São Paulo, Segunda-feira, 06 de Dezembro de 1999


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CONTRAPONTO
Motorista não participava do ato
Polícia "quis dar lição", diz atingido

da Sucursal de Brasília

Jesus Ferreira Machado, 26, ganhava R$ 338 como motorista de uma empresa que prestava serviços à Novacap.
Na quinta-feira passada, foi impedido de entrar na sede por causa da manifestação e recebeu ordens para aguardar o fim do ato do lado de fora. Foi atingido por uma bala de borracha disparada pela Polícia Militar de Brasília que o deixou cego do olho esquerdo.
Leia a seguir, trechos da entrevista que concedeu à Folha no Hospital de Base de Brasília, na manhã de sábado. (AUGUSTO GAZIR E DANIELA FALCÃO)

Folha - Você estava participando da manifestação? Jesus Ferreira Machado -Não, eu estava distante, a uns 50 metros. Aí, a tropa de choque chegou, veio para cima dos manifestantes com bombas de gás lacrimogêneo, atirando.

Folha - Quando começou a confusão, o que você fez?
Machado -
Eu continuei lá, não imaginava que corria risco. Quando vi que estava chegando perto de mim, saí correndo, como todo mundo. Mas foi aí que me acertaram pelas costas, me acertaram o olho, com um tiro de borracha. Caí no chão com a força do tiro, pus a mão no olho e já estava tudo cheio de sangue: o nariz, a boca. Eu senti o olho para fora, pedi ajuda a uns colegas.

Folha - Não deu para fugir?
Machado -
Foi muito rápido. Mesmo depois de ter desobstruído a passagem, a polícia continuou correndo atrás do pessoal, atirando. A polícia e o governo quiseram dar uma lição nos manifestantes, para mostrar que eles não querem manifestação. Até porque, quando eu fui atingido, já não tinha mais ninguém no portão.

Folha - Quais são seus planos?
Machado -
Só Deus sabe. Perdi minha visão, meus planos de motorista estão mais difíceis agora. Estou concluindo o 2º grau para ser técnico em contabilidade. Fiz isso com a esperança de arrumar emprego de motorista em outra empresa para o salário melhorar.

Folha - O secretário da Segurança foi afastado, você acha suficiente?
Machado -
Não, acho que a punição tem de ser bem mais dura, porque ninguém vai poder devolver minha visão.

Folha - Você vai pedir indenização ao governo?
Machado -
Vou sim, apesar de que nenhum dinheiro nesse mundo vai colocar a minha visão de volta. Mas eles vão ter de indenizar. Infelizmente eu votei no Roriz, porque eu achei que ele era o governador que iria dar um jeito em Brasília, mas parece que votei errado.


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