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CELSO PINTO
O tombo da Cesp
O que aconteceu com as
ações da Cesp foi um massacre. Nos últimos 30 dias, as
preferenciais e ordinárias caíram mais de 40%, e a queda
chegou a mais de 60% em relação ao pico dos últimos 12
meses.
Hoje, as ações da Cesp estão
sendo negociadas a 25% do
valor patrimonial da empresa
-de longe, a pior marca entre as empresas elétricas. As
ações da Light, por exemplo,
com toda a confusão, continuam valendo 180% do valor
patrimonial, as da Eletropaulo valem 112%, as da CPFL
valem 140%.
O tombo recente veio com a
rejeição do mercado à forma
encontrada pelo governo paulista para vender a área de
distribuição. O governo tentou explicar, sem sucesso, suas
razões. As dúvidas em relação
ao futuro da Cesp persistem e
vão além do modelo de venda.
A Cesp fez um enorme esforço de ajuste e saneamento nos
últimos três anos. Enxugou,
melhorou a produtividade e
equacionou várias dívidas.
Continuou, contudo, com um
passivo gigantesco, em torno
de R$ 12 bilhões, dos quais
pouco mais de R$ 2 bilhões
são dívidas não financeiras e
US$ 6,6 bilhões são dívida externa.
É muito dinheiro e custa
muito caro. Nos últimos anos,
a Cesp vendeu a idéia de que
poderia reduzir substancialmente esse passivo, usando o
dinheiro da venda fatiada de
seus negócios. No final, supunha-se que sobraria para privatizar a maior empresa de
geração de energia do país,
com uma dívida administrável, valendo uns US$ 6,5 bilhões, dos quais o acionista
controlador, o governo paulista, ficaria com uns US$ 3 bilhões a US$ 4 bilhões.
O modelo de criar subsidiárias integrais (uma para a
distribuição e três para a geração), contudo, cria dúvidas.
O governo paulista decidiu
que vai subscrever pelo menos
60,5% do capital votante da
Elektro (de distribuição) e se
apropriar do lucro com a privatização.
A Cesp transferiu R$ 800
milhões em dívidas para a
Elektro e vai se beneficiar com
sobras não subscritas e com a
capitalização da subsidiária.
O lucro do governo paulista
com a venda, contudo, ficará
com ele, não com a Cesp. O
mercado estima que a Elektro
poderá render até US$ 2,5 bilhões (o que depende, entre
outras coisas, de um reajuste
de tarifas pedido, que Brasília
reluta em aceitar).
O mesmo processo valerá
para as três subsidiárias que
serão criadas para a geração.
Parte da dívida da Cesp será
alocada nessas empresas, mas
parte do lucro com os ativos
irá para o cofre do Estado.
Sobram várias dúvidas. Não
se sabe quantas geradoras de
energia será viável privatizar
em 98, mesmo supondo que
Brasília adie a venda de suas
maiores geradoras. Se o futuro governador for Paulo Maluf, há dúvidas se a privatização continuará. Não se sabe o
tamanho da dívida que sobrará na última holding de
geração, o que poderá complicar sua venda.
Esses são temores dos minoritários que ajudam a derrubar os preços das ações. A privatização da Cesp, contudo,
envolve outras dúvidas mais
amplas.
Não existe um marco regulatório claro para a geração
privada de energia. Até hoje o
governo não enviou um projeto de lei regulamentando o
funcionamento do operador
independente e da interligação do sistema.
Sem isso, quem comprar
uma geradora privada não
saberá em que circunstâncias
será obrigado a reduzir ou
elevar sua produção em benefício da otimização do sistema
nacional. Não saberá como
vai funcionar o mercado de
oferta de energia no atacado,
como ficarão contratos de
longo prazo e a precificação.
Sem leis definindo questões
cruciais que afetam custos e
lucros, o valor da privatização
acabará caindo. Exatamente
como aconteceu com as primeiras privatizações na distribuição, como as da Escelsa
e da Light. Os compradores
privados pagaram pouco, garantiram tarifas altas por oito
anos e ficaram com muito menos obrigações do que as embutidas em privatizações mais
recentes (como a da CPFL).
Deu no que deu, e os problemas com a Light podem acabar afetando o próprio programa de privatização. Se isso
se repetir na área de geração,
será pela mesma razão: o desespero do Estado em fazer
caixa, de um lado, e a lentidão em regulamentar, de outro.
E-mail: CelPinto@uol.com.br
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