São Paulo, Terça-feira, 07 de Setembro de 1999
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Novo titular chega com duas imagens

CLÓVIS ROSSI
do Conselho Editorial

Alcides Tápias chega ao governo com uma imagem de duas faces, até certo ponto antagônicas: a do banqueiro, função em que fez o nome (no Bradesco), e a de empresário que, nos últimos tempos, aproximou-se do Iedi (Instituto de Estudos de Desenvolvimento Industrial), o mais notório banco de cérebros desenvolvimentista do empresariado paulista.
Talvez tenha sido escolhido exatamente por essa dupla imagem: não é um pensador, um formulador, capaz de contrapor-se ao ministro da Fazenda, Pedro Malan.
Mas é uma ponte perfeita entre o governo central e o empresariado paulista, o que mais verbaliza o seu desconforto com a política econômica.

Crítica
A propósito: seu antecessor, Clóvis Carvalho, caiu pelo desastrado discurso a respeito da "covardia" de Malan, mas já não vinha agradando o presidente Fernando Henrique exatamente por ter tido desempenho pífio em eventos em São Paulo, sempre na avaliação colhida junto ao Palácio do Planalto.
É óbvio que o fato de Tápias ter se aproximado do Iedi não significa que sua política será a do Iedi, de contornos muito mais nacionalistas e desenvolvimentistas do que qualquer outra proposta do establishment.
Significa apenas que o governo central quer ter uma boa ponte com essa fatia descontente do empresariado -e Tápias pode executar o papel à perfeição.

Equidistante
O novo ministro, aliás, é tido como equidistante dos dois grandes nomes simbólicos do empresariado industrial, o "monetarista" Eduardo Eugênio, presidente da Firjan (a Federação das Indústrias do Rio de Janeiro), e o "desenvolvimentista" Horácio Lafer Piva, seu colega da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo.
Como banqueiro e também presidente da Febraban (Federação Brasileira de Bancos, entre 1991 e 1994), no entanto, Tápias foi o arquétipo do liberalismo, até antes de que as receitas neoliberais se tornassem tão hegemônicas (no governo José Sarney, por exemplo).
Logo, jamais dirá que o equilíbrio orçamentário, a menina dos olhos do ministro Pedro Malan, deve ser relaxado em benefício de um crescimento mais acelerado.
Por extensão, não há risco aparente de outra colisão tão frontal entre ministros como a que aconteceu na quinta-feira da semana passada -quando, num seminário promovido pelo PSDB, partido do próprio presidente, Clóvis Carvalho sugeriu que a política econômica defendida por Malan poderia ser confundida com covardia.

Atritos
A escolha de Tápias, ao menos pelo que a Folha pôde apurar, deveu-se exatamente ao desejo do presidente de não criar nenhum potencial foco de atrito com Malan, que poderia ser desestabilizador para o ministro da Fazenda e, por extensão, para a própria política econômica.
O que não significa que Tápias vá ser figura decorativa no Ministério, uma espécie de subministro, subordinado a Malan.
O presidente sabe que a pressão política, em especial de seus aliados, e empresarial não vai dar trégua nos próximos meses.
O discurso que causou a queda de Clóvis Carvalho é o discurso de incontáveis aliados do presidente (para não falar de quase todos os líderes da oposição).
Tais aliados são apenas mais hábeis do que o ex-ministro do Desenvolvimento -uma habilidade que não falta tampouco ao novo titular da pasta.


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