São Paulo, domingo, 8 de fevereiro de 1998

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QUARTO MUNDO
Mortes atingem famílias inteiras no RN

do enviado especial

A pesca da lagosta no litoral do Rio Grande do Norte está dizimando famílias inteiras. A Folha levantou casos de uma mesma família em que há morte e paralisia. As maiores vítimas são jovens com idade média de 23 anos, mas também há menores entre eles.
Em São Miguel do Gostoso (110 km a leste de Natal), o paralítico Marcone Iran Ferreira, 29, casado e com dois filhos, tem um concunhado que morreu há cinco anos, deixando viúva e quatro filhos. Em Rio do Fogo (75 km a leste de Natal), a mesma história se repete.
Geovásio Quirino, 31, com problemas de locomoção, tem um irmão paralítico e um tio com problemas neurológicos. Na mesma praia, Benivaldo Silva, 43, paralítico, é irmão de Francisco Gomes da Silva, 46, igualmente paraplégico.
Em Cajueiro (100 km a leste de Natal), dois menores morreram há sete anos -um deles tinha 16 anos; o outro, 17. Na mesma praia, Pedro Veloso, 29, ficou paralítico aos 17 anos. Pedrinho, como é mais conhecido, anda de muletas, tem problemas de impotência sexual e usa sonda para urinar.
Pedrinho é aposentado pelo INSS. Seu caso é uma raridade, pois o INSS só aposenta um deficiente quando ele se torna totalmente inválido. Silas Baracho, da Colônia de Pescadores de Cajueiro, diz que a tendência é o INSS considerar a morte dos pescadores que mergulham um suicídio.
Segundo Baracho, é o mesmo argumento usado por empresas que dão cobertura de seguro a alguns dos barcos em que há acidentes. A Capitania dos Portos, segundo Baracho, também cria obstáculos para dar atestado à família da vítima.
"A capitania quer evitar a pesca predatória e evita dar documentos sobre esses acidentes. Entende que isso estimula a atividade ilegal", diz Baracho. O quadro é agravado pela fragilidade financeira dos proprietários de barcos.
Ao contrário do Ceará, onde a pesca da lagosta é feita em parte por grandes barcos pesqueiros, no Rio Grande do Norte a pesca é quase artesanal. Os proprietários dos pequenos barcos que pescam lagosta dizem não ter dinheiro para dar assistência aos acidentados de suas embarcações.
Os donos de barcos não cobrem nem as despesas funerárias. "Quando um pescador morre, a prefeitura dá o caixão e nós damos o atestado da morte para a viúva pedir aposentadoria ao INSS", diz Manoel Lourenço, da Colônia de Pescadores de Rio do Fogo.
(EMANUEL NERI)


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