|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
DESAPARECIDOS
Família de Wlademiro Jorge Filho foi indenizada por comissão
"Morto' no regime militar
aparece vivo em São Paulo
EMANUEL NERI
da Reportagem Local
Vinte e nove anos depois de
abandonar a família e ter sido considerado morto pelo regime militar, fato que levou sua família a ser
indenizada pelo governo, o aposentado Wlademiro Jorge Filho,
60, está vivo e mora em São Paulo.
Suspeito à época de ser guerrilheiro, Wlademiro desapareceu
em fevereiro de 69, dois anos após
ter abandonado o emprego na Rede Ferroviária Federal, no Rio. A
partir daí, começa o mistério em
torno de sua vida. Para amigos, ele
entrou na clandestinidade e morreu sob tortura ao ser preso.
Por causa disso, em 1982, sua família obteve por via judicial uma
declaração de ausência, reconhecida em um cartório de Campos
(RJ), sua cidade. Em 1996, os parentes obtiveram indenização da
Comissão dos Mortos e Desaparecidos do regime militar (64-85).
Sexta-feira à noite, em seu apartamento do bairro de Santo Amaro, zona sul de São Paulo, Wlademiro reconheceu que abandonou
a família, que trabalhou como ferroviário, mas negou sua atividade
política. "Não sou morto-vivo."
Polícia investiga
A indenização pela suposta morte de Wlademiro foi aprovada por
unanimidade pelos sete membros
da comissão do governo que analisa esses casos.
Sua família -o filho, Uelinton, e
a mulher, Maria José -recebeu
R$ 100 mil, gastou todo o dinheiro
e agora não sabe como ressarcir os
cofres públicos.
Criada pela lei 9.140, de 1995, a
comissão que indeniza familiares
de mortos do regime militar pediu
na última quinta-feira que a Polícia Federal abra inquérito para
apurar se houve ou não má-fé da
família ao requerer a aposentadoria. Se não houve má-fé, não há
obrigação de devolver o dinheiro.
O relatório propondo a indenização da família de Wlademiro foi
apresentado pelo deputado Nilmário Miranda (PT-MG), membro da comissão. Várias pessoas
disseram conhecer Wlademiro.
Herval Aroeira, ex-dirigente do
Sindicato dos Ferroviários da Leopoldina, no Rio, diz ter convivido
"sindical (sic) e politicamente
com Wlademiro Jorge Filho, o
"Miro', até abril de 1964", diz.
Outro depoimento é de Berenício
Pessoa, ex-líder ferroviário.
Berenício contou que Wlademiro participara de greves e passeatas contra os militares e deu um
detalhe físico do ex-ferroviário
-por ter um defeito na planilha
do pé, era chamado pelos companheiros de "Pé-de-pombo".
Outra informação era a de que
Wlademiro havia participado da
guerrilha de Caparaó, organizada
em Minas por um grupo conhecido por Movimento Nacionalista
Revolucionário em 1966.
"Conheci o cidadão brasileiro,
patriota e revolucionário destemido Wlademiro Jorge Filho, tanto
pelo nome próprio como pelos
nomes de guerra "Miro' e
"Pé-de-pombo", diz Amadeu da
Luz Ferreira, ativista de Caparaó.
Amadeu contou que ficou sabendo da prisão de Wlademiro em
1969, quando também estava preso. "Posteriormente, soube por
outros presos políticos que o companheiro Wlademiro não havia resistido à tortura e teria falecido."
O mistério em torno de Wlademiro começou a ser desfeito este
ano quando seu filho procurou a
Previdência Social para solicitar
pensão para a sua mãe. Ficou sabendo que seu pai estava vivo,
mora com outra mulher em São
Paulo e que já está aposentado.
Depois de conhecer o pai em seu
apartamento de São Paulo, há 20
dias, o filho de Wlademiro comunicou o equívoco à comissão que
indenizara sua família. "Acho que
não houve má-fé, pois assim ele
não nos avisaria", diz Suzana Lisboa, integrante da comissão.
Luís Francisco Carvalho Filho,
outro membro da comissão, entende que pode ter havido engano
na avaliação do caso.
"O erro era uma hipótese prevista na lei. Isso não desmerece o
trabalho da comissão", afirma.
"A polícia tem que apurar o caso
com bastante rigor."
Responsável pelo processo de
indenização pela "morte" de
Wlademiro, o deputado Nilmário
Miranda acha que o ex-ferroviário
"está mentindo" ao dizer que não
participou de atividade política.
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
|