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MEMÓRIA
Em entrevista à Folha em fevereiro, cardeal afirmou que considerava divórcio "anti-humano e devastador"
D. Lucas defendia manutenção da doutrina
PAULO DANIEL FARAH
DA REDAÇÃO
O cardeal mineiro d. Lucas Moreira Neves, 76, passou boa parte
dos dois últimos anos em seu
apartamento diante da praça São
Pedro, no Vaticano, com sessões
de diálise constantes. Apesar do
diabetes e da saúde cada vez mais
frágil, estava totalmente lúcido
quando concedeu uma entrevista
à Folha em fevereiro passado. Recordou todos os nomes dos presidentes e dos secretários-gerais em
50 anos de CNBB (Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil),
que presidiu de 1995 a 1998.
D. Lucas manteve-se convicto
de suas posições -alvo de críticas de progressistas- contra o
divórcio e o controle artificial da
natalidade, por exemplo. "A igreja não deve fazer concessões no
conteúdo. Como o papa destacou
recentemente, o divórcio é anti-humano, é devastador. Ele disse
isso a juízes e advogados. Suas posições provocam inconformismo
em alguns, sobretudo os políticos,
mas ele não faz concessões".
Uma pesquisa recém-divulgada
indicava que 87,5% dos italianos
rejeitavam a proibição do divórcio. Para ele, isso mostrava que "a
igreja precisa mudar a forma de
transmitir seus princípios. Mas jamais alterá-los. A igreja deve modernizar a forma como transmite
a mensagem, sem alterar a doutrina, a norma, o conteúdo".
Sobre as novas tecnologias, disse que "são bem-vindas para a
pregação do Evangelho. O papa
fez questão de enviar uma encíclica à Austrália por e-mail". A respeito da missão da igreja, acreditava que "a principal é religiosa,
criar comunhão de fé, amizade,
ação pastoral".
Confiança
Homem de confiança do papa
João Paulo 2º, d. Lucas foi prefeito
da Congregação para os Bispos do
Vaticano (quarto posto em importância na Cúria Romana) entre 1998 e 2000. Mantinha encontros semanais com o líder católico
"até sua saúde piorar a ponto de
ele renunciar ao cargo e deixar a
disputa pelo trono de são Pedro.
Até então, ele sempre foi o grande
candidato brasileiro à sucessão ",
disse o vaticanista Giancarlo Zizola. Em seu livro "Il Sucessore" (o
sucessor), Zizola o considerava o
quarto "papável", atrás de três
cardeais italianos.
Desconversava quando lhe diziam que, por anos, foi o candidato "natural" brasileiro à sucessão,
devido sobretudo à posição conservadora, que o aproximava de
João Paulo 2º -a quem não poupava elogios. Sobre as considerações de que o próximo papa poderia ser um brasileiro, disse que
"tudo é possível, até um latino-americano, um brasileiro", mas,
na opinião dele, "seria até um desdouro [..." falar em um novo papa
enquanto está vivo o atual".
Em fevereiro, elogiou a posição
conciliatória do papa em relação a
outras denominações cristãs e a
outras religiões. Em 24 de janeiro,
o papa havia promovido um dos
maiores encontros inter-religiosos da história, em Assis (cidade
natal de são Francisco). "É necessário reconhecer que a igreja também precisa do perdão alheio."
Sobre as alegações de que, sob a
liderança de João Paulo 2º, a igreja
experimentou um retrocesso,
após os avanços do Concílio Vaticano 2º, d. Lucas disse que o papa
"foi um bispo do concílio. Graças
a ele e a outros fatores, hoje se conhece muito melhor o concílio".
Quando conversou com a Folha, falou pausadamente, com
menos dificuldade do que em encontros anteriores, e interrompeu
a entrevista brevemente por algumas vezes. Após uma hora e meia,
às 18h, despediu-se para orar com
um padre visitante em um cômodo reservado à oração.
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