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ENTREVISTA DA 2ª
JORGE BORNHAUSEN
Pefelista critica condução da economia pelo governo e vê marca indelével deixada pelo caso Waldomiro
"Documento do PT que critica política econômica é tiro no pé"
ELIANE CANTANHÊDE
DIRETORA DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O presidente nacional do PFL,
senador Jorge Bornhausen (SC),
66, ataca duramente a política
econômica do governo Luiz Inácio Lula da Silva, mas classifica de
"irresponsabilidade" e de "tiro no
pé, ou no coração", a nota da Executiva Nacional do PT que cobra
mudanças na economia.
"Vamos ver qual a repercussão
disso no mercado na segunda-feira [hoje]", disse Bornhausen à Folha no sábado, em seu apartamento de Brasília.
Na sexta-feira, durante encontro em São Paulo, a cúpula do PT
divulgou nota defendendo o partido e o governo no caso Waldomiro Diniz -referência ao ex-subchefe de Assuntos Parlamentares da Presidência que foi flagrado em vídeo pedindo propina
e dinheiro para campanhas eleitorais em 2002, quando era presidente da Loterj (Loteria do Estado
do Rio de Janeiro). Na época, Benedita da Silva (PT) era a governadora do Rio de Janeiro.
O ponto mais sensível da nota,
porém, dizia respeito à economia:
pedia mudanças de rumo na ortodoxia capitaneada pela equipe do
ministro Antonio Palocci Filho
(Fazenda). "Vamos trabalhar
com afinco para que o governo
implemente as medidas necessárias para que 2004 marque o início de um novo e sustentado ciclo
de desenvolvimento econômico e
social do país, através de mudanças na política econômica necessárias à implantação e consolidação de todos os nossos programas
sociais, econômicos e administrativos", diz trecho da nota do PT.
Na quinta, Bornhausen almoçou com o presidente nacional do
PSDB, José Serra. Na sexta, encontrou-se com o ex-presidente
Fernando Henrique Cardoso
(PSDB) em São Paulo.
Sua certeza, ratificada também
nessas conversas, é de que a crise
política deixou marca indelével :
"Um governo que era forte e mal
gerenciado fica fraco e continua
mal gerenciado. É péssimo para o
país. A ameaça é de uma nova década perdida".
Bornhausen acha que novas denúncias virão e que a popularidade do presidente Luiz Inácio Lula
da Silva vai ser afetada. Segundo
pesquisa Datafolha publicada na
semana passada, Lula não teve
seu prestígio pessoal abalado pelo
caso Waldomiro.
De acordo com o levantamento,
apesar de o governo Lula ter sofrido um solavanco, no limite da
margem de erro, perdendo um
pouco de popularidade, o chefe
da administração teve sua imagem totalmente preservada pelos
2.306 eleitores pesquisados pelo
Datafolha no dia 1º de março, em
todas as unidades da Federação.
Em dezembro passado, o governo Lula tinha 42% de aprovação.
O percentual é a soma de respostas ótimo e bom. Hoje, a administração petista tem a aprovação de
38% dos eleitores -43% consideram o governo regular; 17%, ruim
ou péssimo.
Já o presidente Lula manteve
sua imagem nos últimos meses,
apesar dos indicadores ruins da
economia e do escândalo Waldomiro Diniz. Em outubro passado,
quando o Datafolha fez pela última vez a pergunta sobre o desempenho pessoal do petista, ele teve
60% de aprovação. Na última pesquisa, obteve percentual idêntico.
A margem de erro da pesquisa é
de dois pontos percentuais, para
mais ou para menos.
Folha - O sr. concorda com o documento do PT pedindo mudanças na
política econômica?
Jorge Bornhausen - Vamos ver
qual a repercussão disso no mercado na segunda-feira [hoje]. Foi
mais uma declaração irresponsável do PT em relação à política do
ministro [Antonio] Palocci [Filho, da Fazenda]. Acho que eles
estão descontrolados com a crise,
tentando mudar o foco, tirando o
ministro da Casa Civil [José Dirceu] do pênalti e colocando o Palocci, que estava fora.
Folha - Com o virtual enterro da
CPI dos bingos, a crise está debelada?
Bornhausen - A crise foi muito
mal administrada e vai se estender por muito tempo, com profundo desgaste do presidente, do
governo e do PT.
Folha - E o reflexo disso nas eleições municipais?
Bornhausen - O governo Lula vai
sofrer as conseqüências não só
disso, mas das suas contradições,
do crescimento zero, da geração
de desemprego e do desrespeito à
ética. O sonho dos
20 anos vai ser
barrado em 2004.
Folha - O sr. se
reuniu com Serra e
depois com FHC. A
oposição está se
reaglutinando?
Bornhausen -
Evidentemente, a
crise aglutina a
oposição, mas isso
não significa uma
coligação municipal, que depende
de peculiaridades
locais. O que está
certo é que as oposições crescerão e
que a expectativa
de um grande
avanço do PT deixou de existir.
Mas o mais importante é que se
interrompe o processo de mexicanização em curso.
Folha - O que quer dizer?
Bornhausen - Que os ratos vão
começar a sair do porão. A base
governista original, a do primeiro
turno [da eleição de 2002], unia
PT, PL e PC do B. Depois, no segundo, aumentou para PTB e
PPS. Já no governo, vieram
PMDB e PP.
Folha - Além de parte do PFL, a do
senador Antonio Carlos Magalhães
(BA).
Bornhausen - Estou falando institucionalmente, e o PFL é de oposição. Ficamos de
fora PFL, PSDB e
depois o PDT.
Com a verticalização das eleições
[em que as coligações estaduais e
municipais têm de
repetir as nacionais], o risco é de
um achatamento
medonho das
oposições.
Exemplo: o
[Germano] Rigotto [governador do
Rio Grande do
Sul, do PMDB]
tem PMDB,
PSDB, PPS, PFL e
PDT, mas, como o
PMDB nacional
está coligado ao
PT e ao governo,
só vai poder fazer
coligação branca
com PSDB, PFL e
PDT. Ou seja, vai
perder tempo de rádio e de TV.
Folha - Não foi o PT que fez a verticalização.
Bornhausen - Não foi, é verdade,
mas será o grande favorecido. A
verticalização estraçalha a oposição. Onde PFL e PSDB não se unirem, vão ficar à míngua. Eu conversei com Serra e com FHC também por isso, porque toda essa lógica contra a oposição começou a
ruir com o caso Waldomiro. Os
ratos vão pular fora do governo, e
a tendência é a base se fragilizar e
a oposição se fortalecer.
Folha - O que
mais muda com o
caso Waldomiro?
Bornhausen - O
que havia antes? A
imprensa estava
amarrada, a oposição era inexistente, e o grande
arco de coligações
garantia uma
maioria imensa
para o governo no
Congresso. Esse
quadro começou
a mudar a partir
de 13 de fevereiro
[quando a revista
""Época" divulgou
a fita do assessor
palaciano pedindo propina]. A
imprensa, por
exemplo, estava
sendo apenas crítica. Agora, é também investigativa.
Folha - E o discurso de campanha
da oposição?
Bornhausen - Se a administração
do PT já era ruim sem nenhum
escândalo, agora vai ficar péssima. Fracasso na área social, dosagem exagerada na política econômica para conseguir conquistar
credibilidade, resultados ruins em
todas as áreas.
Eles subiram os juros quando
não precisava, demoraram para
baixar, aumentaram voluntariamente o superávit
primário e engessaram o setor produtivo com uma
política errada de
tributos. Conclusão: crescimento
negativo de 0,2%,
650 mil desempregados, salários valendo menos 13%.
Folha - O sr. criticou o PT por cobrar
mudanças. Então,
a economia está
bem?
Bornhausen - No
último trimestre
de 2003, iniciou-se
um círculo virtuoso mundial que se
repete de dez em
dez anos, mas nós
perdemos. O Brasil poderia almejar
crescer em 2004
de 6% a 7%, mas
não surfou na onda na hora certa. Vamos crescer
uns 3% e, com isso, não vamos recuperar os 650 mil desempregos
de 2003.
Por quê? Faltou ousadia nos juros, afastaram investimento, fizeram marco regulatório por medida provisória e mais essa política
externa voltada para o público interno, especialmente o público interno do PT. É uma política terceiro-mundista e preocupada em
afrontar o nosso maior parceiro
econômico e comercial: os EUA.
Folha - E quanto aos escândalos?
O pior da crise já passou?
Bornhausen - O fato de o PT abafar a CPI por todos os meios e modos indica que há outras coisas a
esconder, e elas certamente vão
aparecer.
Folha - Por que tanta certeza?
Bornhausen - Porque, quando
um governo tropeça, as denúncias começam a aparecer, os prejudicados tomam coragem e
põem a cara de fora.
Folha - Prejudicados?
Bornhausen - Os que não se beneficiam de atos ilícitos.
Folha - O que o sr. acha do fortalecimento político de velhas lideranças do PMDB e do seu próprio partido no governo PT?
Bornhausen - O PT administrou
muito mal a crise, indo e voltando
sem encontrar um caminho.
Exemplos: o ato de desagravo ao
Dirceu, a insistência do [senador
Eduardo] Suplicy [PT-SP] em
convocar o Dirceu para o Congresso e, agora, essa decisão da
Executiva Nacional deles transferindo a culpa para o Palocci. Uma
irresponsabilidade. Atacar o Palocci foi um tiro no pé. Ou no coração? O atingido pela crise foi o
Palácio do Planalto, e houve uma
dificuldade grande de reação ante
à surpresa e à gravidade da denúncia. Perderam muito tempo,
perderam a tranqüilidade e daí
vieram todos esses desacertos.
Folha - O que isso projeta?
Bornhausen - Um governo que
era forte e mal gerenciado fica fraco e continua mal gerenciado. É
péssimo para o país. A ameaça é
de uma nova década perdida.
Folha - O PFL sempre foi contra
CPIs. Apoiar agora não é fazer oposição pela oposição?
Bornhausen - Nunca houve um
fato igual ao do Waldomiro, um
subchefe da Casa Civil filmado tomando dinheiro para candidatos
do partido e para si. Se eu estivesse no governo, assinaria a CPI do
mesmo jeito. Como explicar ao
meu eleitor que eu não assinei, se
ele viu tudo pela televisão?
Folha - E o presidente Lula?
Bornhausen - O presidente sumiu. Ele quer ficar longe de tudo
isso para evitar que a crise atinja
sua popularidade. Mas eu acho
que ele não vai conseguir.
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