São Paulo, Segunda-feira, 08 de Março de 1999
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ARTIGO
Emendas agitam o Judiciário

WALTER CENEVIVA
da Equipe de Articulistas

A agitação domina o mundo judicial paulista em nível sem similar na história republicana deste Estado. Foi provocada por duas emendas constitucionais: uma já aprovada pela Assembléia Legislativa e outra em fase final de discussão. Mudam regras importantes da magistratura bandeirante, em dois projetos dos deputados Campos Machado e Sylvio Martini.
As discussões, as quais interessam aos cerca de 2.000 juízes estaduais, têm duas vertentes: a da constitucionalidade e a da conveniência e oportunidade.
A primeira delas, votada na semana passada, estende aos juízes vitalícios do Estado a condição de eleitores, no pleito para presidente e vice-presidentes do Tribunal de Justiça. O eleitorado sempre foi composto pelos desembargadores do próprio tribunal. Passará de cerca de 130 eleitores para 1.600, que são os juízes vitalícios, envolvendo desde jovens magistrados das comarcas do interior até veteranos próximos da aposentadoria compulsória aos 70 anos. Tudo faz crer que a aplicação da emenda terá mais pontos positivos do que negativos. Abrirá o Poder a todos os seus integrantes, democratizando-o, de vez que estabelecerá novas linhas de contato entre a cúpula, composta de 25 desembargadores mais antigos, na forma facultada pelo inciso 11 do artigo 23 da Constituição Federal, e as bases. Nesse sentido, foi vigoroso o trabalho da Apamagis -Associação Paulista de Magistrados, defendendo a emenda.
Seus opositores detectam ofensa ao artigo 96 da Constituição, pois neste está escrito que compete privativamente aos tribunais eleger seus órgãos diretivos. A direção do Tribunal de Justiça de São Paulo parece disposta a não aceitar o novo sistema, o que tende a gerar processos judiciais, com liminares adiando o processo eleitoral de agosto, quando o atual presidente, desembargador Dirceu de Mello, completará 70 anos.
A segunda parte da agitação vem da outra emenda, que unifica os quatro tribunais estaduais paulistas (um de Justiça e três de Alçada). Não corre o risco de impugnação constitucional, pois não se trata de assunto cuja iniciativa seja do Tribunal de Justiça. Além disso, é oportuna e conveniente. Quatro tribunais custam muito caro, pela quadruplicação de quadros e equipamentos, para finalidades iguais ou semelhantes, desde os gabinetes de seus presidentes, até as divisões e os departamentos, com suas chefias e funcionários dedicados a trabalhos iguais.
Alçada, para os juristas, é um limite de valor ou de complexidade pelo qual se sabe que a causa vai para um ou para outro tribunal. Quando a lei criou o primeiro tribunal de alçada, esse critério foi adotado, mas isso passou faz muito tempo. Os quatro tribunais têm iguais responsabilidades para julgar recursos em razão da matéria. Suas decisões são apreciadas pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Supremo Tribunal Federal. Cada tribunal de alçada tem autonomia e desenvolve suas próprias políticas administrativas.
Tudo aponta no sentido da conveniência de que a Assembléia aprove a emenda, sendo irrelevante a queixa de que dará origem a uma corte com centenas de juízes. Serve de exemplo a Corte de Cassação da Itália, que está perto dos quatrocentos magistrados.
Por trás da agitação, é claro que há muita disputa de poder, de dominação política, mas ela é um bem em si mesmo.


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