São Paulo, Domingo, 07 de Novembro de 1999
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CELSO PINTO

Boas notícias em euros

A emissão adicional de 200 milhões de euros em bônus, sexta-feira, elevou o total captado pelo Brasil em euros para 2 bilhões neste ano, ou mais de US$ 2,1 bilhões. É uma marca expressiva, por várias razões.
Em primeiro lugar, pelo momento em que essa emissão se deu. Até uns dois meses atrás, havia um quase consenso de que os países emergentes não iriam conseguir emitir papéis além de outubro. O medo dos efeitos do chamado "bug do milênio" levaria a uma forte retração na liquidez e a uma fuga do risco, por parte dos investidores internacionais. Até agora, isso não aconteceu e alguns começam a duvidar que venha a acontecer em grande proporção.
Outro ponto importante é o prazo, de sete anos. O Brasil já havia emitido, neste ano, 800 milhões de euros em bônus de três anos e 500 milhões em bônus de cinco anos, mas quando pensou em tentar sete anos, em setembro, acabou desistindo. A Argentina captou este ano um total de 5,25 bilhões em euros (US$ 5,6 bilhões), mas o prazo máximo que conseguiu foi cinco anos.
A atual emissão foi pensada para 300 milhões de euros mas, ao ir para o mercado, na quinta-feira, 28 de outubro, acabou subindo para 500 milhões de euros. Os bônus renderam 12,11% ao ano, com um prêmio ("spread") de 6,85 pontos percentuais.
Nesta quinta-feira, quando o Banco Central Europeu aumentou as taxas básicas de juros de 2,5% para 3%, acima do esperado, houve uma imediata reação positiva dos investidores em bônus. Alemanha e Itália, cujas economias estão começando a se recuperar, eram contra o aumento. Ele ainda pode ser prejudicial para o ritmo de recuperação européia, mas os investidores viram a alta dos juros como garantia de inflação baixa e juros mais competitivos em relação ao esperado aumento adicional dos juros americanos.
Ao ver a boa reação no mercado, o Deutsche Bank, líder da emissão brasileira, sugeriu a reabertura dos bônus, o que foi feito na sexta-feira. Os 200 milhões de euros adicionais foram facilmente colocados, segundo Tim Dowling e Sandy Severino, do Deutsche Bank de Nova York, mesmo rendendo um pouco menos (11,81%, com "spread" de 6,82 pontos percentuais).
As emissões em euros têm uma boa colocação no varejo, ao contrário das emissões americanas em dólares, absorvidas por investidores institucionais. Por essa razão, é mais comum reabrir a venda de papéis em euros, se houver demanda.
O fato é que o euro, criado em janeiro, gerou um mercado muito bem sucedido de bônus. As emissões em euros neste ano, equivalentes a US$ 389 bilhões, são quase quatro vezes superiores aos US$ 102 bilhões emitidos em 98, nas moedas originais dos 11 países que passaram a usar o euro. A razão é simples: o mercado conjunto, por ter muito mais liquidez, é muito mais atraente.
O interesse dos europeus por papéis latino-americanos é real e há um potencial para reduzir ainda mais os "spreads", disse Andrea Burgtorf, chefe da Análise de Risco de Países Emergentes do Deutsche Bank, em Frankfurt, em conversa com o colunista, semana passada. "Mas os investidores estão muito mais atentos ao risco e questionando as políticas dos países", observou. "O fluxo de recursos não vai voltar a ser tão abundante quanto era antes da crise da Rússia", prevê.
Apesar deste final de ano estar sendo, por enquanto, melhor do que se previa, ela acredita que o ciclo econômico futuro, com altas de juros nos Estados Unidos e na Europa, aponta para menos liquidez em geral. Os países emergentes terão que contar mais com sua poupança interna.
Burgtorf diz que seria "imprudente" dizer que a crise latino-americana já acabou, mas acha positivo que o contágio da crise tenha sido limitado. Entre os países emergentes, ela vê duas áreas de potencial confusão. Uma é a China, menos pelo impacto externo de uma eventual desvalorização cambial, que será pequeno, do que pelas dificuldades nas reformas internas. Outra vem de alguns países do Leste Europeu, como Polônia, que ainda têm déficits nas contas externas muito elevados.
O principal problema no Brasil, a seu ver, é fiscal. As metas primárias serão atingidas, mas o déficit nominal é muito alto e sua queda depende da conquista de confiança que permita reduzir os juros. O nível da dívida interna não é tão alto, mas sua dinâmica preocupa pelo alto nível dos juros e curto prazo de vencimento.




Texto Anterior: Elio Gaspari: Uma reforma que gratifica os ineptos
Próximo Texto: Precatórios: Padilha diz que vai investigar gestão do antecessor Goldman
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.