIGAÇÃO

Relatório da PF traz indícios de que US$ 4 mi em depósitos em contas-fantasmas tenham sido usados na eleição de 90

Verba teria financiado campanha de ACM

DA ENVIADA ESPECIAL A SALVADOR

O relatório da Polícia Federal sobre as contas-fantasmas no Citibank e no Banco Econômico, em Salvador, que deu origem à ação judicial, apontou indícios de que o dinheiro (cerca de US$ 4 milhões em depósitos) teria sido usado no financiamento da campanha de Antonio Carlos Magalhães (PFL) para o governo do Estado da Bahia, em 1990.
O delegado Roberto Chagas Monteiro, autor do relatório, citou quatro indícios nesse sentido: a participação de funcionários da TV Bahia (da família do senador pefelista) na abertura das contas; a coincidência entre o período de vida da conta (julho de 90 a janeiro de 91) e a campanha eleitoral; o alto valor dos depósitos, condizente com a dimensão da campanha e o depoimento do empreiteiro Thales Sarmento, dono da construtora Sérvia, da Bahia, que admitiu ter contribuído para campanhas eleitorais de candidatos do Nordeste.

Elemento-chave
Sarmento foi elemento-chave para a investigação.
Ele estava sob a mira da PF por ter aberto duas contas-fantasmas no Banco Mercantil da Bahia e repassado dinheiro para Paulo César Farias, tesoureiro da campanha do ex-presidente Fernando Collor de Mello, por intermédio delas.
A conta do Citibank só foi descoberta porque também recebeu dinheiro de Sarmento.
Ele afirmou em depoimento à PF que ajudou candidatos diversos na Bahia, Sergipe e outros Estados do Nordeste onde sua empresa atuava, mas não citou nome dos políticos beneficiados.

Mais indícios
Na ocasião do inquérito, outras empresas e pessoas que também tiveram cheques depositados na conta-fantasma do Citibank forneceram ao delegado Roberto Monteiro mais indícios de que o dinheiro teria sido usado na campanha do então candidato pefelista ao governo da Bahia, Antonio Carlos Magalhães.
O médico José Leopoldo Valverde foi um deles. Questionado por que fez depósitos em favor de Hugo Tavares Freire Filho (o fantasma da conta do Citibank), respondeu que o dinheiro era doação para campanhas eleitorais no Estado da Bahia e que havia assinado o cheque sem preencher o espaço destinado à identificação do destinatário.
Segundo Valverde, foram ""contribuições quase simbólicas, com intuito de atender amigos".
O médico também não identificou os beneficiários de suas doações.
A empresa de ônibus (interestadual) Viação Novo Horizonte deu uma justificativa surpreendente para o depósito.
Disse que o cheque, encontrado na conta do fantasma, era pagamento ao ex-deputado federal Sebastião Ferreira da Silva, de Barreiras (BA), que seria intermediário da empresa junto ao DNER (Departamento Nacional de Estradas de Rodagem) para a obtenção de linhas rodoviárias.
O ex-deputado morreu em acidente de avião em 92.

Odebrecht
A Construtora Norberto Odebrecht teve dor de cabeça com seus cheques, que, segundo o delegado, foram a grande fonte de alimentação da conta.
Além dos CR$ 20 milhões (cerca de US$ 300 mil) que depositou na conta na TV Bahia no dia em que a conta de Hugo foi aberta no Citibank, a construtora emitiu cheques em favor da InterTV que, em seguida, apareceram na conta do fantasma.
O delegado não aceitou as explicações dadas pela TV Bahia para o cheque que recebeu da Odebrecht e indiciou o diretor da emissora, Isaac Edington, responsável pela informação, por falso testemunho.
Foram igualmente rejeitadas as explicações para os cheques emitidos em favor da InterTV. Dois diretores da empreiteira -Paul Elie Altit (financeiro) e Carlos Jorge Azevedo (planejamento)- admitiram que a empresa não possuía comprovantes de serviços prestados pela InterTV e que, por isto, desistiu de lançar os gastos como despesas no Imposto de Renda.

Desinformados
Outro depositante na conta, a empresa Modelo Corretora de Seguros, disse que emitira o cheque em favor da Viação Novo Horizonte e que desconhecia o destino final dado ao dinheiro.
A empreiteira Encosa Engenharia e Comércio Salvador disse que seu cheque se destinava a pagamento de despesas de obras no município de Aiquara (BA) e que não tinha "a mínima idéia" de como ele fora parar na conta do fantasma Hugo.
Outra empreiteira, a Ergon Engenharia (já desativada), disse que seu cheque havia sido emitido para pagamento à J. G. Empreiteira, Comércio, Indústria e Aluguel de Máquinas, de Feira de Santana (BA).
""Foram inúteis os esforços para localizar a empresa J. G. Empreiteira, Comércio, Industria e Aluguel de Máquinas", escreveu o delegado em seu relatório, deixando a entender que ela não existia.

Explicação prosaica
Surgiram explicações ainda mais prosaicas. O proprietário da empresa Cimentex Comércio de Materiais de Construção e Cereais Ltda., Rubem Cerqueira Teixeira, que teve um cheque depositado na conta de Hugo, disse que o mesmo havia sido trocado, mediante ágio, durante o Plano Collor, na agência do Banco Mercantil de São de Paulo em Feira de Santana.
(ELVIRA LOBATO)


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