São Paulo, Domingo, 07 de Novembro de 1999
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VENDA DA CESP

Para especialistas, BNDES mudou as regras de venda da companhia

Advogados questionam privatização

da Reportagem Local

O governo do Estado de São Paulo deveria ter suspenso o leilão da energética paulista Tietê e reaberto o prazo de habilitação para empresas interessadas, após o BNDES ter anunciado que financiaria grupos estrangeiros.
Essa é a opinião de quatro advogados ouvidos pela Folha. Eles afirmam que o leilão das ações da Tietê foi irregular.
As ações da empresa foram leiloadas em 28 de outubro. Na véspera, o BNDES anunciou que financiaria 50% do preço mínimo (cerca de R$ 360 milhões) a grupos estrangeiros. As empresas nacionais já tinham a possibilidade de receber o empréstimo.
Para os advogados, as regras do jogo mudaram quando ele já estava em andamento, o que é proibido pela legislação.
Segundo eles, grupos estrangeiros que não se interessaram pelo leilão poderiam ter querido apresentar propostas quando souberam da possibilidade de financiamento do BNDES.
A empresa norte-americana AES arrematou as ações da Tietê por R$ 938 milhões e admitiu que o financiamento do BNDES foi "fundamental" para o negócio.
O advogado Ives Gandra Martins, professor da Universidade Mackenzie, afirma que "se o anúncio do financiamento é feito na última hora, ele propiciou para as estrangeiras já inscritas um benefício concorrencial".
Para ele, "nesse particular, houve ferimento do princípio da livre concorrência. O governo deveria ter aberto novamente o prazo de habilitação".
Já o advogado Celso Antônio Bandeira de Mello, professor da PUC-SP, diz que o anúncio do financiamento "torna a licitação nula". Para ele, foi violado o princípio da igualdade. "Na licitação não deve haver surpresa alguma, por isso existem prazos."
Ele afirma que "a publicidade (do financiamento) foi feita em época que não poderia aproveitar a quaisquer". O advogado ressalta, ainda, que "nada pode garantir que outros já não tinham ciência do financiamento".
Para o advogado Dalmo de Abreu Dallari, professor da Universidade de São Paulo, o financiamento "é um escândalo" porque "interfere na competição".
"Isso é ilegal. A lei proíbe qualquer interferência na livre competição", afirma.
Na opinião do advogado Laércio José dos Santos, professor da Universidade Paulista, outros grupos estrangeiros que não participaram do leilão foram lesados pelo anúncio do financiamento.
"O Estado de São Paulo foi prejudicado, à medida que a oferta poderia ter sido maior se o número de concorrentes fosse maior."
Todos os advogados criticaram o fato de o BNDES conceder empréstimo a empresas estrangeiras. "O governo atrai o investidor externo, mas não o dinheiro do investidor. É uma atração besta", diz Dallari. (ROBERTO COSSO)


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